Opinião
Belinda Okoth, a queniana que escolheu Portugal para produzir as suas roupas

Nasceu e cresceu no Quénia, mas escolheu Portugal para produzir a sua marca, a Jokoth que surgiu em plena pandemia. A sua missão é dar um boost de confiança a mulheres que querem fazer a diferença. Em entrevista ao Link To Leaders, Belinda Okoth fala do seu novo projeto, dos desafios que encontrou como a inflação e a crise dos fabricantes, e do que espera para o futuro.
Tem raízes no Quénia, mas os pés assentes em Portugal. Lançou em plena pandemia uma marca que quer dar mais confiança a todas as mulheres. Belinda Okoth, designer e fundadora da Jokoth, revela que “as peças da Jokoth são feitas à mão com a missão de elevar o guarda-roupa de todas as mulheres para que se sintam perfeitas”.
Segundo a empreendedora, a Jokoth só compra tecidos de fornecedores que tenham obtido um certificado de Global Organic Textile Standard (GOTS) e produz pequenas quantidades, através de coleções-cápsula de alta qualidade, que são intemporais.
Para além da Jokoth, Okoth também fundou a Girl Child Foundation, uma iniciativa inspirada na sua mãe que se destina, sobretudo, a crianças negligenciadas que são criativas ou nascem com competências empreendedoras. “Devido à pobreza ou ao abuso, estas raparigas precisam de ser encorajadas a encontrar algo belo que tenham criado por si próprias. O propósito da fundação é reuni-las para que possam aprender e inspirar-se mutuamente, sem o medo de serem rejeitadas pelo mundo”, conta a queniana que tem um Mestrado em Finanças e Economia, e que trabalhou seis anos como consultora de negócios, mas que agora se dedica à moda.
O que é a Jokoth?
A Jokoth é uma casa de moda sustentável. Vendemos moda de alta qualidade exclusivamente para mulheres que fazem a diferença. Jokoth é uma combinação de dois nomes inspirados pela teoria de Yin e Yang da filosofia chinesa. Ensina-nos a conciliar dois fatores opostos com o equilíbrio, de modo a encontrar a solução perfeita para os nossos problemas. A minha mãe é uma empreendedora natural. Quando fui batizada, foi ela que me deu o nome de Jecinta em homenagem a um mártir no Evangelho de 1910. O meu pai era ateu e acreditava apenas em factos, números e ciência. O nome Okoth pertence ao meu pai. J + Okoth = Jokoth.
Como são produzidas as peças? E como acha que a marca pode ajudar as mulheres a se sentirem mais confiantes?
Os nossos designs são de alta qualidade, básicos, mas únicos e intemporais. São edições limitadas feitas com um valor duradouro para a mulher contemporânea. A nossa missão é vender roupas elegantes e intemporais que se podem complementar facilmente e que podem ser usadas extensivamente ao longo das estações, sem se tornarem chatas. Para nós, cada detalhe faz parte de uma solução. Por isso, as nossas peças são feitas com amor.
Concentramo-nos, como referi, em edições limitadas muito pequenas, mas exclusivas, onde prestamos atenção a todos os detalhes, artesanato e design. Produzimos roupas de alta qualidade que são elegantes e duram uma vida inteira.
“As nossas peças de vestuário são fabricadas em Portugal sob elevados padrões éticos. São feitas à mão com a missão de elevar o guarda-roupa de todas as mulheres para que se sintam perfeitas”.
De onde obtêm a matéria-prima para as peças da Jokoth?
As nossas peças de vestuário são fabricadas em Portugal sob elevados padrões éticos. São feitas à mão com a missão de elevar o guarda-roupa de todas as mulheres para que se sintam perfeitas. As práticas de fabrico e cadeia de suprimentos da Jokoth têm o ecossistema em mente. Só cmpramos tecidos de fornecedores que obtiveram um certificado Global Organic Textile Standard (GOTS), que funciona como um padrão para tecidos orgânicos reconhecido internacionalmente.
Por que a moda sustentável demorou tanto para ter o seu ‘momento’?
Os consumidores perceberam o impacto dos produtos químicos tóxicos e resíduos de indústrias no nosso meio ambiente e o impacto de tais atividades através das mudanças climáticas. Em reação a isso, o consumidor mudou da moda de massa para produtos que podem ser sustentados a longo prazo.
O modelo de negócio da Jokoth é diferente do modelo tradicional. Damos primazia à produção circular, minimizando o desperdício e economizando a energia. Produzimos roupas que permanecem valiosas durante o maior tempo possível e sem causar danos irreversíveis ao nosso planeta. Além disso, o fato de nos focarmos em pequenos volumes significa que não temos alto consumo de energia devido ao desperdício de stocks, o que nos dá a vantagem de manter os níveis de CO2 no valores mínimos.
Quem a inspira na sua carreira?
Cresci rodeada de uma família forte e de espírito empresarial. Eu admirava as mulheres trabalhadoras que não têm medo de tomar a iniciativa, de experimentar os caminhos invictos. Normalmente admiro mulheres como a minha mãe, que são motivadas pela atitude empreendedora. Aos nove anos de idade eu já vendia roupas e tecidos num mercado como forma de ajudar a minha família.
Iniciou a sua carreira profissional no mundo das finanças. Como surgiu a paixão pela moda?
Sim, tenho experiência em negócios e economia e trabalhei para três organizações multinacionais na Holanda. A moda está no sangue, porque é uma qualidade que herdei da minha avó. Eu tenho duas irmãs que também estão no mundo da moda. O meu amor pela moda começou cedo, aos 9 anos. O meu pai era um “contador” impulsionado por académicos. Era um pouco convencional – mais do que minha mãe -, o seu gosto pela moda era colorido, mas nada perto da fantasia. Normalmente compra-nos vestidos com estampas feitas de algodão encerado africano. Infelizmente, essas roupas eram grandes e longas demais para os adolescentes. Então, eu reaproveitava as peças e produzia novas. Separa as mangas, criava vestidos com cintura justa e saias borboleta.
Na adolescência, cheguei a transformar o meu uniforme num blazer italiano slim fit e encurtei as minhas saias e estilizei a minha roupa. Parecia mais uma trabalhadora de alta costura do que uma adolescente de 16 anos. Cheguei a ditar tendências na escola e até tive problemas com o reitor.
“A Girl Child Foundation é uma iniciativa inspirada na minha mãe e destina-se, principalmente, a crianças abandonadas que são criativas ou nascem com competências empreendedoras”.
Também fundou a Girl Child Foundation. Em que é que consiste esta iniciativa?
A Girl Child Foundation é uma iniciativa inspirada na minha mãe e destina-se, principalmente, a crianças abandonadas que são criativas ou nascem com competências empreendedoras. Devido à pobreza ou ao abuso, estas raparigas precisam de ser encorajadas a encontrar algo belo que tenham criado por si próprias. O propósito da fundação é reuni-las para que possam aprender e inspirar-se mutuamente, sem o medo de serem rejeitadas pelo mundo. E, ao investirem nos seus talentos criativos e no seu empreendedorismo, têm a certeza de que terão a oportunidade de desenvolver as suas capacidades e restaurar positivamente tudo o que outrora nunca imaginaram que poderiam fazer sozinhas.
Que conselho daria a um jovem empreendedor?
Comecei o meu negócio num momento desafiador, de crise, e assisti a tudo, desde a inflação de preços à crise dos fabricantes. Acho que a resiliência para continuar mesmo quando as coisas ficam muito difíceis é o maior desafio de um empreendedor. Como muitos, já experimentei tantos falhanços devido ao facto de confiar rapidamente nas pessoas. Independentemente disso, aprendi a confiar no meu instinto e a trabalhar de maneira diferente com contratos. Tudo para proteger os meus negócios e parcerias.
Quais são seus planos para os próximos anos?
Se eu olhar para trás, há um ano eu não tinha nada – além de um pequeno livro e uma visão clara. Devido ao Covid-19, saí da Holanda sem informações, mas com uma missão clara de tentar encontrar fabricantes. Atualmente, temos uma boa parceria em três países, com distribuidores em Soho, Manhattan, Nova Iorque, Alemanha e Estocolmo.
Desde que lançámos a marca oficialmente a 27 de abril, as nossas vendas não param de crescer e acabámos de realizar a nossa primeira semana de moda em Málaga, em Espanha, onde fizemos as manchetes e editoriais de seis páginas na Vogue, incluindo uma parceria de comércio eletrónico com a Vogue Portugal. Isto é uma boa base para nós. Por isso, quero poder continuar a vender peças de alta costura que sejam muito exclusivas e influentes para as mulheres modernas de bom gosto e estilo.