Opinião

Diagnóstico errado, solução errada, problema novo*

Carlos Rocha, administrador do Banco de Cabo Verde

É costume de um tolo, quando erra, queixar-se dos outros. É costume de um sábio queixar-se de si mesmo. Sócrates.

A liderança vive tomando decisões por forma a implementar as políticas que, ao serem implementadas, levem aos objetivos preconizados. Aliás, não é só a liderança, todos tomamos decisões.

Mas também há lideres que não gostam de tomar decisões, ou pelo menos as decisões menos populares, empurrando as situações em que devem tomar decisões para o próximo. Mas feliz ou infelizmente, a gestão não é um concurso de popularidade em que se deve ser o mais populista possível, pelo contrário, há casos em que a situação exige firmeza e/ou mesmo impopularidade no curto prazo na implementação das boas decisões de longo prazo.

Julgo que, inerente ao processo decisório, podemos identificar, por um lado, o receio do desconhecido, próprio do ser humano e, por outro lado, o receio de errar da parte que quem toma decisões. Erros são cometidos em todas as profissões, em todos os campos da ciência, do desporto, da religião, das artes, e até há erros que acabaram por criar novos produtos os quais hoje facilitam-nos a vida. Mas também há erros que custaram caro em termos de recursos e de vidas humanas.

Portanto, o problema não é o erro em si (ou seja, não estaremos a discutir a natureza do erro), mas sim a postura do líder face ao erro já cometido. A citação de Sócrates é bem paradigmática: a quem imputar a culpa pelo erro? A culpa deve ser assumida pelo(s) autor(es), mas, em última instância, pelo líder da equipa. Costuma-se dizer que quem não erra é quem não toma decisões e, talvez seja por isso que referi no início que há muitos líderes que empurram o processo decisório para frente.

Mas quem é líder não tem escolha entre tomar ou não decisões! Faz parte da sua atividade tomar decisões. Portanto, se queremos minimizar o risco de errar nas decisões, é necessário conhecer minimamente o problema e a solução proposta.

Errando no diagnóstico
Minha grande convição é que a maior parte dos erros cometidos e suas respetivas consequências são devido a um deficiente diagnóstico dos problemas. Fazendo o meu diagnóstico (esperando não estar errado), julgo que o grande erro cometido em todas as esferas da vida é uma deficiente destrinça entre a causa e a consequência, ou seja, as soluções propostas muitas vezes são para as consequências do problema e não para as causas do mesmo problema. São paliativos, não são cura. Muitas vezes tratamos o fruto como sendo o “problema”, quando o verdadeiro problema está na raiz. Um correto diagnóstico deve fazer a clara distinção entre a causa que origina o problema e as consequências ou resultado desse problema, caso contrário não estaremos resolvendo o verdadeiro problema e corremos o risco da suposta solução criar um problema novo.

Criando um problema novo
Assim, cria-se um ciclo vicioso e quem propôs a suposta solução acha que afinal o problema (que continua sendo mal identificado) era mais grave ou mais profundo, pois veio ramificar e criar mais um problema (que não existia, mas sim foi criado pela suposta solução).

Isso tem acontecido muitas vezes no dia a dia porque parece que perdemos um pouco a capacidade de parar e de pensar objetivamente, analisar profundamente e só depois propor soluções.

A influência das redes sociais parece ter contribuído também. Não temos tempo e ficamos apenas ao nível superficial e, como alguém disse, ficamos apenas ao nível do bold e não lemos as letras pequeninas, ficamos o tempo todo repetindo as análises, diagnósticos e soluções que mostraram ser ineficazes para o atual contexto. Muitas destas análises e soluções são do tempo da máquina de dactilografar e do telefone analógico e de um ambiente estável e previsível, mas que são agora transportadas para o novo contexto, um pouco diferente.

*Enfim, diagnóstico errado, solução errada e temos um problema adicional para resolver. E espero também não ter caído no mesmo erro.

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Carlos Rocha

Carlos Rocha

Carlos Rocha é economista e atualmente é vogal do Conselho de Finanças Públicas de Cabo Verde e ex-presidente do Fundo de Garantia de Depósitos de Cabo Verde. Foi administrador do Banco de Cabo Verde, onde desempenhou anteriormente diversos cargos de liderança. Entre outras funções, foi administrador executivo da CI - Agência de Promoção de Investimento. Doutorado em Economia Monetária e Estabilização macroeconómica e política monetária em Cabo Verde, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Lisboa, é mestre em... Ler Mais..

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