Opinião

Como otimizar os custos laborais no regresso ao novo normal?

Marta Frazão, Principal na Mercer Portugal

O aparecimento de desafios é sempre uma oportunidade para refletirmos sobre a trajetória que temos vindo a seguir, bem como para redefinirmos as nossas prioridades e para, eventualmente, redirecionarmos o nosso foco.

Este princípio, válido quer a nível individual quer corporativo, nunca foi de aplicação tão necessária como agora com os desafios que nos foram colocados pelo aparecimento desta pandemia.

Se olharmos à nossa volta, quer no mercado nacional quer internacional, vimos empresas a confirmar o seu compromisso com a saúde e o bem-estar das suas pessoas, mas simultaneamente a serem desafiadas quanto ao seu core business e mesmo à sua capacidade de sobrevivência.

Uma coisa é certa: o impacto da COVID-19 repercutir-se-á muito para além do pico do contágio, onde as principais preocupações eram as relacionadas com a capacidade de conectividade digital e a possibilidade de continuidade do negócio de forma remota. A verdade é que, de várias maneiras, a COVID-19 acelerou o nosso ritmo para implementar estratégias futuras de trabalho. O que antes eram estratégias para uma empresa se manter competitiva são agora necessidades para garantir a sustentabilidade dos negócios. E, é claro, este desafio organizacional é vivido muitas vezes em ciclos semanais, com a necessidade de efetuar atualização de cenários de curto, médio e longo prazo.

A partir de qualquer um dos vários cenários traçados, é fundamental encontrar um equilíbrio entre as necessidades de curto prazo e os impactos no longo prazo para que as empresas ultrapassem os desafios financeiros mantendo o compromisso dos seus colaboradores. Só desta forma a empresa estará em condições de se posicionar no mercado de forma competitiva.

Numa ótica de gestão de custos laborais, existem medidas que podem ser equacionadas e com efeitos imediatos, como por exemplo perceber se existem rubricas de compensação total que deixam de fazer sentido, rever a atribuição de certos subsídios ou congelar contratações.

Uma outra medida ainda pouco explorada e que poderia ajudar a gerir custos de curto prazo, não tendo, junto dos colaboradores, um nível esperado de disrupção elevado, está ligada com fomentar situações temporárias como part-time ou licenças sem vencimento que, dependendo dos níveis de adesão, podem colocar a empresa numa situação de menor pressão sobre os custos imediatos.

Existem, no entanto, outras medidas que podem não ter efeitos imediatos – por exemplo o facto de congelar aumentos salariais ou não atribuir remuneração variável – mas que poderão ter efeitos no ciclo de 2021.

Também a política automóvel e o espaço físico dos escritórios devem ser repensadas atempadamente para dar resposta a um novo normal onde deslocações de e para o escritório e, consequentemente, os níveis de ocupação poderão ser menores.

Na análise aos custos laborais deve-se igualmente fazer uma reflexão sobre benefícios como saúde e reforma não só ao nível do desenho em si como também ao nível de contratos e de eventual necessidade de negociação com prestadores e fornecedores.

Por exemplo, no caso de empresas que ofereçam planos de pensões de benefício definido, onde a volatilidade dos custos pode significar uma preocupação adicional para as empresas, podem conseguir-se poupanças significativas pela análise de adequação da política de investimentos, entre outras.

Uma outra vertente de gestão de custos incide sobre a própria função de RH. As poupanças nesta componente já vinham a ser exploradas mesmo antes da pandemia – talvez este facto explique uma ação mais rápida nas medidas que já foram tomadas. Dois dos exemplos de que muitas das empresas nos falam são a aplicação de metodologias de trabalho Agile ou automatização dos processos RH que até já estavam nas agendas pré-pandemia, mas que acabaram por ser aceleradas no contexto atual.

Por vezes os objetivos de redução de custos laborais apenas se conseguem alcançar com medidas mais musculadas, nomeadamente com redução da força de trabalho, que podem ser cirúrgicas ou massivas, mas que normalmente têm associados graus de disrupção elevados junto dos colaboradores.

Mas outras medidas podem ser exploradas como um foco na mobilidade interna. Por forma a minimizar saídas por mútuo acordo, com custos associados, pode-se identificar colaboradores com as características relevantes para o desempenho de funções noutros departamentos da empresa que sejam considerados estratégicos e que necessitem de ser reforçados, em detrimento de outros onde é preciso desinvestir.

Num processo de redimensionamento é muito importante tentar perceber as características das populações alvo e fazer uma análise criteriosa, fazendo as segmentações populacionais necessárias por forma a poder desenhar as melhores soluções para cada um desses grupos, dentro do orçamento disponível.

O principal desafio para as empresas será equilibrar a necessidade de tomar medidas que conduzam a uma redução de custos, protegendo o comprometimento e retenção do talento e atingindo os objetivos dos acionistas.

Para tal é fundamental apostar na comunicação com os colaboradores ao longo de todo o processo, monitorizar o impacto gerado pelas medidas tomadas e agir em conformidade para garantir que o caminho traçado é alcançado.


A Marta Frazão ingressou nos quadros da Mercer em 1997, sendo atualmente Principal e Responsável pela Consulting Team – equipa de consultores transversal às várias linhas de negócio da Mercer. É licenciada em Matemática Aplicada à Economia e Gestão, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa. Completou a parte curricular do Mestrado em “Atuariado e Gestão de Riscos Financeiros” pelo Instituto Superior de Economia e Gestão de Lisboa.

Iniciou a sua carreira profissional como atuária numa companhia seguradora. É coautora do livro “Análise da Estrutura Regulamentar do 2.º Pilar da Protecção Social”, publicado em 1998 após um estudo realizado pela Mercer para a Comissão do Livro Branco da Segurança Social. É Atuária Titular do Instituto dos Atuários Portugueses e certificada pelo Instituto de Seguros de Portugal como atuária responsável de Fundos de Pensões.

Acumula mais de 20 anos de experiência na avaliação, certificação, contabilização, desenho, redesenho, harmonização, formação e comunicação de benefícios.

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