Opinião
Os excessos de igualdade

A começar o novo ano, olho para trás e surpreende-me ver o tempo que dedicámos em 2021 a falar de “Igualdade” num Mundo em que as desigualdades se acentuaram cada vez mais, nomeadamente entre ricos e pobres, democracias e autocracias, entre os que têm um emprego estável e os que lutam por um emprego, entre vacinados do hemisfério Norte e os não vacinados do hemisfério Sul ou entre o florescimento de economias digitais e o definhamento de setores ditos tradicionais.
Apesar disso e para meu espanto, a “Igualdade” que mais se falou foi a do politicamente correto: se devo dizer “caros e caras” ou abster-me de sexualizar a quem me dirijo; “Mrs ou Ms”; “Christmas” ou “Season”… entre tantos outros exemplos.
Mundo estranho, este em que vivemos. Desfocámo-nos das desigualdades mais prementes e que são a principal fonte de sofrimento e morte no Mundo e caímos em excessos retóricos e discussões fúteis. Foi com perplexidade e preocupação que vi a proposta da Comissária Europeia para a Igualdade, Helena Dalli apresentada em outubro de 2021: um guia que contém 30 páginas sobre uso de linguagem “politicamente correta” a adotar pelos funcionários da Comissão Europeia. Felizmente, a Comissária admitiu, num Twitt publicado a 30 de novembro, que o documento não cumpre o propósito para que foi feito e não cumpre os padrões de qualidade da Comissão Europeia e, por isso, retirou-o. Julgo que não terá feito por convicção, mas sim por pressão da opinião pública. As vozes de indignação tornaram-se ensurdecedoras em Bruxelas.
Outro documento estará a ser redigido nos bastidores da Comissão Europeia. Espero que seja mais inclusivo respeitando a diversidade de opiniões. A igualdade pressupõe o respeito pela diversidade. A igualdade deve alicerçar-se na liberdade de cada um. Por isso, não pode ser imposta, sobretudo em contexto profissional e, em concreto, numa instituição como a Comissão Europeia pela sua natureza publica supranacional. Espero que o novo documento, quanto mais não seja por respeito a tantas outras desigualdades bem mais graves e prementes que persistem no Mundo, não dê outra vez azo a exemplos em sua defesa como o apresentado pelo eurodeputado Cyrus Engerer segundo o qual não devemos usar o termo “Mrs” porque estamos a dizer que a pessoa em causa é casada e, por isso, pode de certa forma ser percecionada como “propriedade do seu parceiro”. Ou quando se propõe substituir “colonização do planeta Marte” por “povoamento humano do planeta Marte” para não estarmos a invocar a anexação (colonização) de muitos países (colonizados) por outros (colonizadores) no passado. É isso verdadeiramente o que importa a uns e outros? É isso que vai resolver as enormes desigualdades entre uns e outros?
A verdadeira igualdade, como refere o eurodeputado Jason Azzopa, respeita e celebra a diversidade. Ou será que em defesa da “Igualdade” vamos querer pintar de cinzento o arco-íris LGBT ou condenar os autores do velho slogan United Colors of Benetton? A força dessa campanha, para além do seu caráter inovador na altura, foi precisamente trazer para as ruas e para as nossas casas a alegria e o respeito pela diferença da cor da pele, do estilo de vida, de idade ou estrato social. Ao promover e respeitar a diferença, ao propor alternativas à uniformidade monocrómica fomos chamados a perceber que o importante é perceber e respeitar que “Somos Iguais na Diferença”.
É esse um dos meus desejos para 2022… que nos foquemos menos em retóricas estéreis e em agendas fraturantes e que nos foquemos verdadeiramente a construir um Mundo com mais:
- Igualdade de oportunidades;
- Igualdade no acesso à saúde, educação e cultura;
- Igualdade na proteção social e no acesso à Justiça;
- Igualdade no acesso ao trabalho e ao capital;
- Igualdade no tratamento não discriminatório de todos;
- Igualdade na proteção contra o exercício autoritário do poder e contra a violação dos direitos humanos;
- Igualdade no acesso justo e equitativo aos recursos do Planeta;
- Igualdade na Diversidade.
Que venha o ano de 2022!