Entrevista/ “Nos últimos anos, o Porto tem-se afirmado como um centro tecnológico de referência”

“A Porto Tech Hub continuará a contribuir de forma decisiva para a consolidação do Porto como um hub tecnológico de referência global”, assegura o seu presidente Luís Silva.
Com uma década de atividade, a Porto Tech Hub soma 40 empresas associadas, de diversos setores e áreas tecnológicas, e tem contribuido para colocar a região Norte do país no mapa do empreendedorismo nacional, e também internacional ao assumir-se como um polo tecnológico e atrair empresas estrangeiras para o país.
Luís Silva, presidente da Porto Tech Hub, reforça inclusive a disponibilidade da associação para ajudar “as organizações a encontrarem as melhores condições para crescer e contribuir para o fortalecimento do Porto como um hub tecnológico global vibrante”. Aliás, não hesita em destacar que “Portugal é um país com muito talento e com excelentes condições para que as empresas se possam estabelecer e crescer”. Mas deixa um alerta: “para nos posicionarmos na linha da frente destas inovações [IA e computação quântica] e nos equipararmos a outras potências mundiais, é necessário repensar o papel burocrático e regulador que tanto o sistema português como o europeu assumem”.
Quais os atrativos do Porto e da Porto Tech Hub para atrair empresas e start-ups?
Um dos eixos nos quais mais investimos é a oferta formativa, que contribui para a atração de empresas e start-ups e para o fortalecimento do ecossistema. Os cursos SWiTCH, que contam com o apoio de parceiros como a Câmara Municipal do Porto, o Santander e o ISEP, focam-se na requalificação e especialização do talento tecnológico através de um ensino amplo sobre as mais diversas e recentes tendências do setor. Esta área de atuação promove o talento local, convida novos profissionais e é algo atrativo para as empresas e start-ups, oferecendo mão de obra qualificada e formada de acordo com as exigências do mercado.
Além disso, promovemos várias atividades de networking, debate e partilha de conhecimento com vista a fortalecer a nossa comunidade. O objetivo destas dinâmicas é reunir o setor – quer se trate de profissionais, empresas ou interessados em tecnologia -, sendo que o evento com mais impacto é a Porto Tech Hub Conference, que é também a materialização da nossa missão enquanto associação. Esta conferência reúne anualmente o setor, nacional e internacional, para debater tecnologias emergentes e absorver conhecimento.
Qual o balanço dos quase 10 anos de atividade? Quais os momentos mais emblemáticos, positivos e negativos, da Porto Tech Hub?
O balanço do nosso trabalho na última década é extremamente positivo, refletindo o crescimento sustentado do setor tecnológico – no Porto e no país – e da associação. Um dos indicadores mais claros deste desenvolvimento é a crescente presença de empresas estrangeiras que escolhem o Porto como local para se estabelecerem. Este movimento reafirma a atratividade da cidade enquanto polo tecnológico e motiva-nos a continuar a fomentar um ecossistema inovador e colaborativo
O nosso evento anual, a Porto Tech Hub Conference, tem sido um ponto de encontro para o ecossistema tecnológico internacional, trazendo à cidade um dia de partilha de conhecimento, networking e debate sobre as tendências que moldam o setor. É um evento que não só reforça a posição do Porto no mapa global da tecnologia, como também o papel da nossa comunidade na definição do futuro do setor.
Outro marco importante é quando abrimos novos cursos no programa SWiTCH. Este programa de pós-graduação tem como objetivo requalificar e especializar profissionais para o setor tecnológico. Iniciativas como estas são fundamentais, uma vez que a tecnologia evolui a um ritmo acelerado, exigindo profissionais comprometidos com a formação contínua e com a atualização de competências. Por isso, temos vindo a promover cursos alinhados com as exigências do mercado, como o SWiTCH DEV para desenvolvimento de software e programação, o SWiTCH QA para web development automated testing e o SWiTCH Cyber, que se foca no desenvolvimento de competências de cibersegurança. Neste sentido, iremos lançar em breve um novo curso focado em Big Data.
Ao fazer um balanço dos últimos 10 anos, é impossível não referir a pandemia da COVID-19, que foi, sem dúvida, um dos momentos mais marcantes. A necessidade de trabalhar à distância, num contexto de extrema incerteza, trouxe desafios sem precedentes que testaram a resiliência, adaptabilidade e capacidade de inovação das empresas. Para muitas organizações, o impacto foi desigual. No entanto, este período também evidenciou a importância estratégica da tecnologia para garantir a continuidade operacional e, em muitos casos, criar oportunidades de transformação.
Estamos confiantes de que, com uma visão estratégica e colaboração contínua, a Porto Tech Hub continuará a contribuir de forma decisiva para a consolidação do Porto como um hub tecnológico de referência global.
“(…) o Porto tem-se afirmado como um centro tecnológico de referência, atraindo diversas empresas internacionais (…)”.
Quais as tecnológicas internacionais que optaram por se instalar no Porto e que mais têm contribuído para dinamizar o ecossistema local, e consequentemente nacional?
Nos últimos anos, o Porto tem-se afirmado como um centro tecnológico de referência, atraindo diversas empresas internacionais que têm dinamizado significativamente o ecossistema local e, por conseguinte, o nacional. As mais recentes são a Natixis, instituição financeira francesa que estabeleceu no Porto um centro de competências que tem contribuído para a criação de emprego qualificado na área tecnológica; a Cocus, empresa alemã especializada em soluções digitais, que também escolheu o Porto para expandir as suas operações, reforçando a presença de competências em áreas como a Internet das Coisas e o 5G; e a Devexperts, focada no desenvolvimento de software para mercados financeiros, que tem desempenhado um papel importante no fortalecimento do setor tecnológico local.
De sublinhar também a presença da Adidas no Porto, que realça a atratividade da cidade para grandes marcas internacionais que procuram inovação e talento na área digital. A Intellias, fornecedora global de serviços de desenvolvimento de software, e a ISS, líder em serviços de facilities, também estabeleceram operações no Porto, diversificando o ecossistema tecnológico da região. A IWG, especializada em soluções de espaços de trabalho, e a Init DCP, focada em consultoria tecnológica, são outros exemplos de empresas que têm contribuído para a dinamização do setor tecnológico na cidade.
Por fim, a Dachser, empresa de logística internacional, reforçou a interseção entre tecnologia e logística ao instalar-se no Porto, impulsionando a inovação neste setor.
A presença destas e outras empresas internacionais no Porto tem sido crucial para o desenvolvimento do ecossistema tecnológico local e para o nosso posicionamento internacional, promovendo a criação de emprego qualificado, fomentando a inovação e posicionando a cidade como um hub tecnológico de referência.
Que iniciativas têm desenvolvido para atrair tecnológicas de várias geografias?
O nosso papel enquanto associação não passa tanto por viajar de país em país para convencer empresas a virem para o Porto. Em vez disso, temos uma abordagem mais estratégica e de apoio. Significa isto que quando uma empresa manifesta interesse em estabelecer-se na cidade ou na região Norte, colaboramos de forma próxima com parceiros como a Câmara Municipal do Porto, garantindo que as organizações têm acesso a toda a informação e apoio necessários.
Apresentamos então às empresas o ecossistema tecnológico local, destacando as vantagens competitivas da cidade – desde o talento altamente qualificado e as iniciativas de formação até ao ambiente de inovação e à qualidade de vida que se vive no Porto. Além disso, facilitamos também o networking com outras empresas, instituições e stakeholders locais, assegurando que compreendem como se podem integrar e crescer na nossa comunidade.
Estamos sempre disponíveis para prestar apoio no que for necessário, ajudando as organizações a encontrarem as melhores condições para crescer e contribuir para o fortalecimento do Porto como um hub tecnológico global vibrante.
“(…) deve haver – e tem havido – um esforço partilhado dos ecossistemas do Porto e de Lisboa na atração de empresas estrangeiras (…)”.
Ecossistema tecnológico de Lisboa e Porto: o que os afasta e aproxima?
No caso particular do Porto, embora os detalhes específicos possam variar, há programas de acolhimento, tanto da Câmara Municipal como da AICEP, que facilitam a integração das organizações. A Porto Tech Hub é frequentemente envolvida nestes processos de onboarding, ajudando as empresas a compreender o ecossistema local, a conectar-se com parceiros estratégicos e a encontrar a estrutura necessária para o seu sucesso. Estamos também geograficamente muito próximos de Braga e Aveiro, dois polos de inovação e tecnológicos em crescimento.
Mas mais do que os afasta deve haver – e tem havido – um esforço partilhado dos ecossistemas do Porto e de Lisboa na atração de empresas estrangeiras, o que reflete como Portugal é um país com muito talento e com excelentes condições para que as empresas se possam estabelecer e crescer. Em ambas as cidades, as empresas e os profissionais que chegam de fora são acolhidos de forma calorosa, criando um ambiente favorável à integração e colaboração. O papel das iniciativas sem fins lucrativos é aqui fundamental, como a ação dinamizadora da Porto Tech Hub.
Outro aspeto importante é a existência de comunidades tecnológicas ativas nos dois ecossistemas. Esta rede de comunidades é particularmente valorizada pelas empresas, uma vez que cria um sentimento de pertença, facilita o networking e incentiva a partilha de conhecimento.
No final de contas, tanto Lisboa como o Porto têm muito a oferecer e é essa diversidade e complementaridade que reforça a posição de Portugal como um destino tecnológico de excelência. Acreditamos também que o caminho para nos posicionarmos no mercado da inovação a nível internacional é feito ao definir um plano de ação que agregue os vários ecossistemas, tornando a tecnologia e inovação num motor de arranque para Portugal.
Como caracteriza o papel da Porto Tech Hub na dinamização do empreendedorismo e da inovação tecnológica nacional?
Na Porto Tech Hub dinamizamos o ecossistema local e, consequentemente, o nacional, através das iniciativas já mencionadas que promovem o Porto como um centro global de excelência tecnológica. Assim, apostamos na cooperação e colaboração entre os vários agentes do ecossistema, isto é, empresas já estabelecidas, start-ups, universidades, talento e a comunidade tecnológica em si. Investimos no talento em IT, com programas de requalificação e formação especializada para dar resposta às necessidades do setor, acompanhando as tendências tecnológicas. Esta aposta responde a um dos desafios do setor, talento qualificado.
Quantas são atualmente as empresas associadas da Porto Tech Hub e qual a mais-valia que o hub lhes presta?
A Porto Tech Hub conta atualmente com 40 empresas associadas de diversos setores e áreas tecnológicas, o que reflete a riqueza do ecossistema portuense. Entre as principais temáticas desenvolvidas pelas associadas estão a cibersegurança, inteligência artificial, e-commerce, 5G, jogos, indústria 4.0 e blockchain.
A associação concentra-se em desafios como a escassez de talento, a capacitação para novas profissões em IT, as estratégias de atração e retenção de profissionais qualificados e a formação contínua. Além dos programas de qualificação, a Porto Tech Hub promove a colaboração entre empresas, instituições de ensino e parceiros, criando um ecossistema tecnológico único. O crescimento contínuo da associação reforça o Porto como um centro tecnológico de referência, preparado para competir num cenário global.
“A presença de unicórnios como a Sword Health (…) são um exemplo da pluralidade do ecossistema local”.
O Global Startup Ecosystem Report (GSER) 2024, da Startup Genome, revela que as start-ups do Porto atingiram mais de 6,4 mil milhões de euros, garantindo a entrada da cidade no Top 100 dos Ecossistemas Emergentes. Como perspetiva 2025? Na mesma rota ascendente?
Estou confiante que para 2025 as perspetivas se mantêm positivas. O Porto continua a atrair start-ups inovadoras e investimentos substanciais, mantendo o caminho de se consolidar como um hub tecnológico de referência. A presença de unicórnios como a Sword Health e as mais de 40 associadas da Porto Tech Hub, compostas por 37,5% de tecnológicas internacionais, são um exemplo da pluralidade do ecossistema local.
Ainda que existam desafios ao desenvolvimento das empresas, como a falta de profissionais qualificados e a burocracia excessiva, com o apoio contínuo de entidades governamentais e a crescente comunidade de empreendedores, a cidade está bem posicionada para manter uma rota ascendente, atraindo talento internacional e investimentos que impulsionam o desenvolvimento económico e tecnológico da região.
E quais os projetos da Porto Tech Hub, em concreto, para o novo ano?
Este novo ano assinala o nosso décimo aniversário, pelo que temos várias atividades programadas nesse sentido, como um podcast com episódios mensais que irá incidir sobre a nossa atividade e o crescimento do tecido tecnológico do Porto nos últimos dez anos. Outra novidade são os meetups, que terão uma ocorrência mensal e que irão explorar temas além dos aspetos mais tecnológicos, como recursos humanos, sustentabilidade e inclusão social. A acrescentar, vamos dinamizar atividades de responsabilidade social em parceria com outras associações de cariz social e educacional.
“(…) Portugal como a Europa contam com bons centros de investigação e educação (…)”
O que é que ainda falta fazer no ecossistema empreendedor nacional para que Portugal possa posicionar-se entre os melhores da Europa?
Continuaremos a crescer e a amadurecer, certamente, mas esta tendência tem de ser sustentada por políticas fortes que permitam que o ecossistema continue a desenvolver-se e a ganhar corpo. No caso do panorama global, vivemos um clima de instabilidade política e económica que pede que as empresas adotem uma postura estratégica e resiliente face aos desafios.
A acrescentar, estamos agora perante o novo boom da tecnologia: a Inteligência Artificial. À semelhança do que aconteceu quando surgiu a internet, a IA revoluciona a forma como nos relacionamos e o futuro da tecnologia e das empresas. A computação quântica, ainda que não tão popularizada, é apontada pelos especialistas em tecnologia como o próximo grande salto logo após a IA, com uma capacidade de processamento extraordinariamente superior aos computadores tradicionais.
Para nos posicionarmos na linha da frente destas inovações e nos equipararmos a outras potências mundiais, é necessário repensar o papel burocrático e regulador que tanto o sistema português como o europeu assumem. Ao legislar e regular muito cedo, torna-se desafiante incluir estas inovações no desenvolvimento das empresas, o que nos leva a uma desvantagem competitiva – nos outros mercados estas leis não vigoram e, portanto, os mesmos vão continuar a produzir estas tecnologias, sem esperar por nós.
Ainda assim, tanto Portugal como a Europa contam com bons centros de investigação e educação, que continuarão a capacitar talento ultra especializado e competitivo e que irá alavancar o desenvolvimento das empresas.