Opinião
Cuidado com o reconhecimento

Acautelado que está o título, desbravemos então o conceito: num mundo onde todos procuramos esse reconhecimento, porque devemos ter cuidado nas empresas em demonstrá-lo? Ou melhor, porque devemos ter cuidado em demonstrá-lo sob a forma de convites para desafios que achamos que são indicados para o outro.
Uma das máximas da gestão é premiar e incentivar a capacidade de adaptação e evolução de um profissional mais do que apenas a sua experiência. Alguém que tem muita experiência em fazer apenas uma só coisa será certamente menos flexível do que quem consegue dentro de uma área de conhecimento responder a vários tipos de responsabilidade e atuação.
Contudo, alguns de nós já passaram pela experiência de nem sempre acertarmos na afetação da responsabilidade à pessoa certa. Falhamos na nossa sensibilidade e, também por vezes, a pessoa nomeada falha também em crer que aquele desafio lhe é adequado.
Outras vezes, porém, não se trata de um julgamento que foi errado, antes a pessoa visada tem desde cedo a noção de que aquele desafio quase certamente poderá ter um desfecho negativo para a pessoa e a empresa mas, ainda assim aceita-o.
Porquê?
Porque todos apreciamos o reconhecimento.
Se o desafio nos for colocado e se tratar de uma viragem para algo menos atrativo, na certa diremos de nossa justiça, argumentaremos como ficamos pior e todas as desvantagens serão ponderadas no nosso discurso. Porém se o desafio é para melhor (financeiramente, ou no estatuto, ou no poder obtido, ou outro) poderá dar-se o caso de não conseguirmos rejeitar a proposta. Aquele momento em que alguém na hierarquia nos convida, nos elogia, nos considera é por demais elogioso e nobre para baixarmos os braços e acharmos, quem somos nós, para duvidar do potencial que alguém viu e nós não.
Aceitamos o desafio porque sim, porque nos deram essa atenção e essa valorização. E até muitas vezes porque nos disseram que “vai correr” bem, que “só pode correr bem”.
Lembro-me de alguns casos próximos em que este reconhecimento (e desafio) foi lançado não sem contudo ser aberta uma conversa franca onde é pedido que um ou dois dias depois o visado exponha o que acha que está em falta para que tudo corra bem. Mais do que palmadinhas nas costas, esse processo ajuda em primeiro plano a que este convite e reconhecimento não se cinga a um mero momento, mas a várias interações construtivas de parte a parte. E em segundo permite um esmiuçar das condições necessárias para que, sim, tudo possa correr bem, identificando necessidades de legitimação, tempo de progressão, formação, etc.
Há poucas coisas tão fortes como esta, a do momento em que somos chamados e percebemos o voto de confiança que nos estão a dar. Melhor ainda quando tal é acompanhado da ponderação devida e dos preparos necessários, ao invés de “despachar” o convite e atirar a pessoa ao que vier.