Opinião

Mulheres e o mercado de trabalho: entre o progresso e a persistência da desigualdade

Teresa Damásio, administradora do Grupo Ensinus

Apesar dos avanços conquistados, as disparidades entre homens e mulheres no mercado de trabalho continuam a ser uma realidade incontornável. Séculos de desigualdade perpetuaram uma tendência difícil de inverter e os números comprovam que a equidade ainda está longe de ser atingida.

Segundo o estudo da Informa D&B, divulgado em março de 2024, as mulheres ocupam 30% dos cargos de gestão e 27% dos cargos de liderança, dados ainda muito aquém daquilo que é expectável face à elevada taxa de escolaridade do sexo feminino. Outro dado relevante é o facto de 84% das mulheres com idades compreendidas entre os 25 e os 54 anos estarem empregadas. Quando comparamos com os dados da União Europeia, cujo sexo feminnio só representa 77% da força laboral, Portugal encontra-se acima da média e próximo dos resultados apresentados a norte do europa. Digamos que até aqui, Portugal parece um exemplo, mas não se deixem enganar. É importante analisarmos os dados de forma mais escrutinada.

Os dados da Pordata (março de 2025) diz-nos que Portugal ocupa o 3.ª lugar da UE com o maior número de mulheres inseridas no mercado de trabalho e que têm filhos, no entanto, uma em cada cinco mulheres portuguesas (17,7%) tem um contrato precário de trabalho, sendo que esta percentagem se acentua entre as jovens com idades compreendidas entre os 25 e os 34 anos. Estes dados são preocupantes.

Outra das situações que se continuam a verificar é o fosso salarial e de oportunidades entre homens e mulheres, que continua por explicar. Embora, seja o sexo feminino que tem um maior grau de escolaridade, são os homens quem mais ganham e que mais oportunidades de carreira têm dentro das empresas. Esta afirmação pode ser corroborada pelos dados que nos são apresentados em 2023, em que quase metade das trabalhadoras com idades compreendidas entre os 25 e os 54 anos estavam concentradas em profissões de baixas remunerações, essencialmente alocadas a empregos mais administrativos. Mesmo quando as mulheres ascendem profissionalmente a posições de topo dentro das organizações, o fosso salarial comparativamente aos homens é ainda mais acentuado.

Em quadros superiores as desigualdades salariais de género chegam a atingir os 760 euros mensais de diferença. Afinal, onde está a constituição a ser cumprida? Afinal, como podem as empresas justificar estas desigualdades? E o que podemos nós fazer enquanto sociedade para acabar com a desigualdade de género? Continuamos a ser uma sociedade marcada por anos de história onde as mulheres não tiveram voz. Agora, mais cultas, mais trabalhadoras, mais emancipadas, deparam-se com estes desafios. É preciso atuar através de políticas públicas. Através de leis, através de mecanismos que promovam a transparência e igualdade salarial e de oportunidade no mercado laboral.

Segundo o Conselho Europeu, os principais motivos para as mulheres ganharem menos são: a interrupção da mulher quando está grávida, a falta de presença em cargos de liderança, que em Portugal se acentua ainda mais, 80% dos homens em Portugal ocupam cargos de relevo dentro das empresas e a segregação laboral, em que 80% das mulheres portuguesas ocupam cargos de baixas remunerações, como referido anteriormente.

Todas estas questões podem ser explicadas por ainda existirem barreiras históricas no que concerne ao papel da mulher na sociedade. Mudar uma sociedade com costumes e crenças que estão enraizadas pode demorar muitas décadas. Até porque apenas há 50 anos com a revolução de 1974 e através da Constituição de 1976 foram consagrados os Direitos Fundamentais entre homens e mulheres. Foi a partir desta época que começou a existir uma maior representatividade das mulheres no espetro público e privado. Mas não basta mudarem as leis é preciso fazê-las cumprir. Esta é a tarefa mais árdua a ser feita e que como vimos não está a ser devidamente aplicada. Pior, será ainda dizer que muitas mulheres só ocupam cargos de liderança por uma questão de ser famigerado nos dias que correm. É preciso mais. Nós, como mulheres, queremos mais! Queremos ser reconhecidas pelo nosso valor e pagas na mesma medida.

As mulheres que lideram estão à frente do seu tempo e têm comprovado mais do que nunca que são tão ou mais capazes do que os homens que ocuparam o mesmo cargo.

O relatório de 2024 do Work Relationship Index da HP revela-nos que as mulheres são mais confiantes nas suas competências pessoais e profissionais do que os homens, o que por si só já é um fator de sucesso. Mas, se olharmos para as tendências mundiais podemos aperceber-nos de que as novas tecnologias e as ferramentas de inteligência artificial são uma realidade inegável dentro das empresas. Como tal, estas ferramentas de apoio à tomada de decisão de um líder não necessitam de um gestor que apenas olhe para os números, pois as máquinas já o fazem, mas de líderes que tenham soft skills, como a inteligência emocional que é tão importante para a tomada de decisão e que as mulheres dominam, assim proporcionando uma conjunção de competências técnicas e emocionais que permitem fazer das mulheres líderes altamente capazes e distintivas no desempenho das suas funções.

Nas instituições de ensino que dirijo, a liderança feminina é predominante. Não apenas porque acredito firmemente no potencial das mulheres para ocupar cargos de destaque, mas porque quero contribuir ativamente para desconstruir estigmas ultrapassados. As nossas diretoras demonstram, dia após dia, que é possível gerir com eficiência, humanidade, colaboração e visão estratégica. Essas são características inerentes a muitas mulheres e que não podem continuar a ser subestimadas. Estas competências são um sine qua non das mulheres e que não podem ser ignoradas pelas empresas.

O futuro exige ação – e essa ação começa agora.

Bibliografia:

Hp. (2024). Work Relationship Index.

Informa D&B. (2024, março). Presença feminina nas empresas em Portugal.

Jaffer, A. (2024, outubro). Mulheres são líderes mais confiantes que os homens – entenda o porquê. Forbes Brasil.

Loura, L. & Ferreira, M. (2025, março.). Mercado de trabalho feminino forte, mas desigual. Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Ribeiro, S. (2025, janeiro). Mulheres na liderança em Portugal: protagonistas de mudança e progresso. Revista Business Portugal.

 

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Teresa Damásio

Teresa Damásio

Teresa Damásio é Administradora do Grupo Ensinus desde julho de 2016, que faz parte do Grupo Lusófona, o maior grupo de ensino de língua portuguesa no mundo. É também Administradora do Real Colégio de Portugal e do Grupo ISLA. Presidente do Conselho de Administração da Universidade Lusófona da Guiné-Bissau e Membro do Conselho de Administração do ISUPE Ekuikui II, em Angola. Presentemente, integra a Direcção da AEEP. Foi fundadora da Internacionalização do Grupo Lusófona, passou pela Assembleia da República como... Ler Mais..

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