Opinião
Parte 2: A “doença” do politicamente correto nas equipas de trabalho

Da minha experiência no mundo das organizações, o politicamente correto continua a fazer das suas. E, sim, no contexto das relações interpessoais, em grande parte das empresas portuguesas, acredito que continua a produzir resultados bastante negativos. Voltemos à merda.
Imagine que numa equipa de trabalho existe um tema relacionado com relações entre os seus membros. Alguém que não suporta alguém. Apesar de ser sabido por todos, este tema não foi conversado por nenhum, alguma vez. Ao colocarmos esta equipa numa imagem, podemos desenhar um círculo onde todos os elementos estão sentados em cadeiras, voltados para o centro. No meio do círculo está uma valente bosta. Como todas as da sua espécie, cheira mal. Todos sentem o seu cheiro, muitos se incomodam e até pode haver quem goste (gostos não se discutem). Lá está. Todos a veem e todos a cheiram. Nenhum faz nada em relação à situação. Ninguém age para aliviar o incómodo e o desconforto. Pelo contrário, a inação mantém a bosta no seu sítio, produzindo o seu efeito. Assim se parece o politicamente correto no seio de uma equipa.
Há equipas e pessoas que não suportando mais aquela visão e aquele cheiro adotam a estratégia de colocar um saco a envolver “o problema”. Mas toda a gente sabe que se temos um saco com porcaria, a tendência é para o encher com mais porcaria. Poderia ser uma lei universal: porcaria atrai porcaria. Basta olhar para uma qualquer rua de Lisboa. Se alguém colocar um saco do lixo à porta, prontamente o saco se transforma numa mini lixeira. A estratégia do saco suporta-se na definição que avancei no primeiro artigo – “politicamente correto é uma teoria que sustenta a ideia de que é perfeitamente possível pegar num pedaço de merda pelo lado limpo” – que é o mesmo que dizer: é possível transformar merda noutra coisa qualquer, sem fazer nada. Não é. Por outro lado, que eu saiba, ainda não se inventou um saco como o do Sport Billy. Todos os sacos que conheço têm capacidade limitada, enchem. Poupo-vos a imagem, ou talvez já vá tarde, do que acontece quando se perfura, por impaciência, por exaustão ou por qualquer outra razão, um saco cheio de merda.
Então, qual será a solução? Alguém tem de pegar na bosta. Alguém terá de se sujar, sabendo que se poderá limpar. Melhor ainda se se conseguir realizar essa operação em equipa. Assim a sujidade reparte-se. E o efeito positivo far-se-á sentir em todos. Na prática, a única forma que conheço para isto poder acontecer é: conversando. Não são conversas quaisquer. São conversas sobre a forma como se conversa. Este será o primeiro passo para eliminar o politicamente correto e se começar a caminhar para o correto.
É preciso pouco para que desinteligências, falta de alinhamento, diferenças nas formas de ser e de trabalhar, idiossincrasias, expetativas provoquem dificuldades nas relações interpessoais e, em consequência, no trabalho que uma equipa tem de operar. “Passaste por mim no refeitório e não te sentaste para almoçar comigo”; “desformatas sempre os documentos”; “refutas sempre as minhas ideias”; “não me deixas falar”; “a tua opinião é sempre tida em conta, a minha não”; “tens a secretária sempre num caos”; “é desagradável comigo”. São apenas alguns exemplos de pequenas coisas que se podem tornar em grandes problemas, quando não endereçados corretamente. Quando se opta pelo politicamente correto. Pela manutenção do status quo, que tantas vezes é sinónimo de “paz podre”.
Tenho verificado, nos bons exemplos que vou conhecendo, que o melhor antídoto para o politicamente correto, ao nível das relações entre pessoas, é a elegância. E tenho visto que na receita da elegância estão ingredientes como: a coragem, o respeito, a perspicácia e a candura. São qualidades que dificilmente aprenderemos sozinhos. Portanto, caro/a leitor/a, se quer curar-se da doença do politicamente correto, sem incorrer no seu extremo oposto que é tornar-se num/a desbocado/a, sem filtro, comece por conversar sobre isso. Como em qualquer receita culinária, o cozinhado final não é uma mera soma dos seus componentes. E nenhum dos ingredientes vale por si só. Para se “cozinharem” boas equipas há que usar os melhores utensílios que temos à nossa disposição: conversas.