Porque continuam as start-ups de saúde a falhar

Só no ano passado foram investidos mais de 10 mil milhões de euros em start-ups de saúde. No entanto, parte destes projetos continua a falhar na entrega de uma solução eficaz. Conheça a razão para tal acontecer.

Há perto de uma década, as start-ups ligadas ao setor da saúde começaram a surgir mais frequentemente. À sua frente estavam empreendedores que prometiam mudar o setor, melhorando a saúde das pessoas vendendo-lhes dispositivos que mediam o sono, o ritmo cardíaco, o exercício físico e os hábitos diários.

Contudo, o mundo não viu uma mudança tão drástica quanto a prometida. Parte da culpa é dos fundadores deste tipo de projetos. Como refere Paul Yock, professor de bioengenharia na Stanford Byers Center for Biodesign, numa publicação na Fast Company, os criadores de start-ups olham para a saúde da mesma forma que o fazem para outras áreas. E este é o principal problema.

O exemplo da Zeo é uma demonstração deste argumento. Criada no final de 2003, esta start-up, que recebeu perto de 26 milhões de euros em investimento, prometeu desenvolver uma fita para a cabeça que media os padrões de sono. Era acompanhada de uma app que servia de coach para este efeito. O projeto, que até esteve em destaque em algumas publicações, como a Wired e a Popular Science, acabou por declarar falência em 2012.

Esta start-up é só um exemplo das muitas que falharam no desenvolvimento das soluções prometidas. A razão para tal? Segundo Paul Yock, o principal problema prende-se com a abordagem dos fundadores ao setor. O método de lean start-up, que evangeliza a ideia de criar um minimum viable product (MVP), lançá-lo para o mercado e depois ir fazendo ajustes consoante o feedback dos clientes, não resulta na área da saúde, visto que esta é mais complexa e regulada que as outras indústrias.

Isto acontece porque na saúde não são apenas os consumidores que têm uma palavra a dizer sobre o produto que é vendido. Para além do cliente final, os stakeholders nesta indústria incluem os médicos, os reguladores e as seguradoras – todos eles têm uma palavra a dizer sobre a introdução do produto no mercado. Ou seja, podem ser necessários vários anos de testes clínicos e regulações antes do produto chegar às mãos dos consumidores, visto que estas entidades “têm de abrir a porta” antes das empresas poderem começar a vender estes produtos.

Neste cenário, o modelo amplamente adotado pelos empreendedores não resulta. Yock afirma que as equipas focadas neste tipo de projetos só se apercebem dos stakeholders da indústria quando já é tarde, e que é por este motivo que 61% das start-ups de saúde com base tecnológica que começam a tentar vender ao cliente final, acabam por tentar vender o seu projeto a seguradoras, empregadores ou hospitais.

Perante isto, o professor universitário acredita que um método mais eficaz de abordar esta área passa por inovar dentro da necessidade que existe no mercado. Ou seja, em vez de desenvolverem um produto e depois procurarem uma necessidade, os empreendedores devem começar por procurar um problema que não esteja a ser resolvido (ou um setor em que os clientes sejam mal servidos), estudá-lo aprofundadamente e só depois desenvolverem a tecnologia que o resolva. Este método pode incluir pesquisa em literatura especializada, entrevistas com médicos e pacientes e contacto com pessoas que sofram do problema que start-up se propõe resolver.

Apesar de parecer um processo simples, a maior parte dos empreendedores prefere saltar esta etapa. Rob Coppedge, um investidor com anos de experiência na área da saúde, referiu numa entrevista à CNBC, que as start-ups que operam neste espaço “queimam uma quantidade considerável de dinheiro sem construir um modelo de negócio sustentável [porque os fundadores] não têm experiência, subvalorizaram os processos de trabalho [dos médicos] ou não perceberam a jornada que é desenvolver produtos da área da saúde para os consumidores”.

Para se libertar dos problemas enunciados por Coppedge, utilize o formato evangelizado por Yock, onde é criada uma lista de critérios – estipulados por todos os stakeholders – que têm de ser incluídos no projeto. Por exemplo, a facilidade de utilização, a integração com processos já existentes ou a precisão. Isto não só faz com que o projeto vá mais rapidamente ao encontro das expetativas das pessoas, como também pode diminuir o custo de produção e aumentar as possibilidades de sucesso.

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