Entrevista/ “Ambicionamos ser um dos maiores fornecedores de motociclos elétricos em Portugal com pelo menos 15% de quota”

Emilio Froján, CEO da Velca

A espanhola Velca quer redesenhar a agenda de mobilidade das cidades com as suas motos 100% elétricas e tem metas ambiciosas para o mercado português, revelou o CEO Emilio Froján.

Com apenas quatro anos de atividade no mercado de veículos elétricos de duas rodas, a Velca nasceu em Espanha, pela mão de cinco jovens empreendedores, e afirma-se como “uma empresa com um espírito distintamente europeu”.

Recém chegada a Portugal, onde espera atingir uma quota de mercado de 15%, a empresa aposta no seu modelo ONE como responda à necessidades de mobilidade dos utilizadores nacionais. Em entrevista ao Link to Leaders, o CEO Emilio Froján, salienta que “mais do que uma entrada num mercado nacional, o objetivo é entrar no mercado urbano”.

O que motivou a expansão da Velca para Portugal, sendo que se trata de um mercado substancialmente mais pequeno que o espanhol?

A expansão da Velca em Portugal insere-se na estratégia de expansão internacional da própria empresa. No último salão EICMA de Milão, em novembro, anunciámos o nosso roteiro neste sentido, abrangendo França, Itália e Alemanha numa primeira fase e, ao longo deste ano, outros países como a Suíça, a Letónia e Portugal. Esta expansão internacional tem como base a “chave urbana”, pelo que o objetivo da marca é conseguir a distribuição em cada um dos países alvo, mas mais do que uma entrada num mercado nacional, o objetivo é entrar no mercado urbano, ou seja, pelas cidades, e redesenhar a sua agenda de mobilidade.

“Portugal, tal como os restantes países europeus, avança pouco a pouco na mobilidade elétrica”.

A adesão dos portugueses aos veículos elétricos de duas rodas é suficiente para o vosso modelo de negócio?

Portugal, tal como os restantes países europeus, avança pouco a pouco na mobilidade elétrica. É certo que as quotas de mercado dos motociclos, neste momento, não são muito significativas, mas as leis ambientais cada vez mais restritivas estão a criar um cenário no qual os veículos a combustão estarão sujeitos a muitas restrições. Por esta razão, o veículo elétrico deve ganhar preponderância e, quando aplicável, os motociclos e ciclomotores com emissões zero.

Qual a vossa proposta para os portugueses no domínio da mobilidade elétrica?

A nossa proposta para o mercado português é, no fundo, oferecer veículos que respondam às reais necessidades dos utilizadores. Portanto, o nosso novo compromisso com Portugal passa por oferecer um modelo, como a ONE, que responda a estas necessidades. Algo que nos diferencia é que caminhamos ao lado das pessoas, ouvimo-las, compreendemo-las e agimos em conformidade.

Qualquer cidadão hoje quer uma mobilidade sem preocupações, por isso criámos modelos como o ONE que, com os seus 220 quilómetros de autonomia e 125 km/h de velocidade máxima, cobrem grande parte das necessidades reais de um utilizador de moto. E é preciso lembrar que o motociclista percorre em média cerca de 30 quilómetros todos os dias, pelo que uma ou duas cargas completas da bateria da ONE por semana serão mais que suficientes.

Por outro lado, graças aos 125 km/h de velocidade máxima real, a ONE é uma moto elétrica que pode ser utilizada muito para além do espaço meramente urbano. Por exemplo, para os condutores que vivem na periferia e necessitam de mobilidade para se deslocarem diariamente para o trabalho no centro da cidade.

Qual o vosso target preferencial? 

O nosso principal alvo é o utilizador final, o cliente B2C. [Business to Consumer].

Com que argumentos esperam “converter” pessoas e empresas para os veículos 100% elétricos, em particular para os duas rodas?

Desde o nosso nascimento, em 2020, sempre quisemos comercializar veículos que respondessem às reais necessidades das pessoas e tentar facilitar-lhes a vida. Por exemplo, no carregamento da bateria. No caso do ONE, a nossa moto com bateria integrada não necessita de cabos ou adaptadores especiais, pois através de um cabo normal do tipo Schuko – tão comum para carregar monitores de computador ou televisão – pode ser ligado facilmente à rede elétrica doméstica ou convencional (corrente alternada a 220V).

Entre quatro horas e meia e cinco horas, a bateria estará totalmente carregada. O mesmo acontece com as nossas outras motos com bateria removível, como a Calima S ou a Tramontana S, pois não necessitam de cabos ou adaptadores especiais, uma vez que a sua bateria pode ser facilmente carregada ligando-a à rede elétrica doméstica.

Para além desta praticidade e usabilidade, sempre demos grande importância em oferecer veículos com materiais de qualidade e equipamentos modernos e sofisticados, que proporcionam confiança e segurança aos utilizadores. Por este motivo, motos como a Velca ONE incorporam uma bateria integrada do especialista CATL, fabricante líder mundial de baterias, bem como um sistema de travões de disco com ABS em ambas as rodas e pneus Michelin City Grip. Em suma, procuramos associar-nos a fabricantes com reputação e prestígio. Um dos nossos pilares é oferecer um serviço pós-venda que proporcione tranquilidade ao utilizador, contando com parceiros que oferecem know-how na manutenção de motociclos e capilaridade geográfica.

“(…) Portugal poderá atingir uma quota de mercado de 10% no segmento das motos elétricas (…)”

E quais são as expetativas para o mercado português? 

Em Portugal, em 2023, estavam matriculadas apenas 1.544 motos elétricas e 43.353 motos de combustão. Acreditamos que com a nossa entrada, Portugal poderá atingir uma quota de mercado de 10% no segmento das motos elétricas e aumentar as unidades registadas para 4.000 até 2026. Neste sentido, ambicionamos ser um dos maiores fornecedores de motociclos elétricos em Portugal com pelo menos 15% de quota de mercado.

Quais os vossos parceiros neste negócio? Onde são produzidos os veículos?

Os parceiros são especialmente espanhóis e também temos alguns parceiros de investimento holandeses, suecos e suíços. A Velca é uma empresa com um espírito distintamente europeu. As nossas motos são fabricadas na China, como a grande maioria dos modelos de duas rodas puramente elétricos no panorama internacional. No entanto, a última e importante parte da montagem final, onde são aplicados rigorosos controlos de segurança e qualidade, é feita em Espanha.

“Temos estado em contato com fábricas de moldes de injeção em Portugal”.

Portugal pode vir a ser fabricante?

Temos estado em contato com fábricas de moldes de injeção em Portugal. Somos parte ativa do Mobae, que surge para promover o elevado potencial da Eurorregião da Galiza – Norte de Portugal ligada à mobilidade. Neste sentido, promovemos o peso específico da Eurorregião Galiza-Norte de Portugal na configuração da nova cadeia de valor da mobilidade avançada e alargada, identificando oportunidades industriais.

As empresas estão a fazer o suficiente pela mobilidade sustentável?

Sem dúvida, sim. Os fabricantes de veículos estão a investir muitas horas de esforço e trabalho em I&D (Investigação e Desenvolvimento) para fabricar veículos elétricos melhores todos os dias. E não apenas o veículo, preocupamo-nos com todo o ecossistema em torno da mobilidade elétrica, como a infraestrutura de carregamento. Por exemplo, em Espanha, propomos a instalação de um maior número de tomadas de corrente alternada domésticas ou convencionais de 220V, como as que existem nas habitações e que não requerem um grande investimento financeiro.

O que ainda falta fazer para promover a mudança para a mobilidade de emissões zero?

Melhorar a infraestrutura de carregamento. No caso das motos elétricas é muito mais simples porque são recarregadas como os telemóveis, mas o espaço urbano pode ajudar com pontos de carregamento mais convencionais, por exemplo nos próprios postes de iluminação pública. Por outro lado, com a criação de planos de ajuda aos condutores, mas que sejam ajudas diretas e imediatas, não como em Espanha, onde os compradores por vezes demoram até dois anos a recebê-los.

“As políticas governamentais devem facilitar os procedimentos (…)”

As políticas governamentais neste domínio estão no bom caminho ou aquém das expetativas das empresas que operam neste setor?

As políticas governamentais, pelo menos no caso espanhol, que é o que melhor conhecemos, não estão no bom caminho. As políticas governamentais devem facilitar os procedimentos e, no caso de concessão de auxílios ou incentivos, estes devem ser sempre aplicados ou recebidos no momento da formalização da compra. A ajuda também não deveria ser tributada.

Quatro anos depois da criação da marca em Espanha, qual o balanço do projeto?

O balanço é positivo. É certo que o nosso nascimento não foi nos melhores momentos, porque um mês depois de termos iniciado a nossa jornada empresarial, em março de 2020, foi declarado o estado de emergência em Espanha devido à pandemia de Covid-19. Tal como em Portugal e na maioria dos países, isto significou restrições à mobilidade das pessoas, algo que afetou economicamente a maior parte da comunidade empresarial.

Graças ao nosso esforço, aos nossos parceiros, colaboradores e, sobretudo, porque consideramos que conseguimos satisfazer as reais necessidades das pessoas, tudo isto permitiu-nos estar em Espanha, por exemplo, no Top 3 das marcas com a maior quota no mercado individual, “a lutar” com dois gigantes como a Silence e a Yamaha. Além disso, no caso espanhol, em 2023 a Velca distanciou-se do mercado e cresceu 58% nas vendas, em comparação com a queda geral de 14% em todo o mercado espanhol de duas rodas elétricas. Este marco permitiu-nos obter números recorde de vendas.

“No caso espanhol, há cidades como Madrid que apoiam com iniciativas adicionais às do Governo espanhol”.

A vossa ambição é mudar a forma como as pessoas se deslocam nas cidades. Estão a conseguir este objetivo? 

Estamos a atingir o nosso objetivo de mudar a forma como as pessoas se deslocam, mas ainda há muitos passos a dar e muitas barreiras a ultrapassar. No caso espanhol, há cidades como Madrid que apoiam com iniciativas adicionais às do Governo espanhol. Estas ajudas de Madrid, denominadas PlanCambia360, têm permitido a esta região liderar as vendas de duas rodas elétricas. De facto, em 2023 fechou com números positivos, sendo a única comunidade autónoma que terminou com bons números face ao declínio geral nas restantes regiões.

“A nível global, o nosso principal mercado é Espanha. É onde vendemos há mais anos e onde já contamos com uma sólida rede de mais de 80 distribuidores”.

Globalmente, qual o principal mercado da Velca no momento?

A nível global, o nosso principal mercado é Espanha. É onde vendemos há mais anos e onde já contamos com uma sólida rede de mais de 80 distribuidores. O nosso principal objetivo é continuar a crescer em Espanha, apostando agora nos mercados insulares (Baleares e Canárias) e, claro, nos restantes mercados internacionais referidos. Lutaremos por isso e faremos o nosso melhor para ouvir as necessidades das pessoas, a principal chave do nosso sucesso. Mesmo que falem connosco em português ou alemão, nós compreendemo-las. Na Velca somos poliglotas.

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