Opinião
Um Estado de fé

A recente visita do Papa Francisco a Portugal por ocasião da comemoração dos cem anos das aparições de Fátima, acredite-se ou não no fenómeno, suscita uma questão importante no âmbito de um Estado constitucionalmente definido como laico: a importância da fé para o sucesso do nosso país.
Não há dúvidas de que a visita do Papa foi um acontecimento de incomparável impacto, não apenas por ser o representante máximo da Igreja Católica, mas pelo peso que, invariavelmente, teve a nível da nossa economia e sociedade, mobilizando milhares de fiéis e colocando Portugal no centro das atenções mundiais como um local de peregrinação. E que bem que isso volta a fazer pelo turismo nacional, neste caso pelo turismo de cariz religioso.
A mensagem do Papa está claramente à frente daquilo que a nossa Igreja tem adotado e estamos muito longe da real perceção daquilo que Francisco diz e prega, faltando-nos, ao invés do que a adoção superficial das palavras, permitir uma interiorização total dos novos paradigmas que se pretende implementar, mais do que tudo aquilo a que temos assistido nos últimos anos, dizem, curiosamente, os entendidos mais próximos da génese da própria doutrina cristã. Atrevo-me mesmo a dizer que também em Portugal se reconhece um período Antes de Francisco e Pós Francisco. E recordo, somos um Estado laico.
A verdade é que o peso da fé não se fica por aqui, a nível dos impactos que tem na economia nacional. O Benfica lá ganhou mais um campeonato. O inédito tetra. Com mérito, sim, mas muito ajudado pelo desastre coletivo dos seus rivais, onde a liderança de Espírito Santo e Jesus falharam em montar uma estratégia que permitisse frustrar as intenções da malta ali da zona da Luz.
E que dizer então da inédita vitória de Portugal na Eurovisão, algo a que muitos acreditavam nunca poder assistir durante a sua vida? E logo às mãos, ou voz, do… Salvador. Em certos momentos, já estou como dizia a outra: não há coincidências.
Quer se queira aceitar quer não, a verdade é que, neste Estado supostamente laico, a fé tem um papel preponderante na conquista dos recentes triunfos. Mal posso esperar para ver, nos próximos tempos, a conjugação do discurso de um governo de esquerda, tradicionalmente laico, agnóstico ou ateu, com tantas demonstrações de fé e crença religiosa que são manifestamente acolhidas pela população, na sua quase globalidade. Um equilíbrio complicado para António Costa neste que, espero, não seja um regresso ao anterior postulado do Fátima-Futebol-Fado (bem, não foi bem um fado, mas o sentimento por detrás da atuação do Salvador não andava longe dessa realidade).
E agora vamos renegociar dívida, tentar baixar impostos, devolver rendimentos às famílias, capitalizar investimento, baixar o défice e desemprego. No fundo, com tudo o que tem acontecido recentemente, não passa mesmo de uma questão de fé…