Opinião
Rede social teletrabalho

Um efeito de rede é algo poderoso e virtuoso. Tem sido entendido e experimentado mais recentemente pelo surgimento das redes sociais. Mas não só.
Lembremo-nos de coisas tão simples como os automóveis ou os telefones – quanto mais pessoas adquiriam um automóvel mais fazia sentido criar estradas, desenvolver restaurantes alinhados nas estradas, criar redes de postos de combustível e todo o sistema se desenvolvia. Mais pessoas com telefone fazia com que mais interesse se usasse o mesmo, pois mais gente havia a quem telefonar, e assim maior interesse em entrar nesta ‘rede’. Idem para o Facebook, quanto mais usarem este sistema de rede mais valioso será para estes utilizadores, beneficiando de numa única rede terem ali todos os seus amigos.
O que qualquer matemático já terá identificado é a Lei de Metcalfe – o valor de uma rede com n utilizadores é proporcional a n2. Ou se preferir a versão da Wikipédia “o valor de um sistema cresce na razão do quadrado do número de utilizadores do sistema”. É o que explica a corrida de muitas start-ups também ao investimento, pois se perderem a capacidade de garantir infraestrutura que sustente a explosão dessa adesão, perdem este efeito de rede. E todos querem ser os primeiros a conseguir a maioria dos interessados, sentando-se depois no topo desse domínio. É isto que explica os efeitos de rede e a corrida de soluções unicórnio como Airbnb, a Uber ou mesmo a Netflix.
Contudo, há um momento em que, de início, a inexistência de concorrência pode ser pior do que estar sozinho. Se no momento de uma nova solução ou ideia várias empresas ou agentes se colocarem no mercado a dinamizá-la e investir nela, poderão dessa forma conseguir fomentar o seu uso e adoção. Ainda se lembra da solução do aluguer de automóveis, tal como de trotinetes, ao minuto (a mais popular a Drivenow)? Ao contrário das trotinetes, não será alheio que a sua curva de adoção seja diminuta pelo facto da rede o ser também (não será a única razão, mas pesa sobremaneira).
Contudo, para além deste facto há outro.
Para haver o efeito de rede acima mencionado, não convém esquecer um ponto assaz mais crítico nesta reflexão – aquilo que faz com que as pessoas queiram aderir à rede são benefícios claros e partilhados.
Vem isto a propósito do teletrabalho.
Virá o mesmo ser adotado, e ficar após o efeito Covid-19 passar? Será esta ideia adotada ou apenas temporária? Fruto da circunstância ou resultado permanente e indissociável do trabalho de hoje em diante?
Temos visto várias abordagens nas conversas de circunstância. Em reuniões de trabalho colegas que sobre o tema refletem. Textos que nisto ponderam (eh-ham…). Figuras políticas que sobre ele debatem. De gestão. De recursos humanos. Etc.
Mas ao escutar todas elas fica a faltar aquilo que num efeito de rede é poderoso: uma ideia clara, concisa e partilhada por todos. Em primeiro, a rede em si: desde logo defendendo essa ideia e o principal benefício, nunca a prejudicando e mais do que isso tentando sempre até potenciá-la mais. Os seus membros: que pelo uso a legitimam como tal. E os agentes externos: sendo assim potenciadores, neste caso empresas, políticos, gestores nos vários campos de atuação, alinhados em que o efeito de rede esteja nivelado com essa ideia e benefícios relacionados, e não várias ideias e benefícios sem co-relação entre si.
Interessa por isso, no momento, para que haja uma rede que tenderá crescente, a que esta ideia surja e seja partilhada. Se a única ideia for apenas o recolhimento e precaução legítimas pela proteção da saúde de todos, no dia em que tal esteja assegurado (esperemos para breve, no ano de 2021 com a chegada de uma vacina) então aquilo que muitos apregoavam não subsistirá mais; pelo menos de forma massificada. A “rede social” do teletrabalho permanecerá mas muitos dos seus membros já não lhe acharão interesse. Esquecerão o seu login e password. Deixarão de cultivar as novas regras e voltarão aos 5 dias com 10 viagens de carro ou de transportes públicos.
A rede de teletrabalho não terá desaparecido, mas focar-se-á então naqueles que nela conseguiram desenhar um sistema virtuoso, claro, e partilhado.
Em resumo, as empresas e colaboradores que hoje considerem esta forma de desenvolvimento de criação de valor para si e para os seus clientes como positiva devem acelerar em clarificá-la, defendê-la e instituí-la, dinamizando o efeito de rede e a adesão pela maior parte, de forma a conseguir o ‘lock in’ e adoção da mesma e produção dos seus benefícios.
Aos que esperam que tal suceda ‘por si’, por uma qualquer forma orgânica da sociedade que como por magia a promoverá de forma alinhada e massificada em poucos meses, esses poderão ficar desiludidos, vendo avanços e recuos e no final uma fraca dimensão obtida, podendo ter de esperar anos.