Opinião
A hipocrisia da cultura woke

Se a cultura woke realmente sonha com um mundo mais justo e inclusivo, é essencial que esteja aberta ao diálogo e à crítica, sem recorrer à censura ou ao ostracismo como principais ferramentas de combate às divergências.
Nos últimos anos, a cultura woke, que inicialmente surgiu como um movimento de conscientização social e inclusão, tem demonstrado uma crescente intolerância à discordância. O paradoxo é evidente: um movimento que procura promover a diversidade de pensamento e inclusão, vê-se, muitas vezes, envolvido em polémicas de censura e exclusão daqueles que não seguem rigidamente os seus princípios.
Um dos exemplos mais emblemáticos dessa intolerância foi a reação ao comediante Dave Chappelle. Conhecido pelo seu humor afiado e sem filtros, Chappelle enfrentou boicotes e tentativas de cancelamento após abordar temas sensíveis, especialmente relacionados à identidade de género. A sua posição, ainda que possa ser debatida, foi rapidamente classificada como inaceitável por ativistas, levando a protestos contra as suas apresentações e até mesmo a tentativas de censurar o seu trabalho em plataformas de streaming. O caso de Chappelle ilustra como a cultura woke, ao invés de fomentar um diálogo aberto, frequentemente opta pelo cancelamento de vozes divergentes.
Outro exemplo recente que reflete esta tendência é a nomeação de um homem para a categoria de Melhor Atriz nos Óscares de 2025. Este episódio evidencia uma crescente tensão entre a militância woke e a lógica tradicional de categorias de premiação. Se por um lado há um esforço legítimo de inclusão e reconhecimento da diversidade, por outro, a decisão levanta questões sobre os limites da redefinição de categorias e o impacto que isso tem sobre mulheres que historicamente lutaram por espaço e reconhecimento em premiações da indústria cinematográfica.
Além de Chappelle, outro humorista que tem se destacado pela sua coragem em desafiar o politicamente correto é Ricky Gervais. Gervais, conhecido pelo seu estilo direto e sem papas na língua, tem repetidamente criticado a cultura woke e a hipocrisia de muitas figuras públicas que apoiam esse movimento apenas para manter a sua imagem. As suas apresentações nos Globo de Ouro tornaram-se icónicas pela sua vontade em expor as contradições da indústria do entretenimento e a superficialidade do ativismo de algumas celebridades. O seu humor não provoca apenas gargalhadas, mas também levanta questões fundamentais sobre liberdade de expressão e a capacidade de lidar com opiniões divergentes sem recorrer à censura.
O perigo do cancelamento reside na impossibilidade de discutir e debater temas fundamentais para a sociedade. Um dos casos mais emblemáticos desta nova cultura de silenciamento foi o da escritora J.K. Rowling, criadora da saga Harry Potter que, por expressar as suas opiniões sobre sexo biológico e identidade de género, Rowling foi alvo de boicotes, ameaças e tentativas de exclusão de sua própria obra. A questão que se coloca é: quem está por trás destes cancelamentos? Trata-se de uma minoria barulhenta que impõe as suas visões sem aceitar qualquer forma de debate? São grandes empresas que, temendo retaliações, preferem aderir cegamente ao politicamente correto? É preciso fazer estas perguntas porque, quando figuras públicas são silenciadas por expressarem as suas opiniões, a sociedade perde a oportunidade de debater temas essenciais para o seu progresso.
Os exemplos anteriores apontam para um dilema central: até que ponto a cultura woke está disposta a aceitar visões diferentes de mundo? Quando a busca pela inclusão resulta na exclusão de quem discorda, corre-se o risco de se tornar aquilo que se combate: um movimento dogmático, fechado ao debate e incapaz de lidar com a pluralidade real de pensamentos.
A defesa da diversidade deve incluir também a diversidade de opiniões. Se a cultura woke realmente sonha com um mundo mais justo e inclusivo, é essencial que esteja aberta ao diálogo e à crítica, sem recorrer à censura ou ao ostracismo como principais ferramentas de combate às divergências.
Para que um debate saudável aconteça, é necessário que figuras como Dave Chappelle, Ricky Gervais e J.K. Rowling tenham espaço para expressar as suas opiniões sem o risco constante de cancelamento. A liberdade de expressão deve ser protegida, não apenas para os que concordam com a narrativa predominante, mas também para aqueles que desafiam as suas premissas. Afinal, uma sociedade verdadeiramente plural e democrática fortalece-se justamente na troca aberta de ideias e na disposição de enfrentar pontos de vista opostos com argumentos, e não com silenciamento.