Opinião
O valor da iniciativa

Chamaram-me vivamente a atenção pessoas com iniciativas muito variadas e todas elas muito empreendedoras.
Umas para melhorar a situação da família, propondo-se, para tal, emigrar. Outras, no seu âmbito profissional, tentando ajustar-se para algo mais compensador. Algumas, trabalhando a terra com vontade de experimentar novas culturas e sementeiras. E, ainda, querendo ganhar saber sobre a melhor forma de realizar as operações de agricultura para maior produtividade das suas várzeas.
Outros, ainda, nas indústrias, sempre com a pergunta em aberto: será que vendo melhor o produto noutras latitudes? Ou devo acrescentar mais características para ele ser mais valorizado?
A rica criatividade de qualquer cabeça posta a pensar desenvolve uma variedade imensa de iniciativas.
O que é a iniciativa? Um comportamento pessoal para iniciar algo surgido da própria imaginação, capaz de ultrapassar todas as dificuldades e barreiras até o tornar possível. “Possibilita lidar com as dificuldades de trabalho, de modo mais ativo, por exemplo, com as causas de stress, com o desemprego, com mudança de carreira profissional, ou tornar-se empreendedor. Elevadas iniciativas pessoais mudam o trabalho dos empregados e fá-los relacionarem-se com o seu sucesso como empreendedor” (Michael Frese, Doris Fay)
Em qualquer das situações, a iniciativa valoriza um alto grau de coragem para experimentar e correr riscos. Mas, em geral, predomina a desconformidade com o “como” as coisas são, na tentativa de fazê-las melhor ou de fazer render mais.
É verdade que constato – apesar de algum pequeno número de fracassos resultantes talvez de precipitações, de não medir bem as consequências -, que em geral quase todas as iniciativas vão no bom sentido e, frequentemente, originam novas iniciativas, novas vias de melhorar a vida ou os rendimentos, cada vez com menos hesitação, pois a vida parece ter ensinado e dado certo treino para fazer melhor em cada nova iniciativa. É como um processo que tendo o seu começo, não pára e transmite aos mais novos, esse bichinho de não se conformar e ir melhorando.
Para quem realiza uma nova iniciativa deverá ter uma ideia bem clara do compromisso para com ela e para com todas as pessoas da família a quem se refere.
Não fossem milhões de emigrantes, seguindo os passos de outros, estaríamos hoje cingidos a uma pequena extensão de terra com um tipo único de produtos vegetais e animais.
Ao abrir horizontes, temos mais variedades vegetais e produtos animais e acesso aos recursos do subsolo. E qualquer que seja a medida de valorização, o mundo está mais rico, as populações com emigrados tem melhor nível de vida, mais ideias e formas de realizar cuidados de saúde.
Sem iniciativas estaria tudo num plano horizontal, sem novidades, a fazer mais do mesmo, porque sempre assim se fez. Mas com elas, o nível de aventura vai crescendo e as soluções que surgem aliciam a experimentar mais variantes e a entrar na dinâmica dessa aventura.
Estou a defender as iniciativas em si? De certo modo, sim. Mas depois de bem estudadas e avaliadas nos possíveis resultados e nos custos psicológicos infligidos a todas as pessoas que intervêm no processo.
Quer-me parecer que numa empresa ou numa atividade familiar dá-se grande importância à iniciativa das pessoas. Na própria família, é um aspeto educativo iniciar nesse campo com perguntas, ideias e explicações para se ajudar a definir com mais clareza o conteúdo do que se está a querer fazer.
Parece, contudo, que ela é algo inata, ainda que se possa influenciar um pouco para a tornar mais viva e espontânea, sobretudo face a quaisquer dificuldades que a vida possa apresentar.
Enquanto escrevia este breve artigo, recebi uma nota de uma pessoa minha conhecida que encontrara num Seminário sobre temas de Empreendedorismo Social, em Mumbai. Trata-se de Mayank Ghandhi[1] que me escreve o seguinte:
Uma história notável
“Há 3 anos, cerca de 300 trabalhadores da aldeia de Rui em Beet, Maharastra, costumavam ir trabalhar para as outras aldeias vizinhas. Abandonando a agricultura tradicional onde costumavam ganhar por ano cerca de 20.000 a 30.000 Rupias por acre de terra. Em conjunto, começámos por produzir centenas de milhar de plantas de “amoreira” nos cerca de 600 acres de terreno. As folhas da amoreira são espalhadas em bandejas em amplos barracões e pequenas larvas de bichos de seda são postos nessas folhas. Em 22 dias, os insetos crescem comendo as folhas e a sua saliva (baba) produz um pequeno casulo. Cada um destes casulos de 2,5 cm perfaz um quilómetro de fio de seda que é vendido a bons preços.
Os rendimentos anuais elevaram-se para mais de 300.000 Rupias por acre. Todos os filhos dos lavradores que tinham regressado à localidade de Rui, durante a Covid, recusaram-se a voltar para as cidades onde trabalhavam. Os jovens agricultores trabalharam ativamente e as receitas mensais ultrapassaram crores[2] e em lugar de os trabalhadores da aldeia de Rui saírem para as outras, cada dia entre 200-300 trabalhadores vem juntar-se aos aldeãos para trabalhar em Rui.
Mas apareceu um grande problema: a falta de água. Ontem mesmo, embarcámos num grande projeto de captação de água. Aprofundando e alargando o Rio Rui, criando um grande depósito de água, que armazenará dezenas de milhões de litros de água para assegurar que a produção e o negócio continuem a crescer, sem parar. Na prosperidade dos agricultores está a prosperidade da Índia.”
Porque cito este exemplo? Por ser notável e porque há necessidade de pessoas com ideias que mobilizem outros a pôr em comum a sua terra e a começar uma nova produção, bem diferente da tradicional que pode libertar rendimentos muito superiores. E enquanto as coisas vão bem, vale a pena ver outros problemas a aproximarem-se e ver que soluções se lhes há-de dar, como é o tema da água, para fazer crescer as plantas de amoreira, que são o alimento dos bichos de seda.
[1] Mayank Gandhi é um ativista social da Índia. Foi previamente um membro do comité central do movimento “India Against Corruption” e o membro Executivo Nacional do Partido Aam Aadmi, in Wikipedia.
[2] 1 crore são 10 milhões
*Professor da AESE-Business School, do IIM Rohtak (Índia) e autor do livro “O Despertar da Índia”