Opinião

O que o liga à sua organização?

Carlos Rocha, administrador do Banco de Cabo Verde

O primeiro mês do ano já passou. Assim sendo, só restam, de uma forma linear e simplista, cerca de 92% do tempo e de recursos para atingir os objetivos estipulados para este ano.

Na dinâmica da vida, para muitos, este é o primeiro ano na sua organização, mas, para outros, será a última na organização. Naturalmente, tirando os casos determinados pelas circunstâncias da própria vida (por exemplo, a reforma) muitos deixarão, livremente ou não, a atual organização para procurarem melhores condições, sejam elas de que natureza forem.

Efetivamente, já não vivemos na época do emprego para toda a vida, e muitos fatores contribuíram para o fim dessa época. A velocidade dessa alteração foi tanta que arriscamos a dizer que, em mais ou menos duas gerações, mudou-se o paradigma da ocupação profissional.

Existem várias causas, mas podemos, desde logo destacar um primeiro fator que é a tecnologia, no qual quase tudo assenta hoje em dia.

A evolução recente da civilização humana tem sido marcada por fenómenos que deixam marcas e que mudam paradigmas. No século XVIII tivemos a revolução industrial, mas falando dos nossos dias destacamos a tecnologia a ditar o funcionamento da sociedade e das suas diversas instituições e organizações.

Voltando ao nosso tema, a tecnologia foi, certamente, um dos fatores a provocar a mudança de paradigma e o desaparecimento do conceito de emprego para a vida, principalmente em determinados setores onde robôs e outras máquinas substituíram os homens em tarefas mecânicas e rotineiras. A tecnologia 5G mudará as regras, ao facilitar a internet das coisas (IoT) ou a massificação dos veículos sem condutor, sem falar do blockchain e as suas aplicações.

Mas o fenómeno continua, já não apenas com robôs e máquinas, mas agora o próprio algoritmo – falamos da inteligência artificial – começa a substituir ou a complementar (dependendo da perspetiva) o trabalho intelectual nas mais variadas áreas; finanças, medicina, engenharia civil, jurídica, segurança, etc.

Um segundo fator que, efetivamente, fez mudar esse conceito de emprego para a vida é a própria dinâmica do ciclo económico. Também não restam dúvidas de que os ciclos económicos – grande crescimento seguido de recessão – tiveram a sua influência. Ou seja, os ciclos económicos tornarem-se mais curtos, significa que atualmente se passa de um ciclo de crescimento para um ciclo de recessão mais rapidamente e com implicações ao nível do emprego. Nos ciclos de recessão perdem-se empregos e as pessoas são despedidas ou são forçadas a mudarem de emprego, enquanto que nos ciclos de crescimento podem ser criados mais empregos.

Um terceiro fator que mudou esse paradigma é, sem dúvida, as competências dos colaboradores. Hoje, com a massificação da tecnologia, da informação e do conhecimento, as pessoas têm mais oportunidades de se capacitarem e de evoluírem nas suas ocupações. Creio que todos nós somos testemunhas de pessoas que, com melhor capacitação e melhores competências, conseguiram melhorar a sua condição profissional. Ou seja, melhores competências podem permitir as pessoas terem melhores empregos, e é por isso que se vê alguma mobilidade no mercado do trabalho, quer ascendente, nos ciclos de crescimento, quer descendente, nos ciclos de recessão.

Mas além desses fatores que são válidos, as pessoas também mudam de organização por vontade própria. Por tudo isso tenho a seguinte pergunta: o que o liga à sua organização?

Sabemos que nem todos estão nas respetivas organizações por vontade própria, muitos estão porque as circunstâncias assim obrigam e assim a ligação que as une à organização é ténue. Mas também temos muitos que se dedicam com empenho, com muito brio profissional, não importam as circunstâncias, estão de corpo e alma na organização, podem, eventualmente, até suportar alguma injustiça pressentida, mas a ligação que as une à sua organização é forte. A esses, dedico a minha admiração.

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Carlos Rocha

Carlos Rocha

Carlos Rocha é economista e atualmente é vogal do Conselho de Finanças Públicas de Cabo Verde e ex-presidente do Fundo de Garantia de Depósitos de Cabo Verde. Foi administrador do Banco de Cabo Verde, onde desempenhou anteriormente diversos cargos de liderança. Entre outras funções, foi administrador executivo da CI - Agência de Promoção de Investimento. Doutorado em Economia Monetária e Estabilização macroeconómica e política monetária em Cabo Verde, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Lisboa, é mestre em... Ler Mais..

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