Entrevista/ “Revolução Verde” e suas consequências

Eugénio Viassa Monteiro, professor da AESE-Business School*

O conceito “Revolução Verde” veio do México, pela mão do agrónomo Norman Borlaug, Prémio Nobel da Paz, em 1970. Dedicou a sua vida a aumentar a produção de alimentos vegetais, sobretudo de cereais (trigo e arroz), por via da seleção das variedades mais produtivas e resistentes aos excessos de calor e água.

Preparou também um cuidado plano de cultivo, de adubação, de tratamento com pesticidas e herbicidas, de irrigação, sempre experimentando, selecionando e reproduzindo as variedades mais promissoras.

Muitos países no mundo em desenvolvimento tinham o problema da insuficiência alimentar da sua gente. E muito particularmente a Índia, que à data estava com um forte crescimento da sua população, muito empobrecida pelos colonizadores, ao fazê-la deslocar das atividades industriais destruídas (como a têxtil) para a agricultura, e depois forçadas a emigrar para as grandes cidades, em busca de trabalho e melhores condições de vida. O exagero dos impostos dos tempos coloniais tinham feito reduzir ou abandonar a atividade agrícola, por não compensar o trabalho. Pouco ou nada ficava para o agricultor.

Precisamente dos finais dos anos 50 até aos 70, a Revolução Verde tinha começado primeiro nas zonas irrigadas e com dimensões de propriedade que permitiam algum investimento em sementes, fertilizantes, pesticidas, etc. Seja como for, a produção de cereais duplicou num curto espaço de tempo e de certo modo resolveu o problema das frequentes fomes da década de 60 na Índia.

A urgência e a necessidade de ver resultados terão, talvez, posto num plano secundário a formação e informação do pessoal, para os cuidados na utilização de fertilizantes e pesticidas. Quando em excesso, degradam os solos e matam uma grande variedade de insetos, desfazendo o equilíbrio do ecosistema e reduzindo a produção agrícola por insuficiência de polinização.

Entende-se bem que com uma vasta população de agricultores com pouca instrução, esses perigos estivessem bem à vista: os processos de aprendizagem, em particular na agricultura, fazem-se ao longo de gerações, para haver tempo de assimilação das razões dos cuidados com os procedimentos a realizar.

De qualquer modo – e nunca esquecendo os custos da rápida transformação, sem tempo para os minimizar, dada a pressão posta na eliminação da importação de cereais -, o aumento de cereais disponíveis para a alimentação na Índia, foi notável, como se vê no Quadro a seguir:

Cada passo da Revolução Verde tem algo de investigação para se observar, aplicar, melhorar, reproduzir e expandir, isso tanto nas sementes, como nos processos de plantação e nos momentos ótimos para o uso de fertilizantes e de pesticidas, etc. E a metodologia é fácil de se transpor para todo o tipo de agricultura e de continuar a aplicar tempos depois, para aumentar gradualmente a produção de alimentos.

Parece lógico que com a seleção e utilização quase exclusiva, ou intensa, de uma só variedade mais produtiva e resistente, de um certo tipo de plantas, se tenha acabado por reduzir drasticamente a biodiversidade das espécies em causa. Consequências disso veremos a prazo, mas parece que a biodiversidade é, em si mesma, um valor a preservar. A natureza não tem caprichos e o que nela existe, tem a sua razão de ser…

Como resultado da preocupação de autosuficiência alimentar, a Índia é o primeiro produtor mundial de leguminosas, de juta, de leite (neste capítulo, é o 1.º produtor a partir de 1997, estando a crescer a cerca de 6% por ano, quando a média mundial estará em menos de 2%); ocupa a 2.ª posição na produção do arroz, do trigo, da cana de açúcar, de amendoim, de lentilhas, de fruta e algodão. É também um dos maiores produtores de especiarias, de peixe, de aves, de gado e muitos outros vegetais.

Note-se, ainda, que apesar de toda a melhoria registada, a produtividade agrícola na Índia é de cerca de metade das economias desenvolvidas, talvez para não esgotar os solos, sem exagerar no consumo de fertilizantes. Fica pois claro que, sendo necessário, se poderá aumentar a produção de alimentos na Índia.

*Professor da AESE-Business School, do IIM Rohtak (Índia) e autor do livro “O Despertar da Índia”

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Eugénio Viassa Monteiro

Eugénio Viassa Monteiro

Eugénio Viassa Monteiro, cofundador e professor da AESE, é Visiting Professor da IESE-Universidad de Navarra, Espanha, do Instituto Internacional San Telmo, Seville, Espanha, e do Instituto Internacional Bravo Murillo, Ilhas Canárias, Espanha. É autor do livro “O Despertar da India”, publicado em português, espanhol e inglês. Foi diretor-geral e vice-presidente da AESE (1980 – 1997), onde teve diversas responsabilidades. Foi presidente da AAPI-Associação de Amizade Portugal-India e faz parte da atual administração. É editor do ‘Newsletter’ sobre temas da Índia,... Ler Mais..

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