Opinião

Dizem todos os livros de gestão que os lugares no topo das organizações são solitários. Porque no fim do dia é a estes que compete decidir o rumo das organizações e fazer o que é necessário para chegar aos objetivos definidos (muitas vezes também por estes…).

Porque quem a eles reporta nem sempre tem capacidade (ou nem sempre lhes é dado espaço) para opinar sobre as decisões que têm de ser tomadas. Porque acima não há a quem fazer queixinhas ou imputar culpas, pelo que a responsabilidade (e o reconhecimento do que corre bem / culpa do que corre mal) é deles. No fundo, no fundo é sempre uma questão de ser forte ou fraco, é sempre uma questão de coragem!

Coragem para tomar as decisões que se entendem corretas… e para exigir ter argumentos sólidos para as tomar.
Coragem para utilizar os factos mesmo quando não gostamos deles… e manter as nossas posições, desde que double checked.
Coragem para fazer o que não se quer ou não se gosta de fazer… e para viver com as consequências do que fizemos.

E também
Coragem para enfrentar quem se opõe, com argumentos válidos…e para reconhecer quando não temos razão ou precisamos de ajuda.
Coragem para deixar a teimosia de lado…e para reconhecer que erramos.
Coragem para mudar de rumo quando é preciso…e para pedir desculpa.

Os dois problemas de fundo que minam muitas organizações – e a vida de muitas pessoas também…- têm sempre a ver com falta desta coragem, desta capacidade para procurar fazer o correto e reconhecer os erros.

Por um lado, umas figuras míticas – o “eles” ou os “outros”, que aparecem sempre que a vida corre mal. São umas criaturas vagas e indefinidas, que ninguém vê nem sabe quem são, como que duendes, mas que têm um poder imenso – o de justificar tudo o que corre mal.
E atrás da sua responsabilização nos vamos escondendo para evitar olhar de frente para os problemas e reconhecer o papel que neles desempenhamos (e quando as coisas correm bem estes seres desaparecem para só regressar quando voltam a correr mal…!).

E por outro, as desculpas de mau perdedor ou de espertalhaço.

Em versão alargada dos três macacos  – eu não vi, eu não ouvi, eu não disse – e também eu não sabia, eu não percebi, eu não fiz, eu não mandei …  – muitas vezes usando os tais seres míticos referidos atrás. Dizendo o que de momento nos “safa” de uma responsabilidade e confiando que não vai ser descoberta a desculpa – ou se, quando for, ninguém vai ir atrás dela.
Acreditando na impunidade da esperteza, da aldrabice e da mentira, vamos criando um campo minado de suspeita, de desconfiança, de mal estar e de revolta…

Transpondo estas realidades das vidas privadas ou das organizações para um país, nada muda!
A não ser  – pela dimensão e pela escala – a enorme capacidade de fazer mal a todos os que nele vivem.
Os mesmos seres míticos existem.
As mesmas desculpas esfarrapadas são usadas.
A mesma coragem está desaparecida.
A mesma retidão e carácter que deveriam estar presentes na atuação de quem governa estão por vezes em parte incerta.
Já uma vez escrevi que não queria estar na pele de quem decide neste momento
E acredito que a maioria de nós não o queira.

Mas isso não significa que nos possamos desresponsabilizar do que acontece à nossa volta, ou que tenhamos de aceitar ser ludibriados ou viver com a irresponsabilidade de quem tem a obrigação de decidir.

Não se sabia que ia haver mais vagas de Covid?
Não havia conhecimento da variante inglesa?
Não houve tempo para preparar o SNS entre junho e dezembro de 2020?
Não se proibiu a 100% o ensino – presencial ou remoto – nas medidas do estado de emergência de janeiro?
Não foi possível dotar quem precisa de computadores e ligação à internet para as aulas remotas como prometido?
Ou controlar o que fazer com as (poucas) vacinas que nos vão chegando?

A pressão do último mês não pode ser desculpa.
Os nossos governantes estão no poder porque querem.
Porque se apresentaram a eleições e as ganharam.
E assumiram o compromisso de guiar o nosso destino!
Têm então de o fazer de forma correta…ou de dar lugar a outros que o façam.
Neste tempo de emergências sucessivas em que vivemos, o desnorte de quem governa só faz mal a todos.
E o não ser capaz de assumir responsabilidade, erros e incapacidade de resolver sozinho os problemas que aparecem não é alternativa. De verdade, e como tão bem diz o Muchu do filme Mulan… “se queres ficar, colabora!” Se não, sai do caminho e dá lugar a quem nos queira tirar deste pântano sem seres míticos ou desculpas, mas com a coragem de que todos precisamos!

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Maria do Rosário Pinto Correia

Maria do Rosário Pinto Correia

Maria do Rosário Pinto Correia é Founder e CEO da Experienced Management e regente da disciplina de Marketing in The New Era (licenciatura em Business Management) na CLSBE. Coordena, ainda, três programas de Executive Education - PGV - Programa de Gestão de Vendas, EI - Estratégias de Internacionalização e CE – Comunicação Estratégica, e é responsável pelo desenvolvimento de atividades da Executive Education da CATÓLICA-LISBON no Brasil e na Ásia. Licenciada em Ciências Económicas e Empresariais pela Universidade Católica Portuguesa,... Ler Mais..

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