Entrevista/ “A área de inovação tecnológica pode estar e deve estar descentralizada”

Sónia Jerónimo, cofundadora da GO IT Concept

“Viver e empreender no Interior tem de ser de alma e coração cheios. Com sentido de missão e propósito”, diz Sónia Jerónimo, empreendedora que no ano passado rumou a Seia e cofundou a GO IT Concept. Um ano depois faz o balanço da experiência.

A GO IT Concept é uma empresa de outsourcing de tecnologias de informação que nasceu em Seia pela mão da empreendedora Sónia Jerónimo que, depois de uma carreira profissional de vários anos em Lisboa, decidiu lançar-se numa dupla aventura: criar um novo projeto e enfrentar os desafios da interioridade. A aposta foi bem sucedida e já pensa na internacionalização para mercados como Brasil, Estados Unidos, Reino Unido, Suíça e Espanha.

Até ao final deste ano planeia “recrutar 30 pessoas, entre engenharia, jovens licenciados, adultos em transformação de carreira bem como reforçar a equipa de recrutamento e management”, adiantou em entrevista ao Link to Leaders.

Está há quase dois anos em Seia, onde lançou a GO IT. Que balanço faz deste período?
A minha mudança pessoal foi há cerca de dois anos, mas a GO IT foi fundada em março de 2022. Tem um ano de existência. O balanço é bastante positivo. Pretendíamos ter feito muito mais, como sempre se ambiciona. O Interior tem um potencial imenso, mas ainda é desconhecido e acaba por ser preterido, sobretudo Seia, em relação a outras localizações do centro e litoral. Competimos enquanto lugar para viver e trabalhar, com a Covilhã ou Viseu, por exemplo. Mas a nossa missão de projetar a cidade e a região para fora mantêm-se, enquanto um excelente lugar para viver, trabalhar e empreender.

A grande vantagem é que sendo uma tecnológica, podemos desenvolver tecnologia para qualquer cliente no mundo, assim como recrutar em qualquer parte do mundo, queiram ou não, mudar-se para o Interior. Foi um primeiro ano de “enraizamento” de uma empresa fora da dinâmica do litoral, porém, muito bem “recebida” pela sua missão e ousadia de estar no Interior. Um balanço positivo e, sobretudo, de grande esperança de continuarmos esta jornada diferenciadora.

Em que fase está a GO IT ? Mantém o mesmo propósito?
Com um ano de existência, como é normal, estamos numa fase de nos dar a conhecer ao mercado, enquanto marca e equipa, com todos os desafios que isso implica, à semelhança de outras empresas de raiz que foram fundadas por mim, que ninguém conhece e é preciso trilhar o caminho. Mantemos claramente o propósito transformador da região e podermos ser um “role model” para jovens e empresas que queiram escolher o Interior para criar, inovar, empreender e crescer. Nem tudo tem de estar no litoral, sobretudo, a área de inovação tecnológica pode estar e deve estar descentralizada.

Algo bastante curioso, é que temos atraído clientes e parceiros que nos procuram precisamente por este alinhamento cultural, de missão, visão e propósito. Os clientes e parceiros procuram cada vez mais contribuir para jornadas intangíveis, como poder ser parceiro de uma empresa na qual podem ter também um papel contributivo para o interior e para regiões e populações menos representadas. A GO IT está enquadrada pelas suas ações e missão, em três Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, nomeadamente 8, 10 e 13. Representam pilares importantes para o nosso negócio e ao mesmo tempo contribuem para a responsabilidade social, ambiental. O futuro do mercado da tecnologia e do trabalho passa claramente por esta contribuição para deixar um mundo melhor, ou antes, uma região melhor. Este alinhamento é sobretudo procurado e apreciado cada vez mais por start-ups internacionais nossas clientes e para as futuras.

Quantas pessoas tem atualmente a equipa?
No total, somos cerca de 23 pessoas.

Qual o serviço que mais requisitam à GO IT ?
Serviços de outsourcing de equipas, algumas em regime de Extended Teams, principalmente de clientes internacionais. O mercado nacional, posiciona mais os seus pedidos no Outsourcing tradicional. Temos também serviços de Head Hunting para Senior Engineers, onde estamos mais presentes no mercado suíço. O mercado suíço é bastante exigente e procuram-nos sobretudo para as áreas de IoT/ML e DataScience.

Atualmente, estamos também a preparar um acordo com a Service Now para certificação da GO IT como “ServiceNow Placement Partner” cuja responsabilidade é formar e capacitar jovens licenciadas em áreas técnicas e fora dela, em ServiceNow. Teremos a responsabilidade de que 25% desses jovens e adultos sejam provenientes de grupos sub-representados da sociedade, tendo estes a possibilidade de construir uma carreira, realizar transições de carreira e terem direito a um trabalho digno e remunerado.
Por outro lado, ajudar resolver a escassez de recursos em ServiceNow pelas empresas parceiras da ServiceNow. Nesta área, procuramos inclusivamente clientes que tenham interesse em avaliar esta parceira de negócio. É algo que estamos a preparar e que terá a colaboração de um instituto politécnico da Região, assim como de entidades da região da Guarda.

“(…) pretendemos, até ao final do ano recrutar mais 30 pessoas (…)”

Faz parte dos planos recrutarem mais talento?
Sim, pretendemos, até ao final do ano recrutar mais 30 pessoas, entre engenharia, jovens licenciados, adultos em transformação de carreira bem como reforçar a equipa de recrutamento e management. Na área de engenharia, essencialmente as áreas de Desenvolvimento de SW, desde open-source a Microsoft, área de Cloud, DataScience e Cybersegurança. Estes são os nossos grandes pilares e onde somos experts e fortes no mercado.

Vão internacionalizar para o Brasil. Porquê este mercado?
Temos atualmente escritório em São Paulo e estamos a arrancar com a atividade, com uma equipa de comerciais e recrutadores. O Brasil é um mercado gigante e com uma dinâmica fortíssima em IT, por um lado, e, por outro, o fato de pertencermos a um grande grupo de engenharia, muito forte no Brasil, é a combinação perfeita para uma estratégia concertada nesse mercado.

A PTC Group, originária de Oliveira de Azeméis, está fortemente posicionada e consolidada no mercado de inovação de engenharia automóvel há mais de 15 anos em Portugal e no Brasil. A área de IT é complementar e consolidadora deste grupo no Brasil, sendo por isso, uma parceria forte e de crescimento conjunto neste mercado, com sinergias humanas e estratégicas muito fortes.

Como estão a delinear a estratégia de expansão da empresa?
Atualmente, queremos continuar a crescer em Portugal, Estados Unidos, Reino Unido e Suíça. Temos na nossa ambição também Espanha este ano. Para esta estratégia de expansão procuramos parceiros locais onde podemos trazer qualidade de talento e processos simples.

Quantos clientes têm neste momento?
Temos cerca de 12 clientes em indústrias como Banca, Serviços, Tecnologia, Marketing e IoT.

Trabalhar no Interior do país passou a ser atrativo?
Sem dúvida. Muitas pessoas começam agora a descobrir essa atratividade. A época de pandemia trouxe muitas mudanças na forma de estar, viver e trabalhar. O Interior cumpre os critérios de uma vida equilibrada. Pese embora ainda que as pessoas queiram perceber que serviços e apoio a região pode disponibilizar para uma mudança. Muitas pessoas e famílias ainda chegam como nómadas digitais, para avaliar, testar e sentir e depois acabam por decidir ficar, pela qualidade de vida que conseguimos ter aqui a todos os níveis.

“(…) viver e empreender no interior tem de ser de alma e coração cheios. Com sentido de missão e propósito”.

Continua a acreditar que o Interior é “esquecido por muitos, mas um diamante por delapidar”?
Sim. A GO IT é apenas uma parte ínfima deste contributo. As instituições locais, regionais e nacionais têm de incentivar e promover mais o Interior, mas, sobretudo, incentivar à descentralização. Vemos sempre grandes chegadas a Portugal de empresas que abrem os seus escritórios e escolhem sempre Lisboa ou Porto.

Criar condições para descentralizar é fundamental, porque o resto se seguirá. O Litoral está massificado, desgastado a vários níveis como as questões ligadas ao custo de vida, habitação, entre outras. A coerência das políticas mobilizadoras para a atração e fixação de população nestas regiões é fundamental, sobretudo uma melhor coordenação ao nível das autarquias com o apoio da Administração Central. Mas, mais do que isto, como também já referi noutros artigos, a verdade é que viver e empreender no interior tem de ser de alma e coração cheios. Com sentido de missão e propósito.

Em junho do ano passado, disse ao Link to Leaders que em três anos queria ter cerca de 100 colaboradores e superar os 4 milhões de faturação e que o mercado internacional representaria certamente mais de 70% do seu mercado de exportação de tecnologia”. Como estão estes objetivos?
É verdade. E estão no nosso “mapa” de execução. Acredito que em 2023 poderemos chegar aos 50 colaboradores, se conseguirmos atrair 30 novos colaboradores e ganhar tração nos mercados onde já estamos, mas sobretudo no Brasil. Reunimos todas as condições para chegar lá, com trabalho, entusiasmo, dedicação, ousadia e muita resiliência. É exatamente isso que nos carateriza e define, não tivéssemos nós a ousadia de nascer no Interior serrano mais profundo!

Projetos para o futuro…
O que temos como objetivos e missão para 2023, claramente vai definir este futuro. O futuro é por isso agora, em cada dia, em que damos o nosso melhor junto dos clientes em cooperação e colaboração para uma missão conjunta e um crescimento sustentável de todos: da empresa, dos seus colaboradores, do mercado e de uma região!

O que gostaria de realizar e ainda não teve oportunidade?
Levar a GO IT ainda mais longe, como referência de talento, de liderança, de missão, de propósito e de como através da tecnologia podemos deixar uma região melhor, uma comunidade melhor. A oportunidade está cá, a jornada segue para a sua concretização.

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