Opinião
Vaga empreendedora faz jus ao passado da Índia

70 anos após a independência, a Índia está a voltar à sua grandeza de antes. Conquistou posição de grande destaque nas Tecnologias de Informação (TI), e nas Telecomunicações. É de certo modo, o centro de R&D mundial, onde muitas multinacionais (mais de 1750) têm o seu Global Capability Center. Produz anualmente um escol de engenheiros e técnicos da mais alta qualidade, que estão a afirmar-se no mundo avançado.
Em conjunto com isso e a criação e acumulação de riqueza, surgem hoje muitas inovações e start-ups no solo indiano. Investidores mais informados do mundo apostam fortemente nelas. Provavelmente, serão ideias/tecnologias que marcarão a próxima fase de geração de riqueza.
A Índia silenciada e irrelevante até há poucos anos, passou a ser o terceiro maior ecossistema, com mais de 60,770 start-ups reconhecidas (22-Dez-2021). Delas, cerca de 90 são unicórnios (empresas com uma valorização superior a $1 bn), e, desses, 46 só no ano 2021! Curiosamente, o estudo conduzido pelo Prof. Ilya A Strebulaev, da Stanford University, conclui que dos 500 unicórnios norte-americanos, 90 são de empreendedores nascidos na índia!
No ano 2021, mais de $42 bn foram investidos nas start-ups indianas por empresas privadas. É um sinal claro de que a juventude indiana está motivada, além de ser execionalmente criativa. Quer fazer avançar o país na criação de riqueza e de trabalho. Masayoshi Son, fundador e dono do Softbank, investiu $3 bn na índia, em 2021, e afirmou: “Acredito no futuro da índia. Acredito na paixão dos jovens empreendedores da Índia. A índia será grande”.
Ao observar as realizações humanas vemos que há uma oportunidade para cada coisa. A convergência de vários fatores como o saber, a necessidade, a disponibilidade de recursos, fazem um click e dão luz a uma ideia. A seguir ela será aperfeiçoada para ser fácil de utilizar, prática e eficaz.
Gradualmente, os países foram avançando, com descobertas e realizações úteis. Elas foram aproveitadas pelos vizinhos, acrescentado algo próprio. Alguns povos avançados no plano intelectual e na aplicação do saber à vida, chamaram à atenção de outros, habituados a criar conflitos e a invadir, a dominar e apropriar-se do que pudessem, por terem força e armas.
Poderiam parar aí, mas a sua condição de baixo nível, fazia-os desumanos e egoístas: destruir o país conquistado, não sem antes terem aprendido as suas técnicas, para lhe vender depois os produtos fabricados na sua terra, com matérias-primas do país dominado é o seu objetivo.
Estou a referir-me a Índia e ao Reino Unido. Até aos séculos XVI e XVII, a Índia era o país unificado pela dinastia Akbar, que mais riqueza produzia, com preponderância no comércio mundial. Antes, ela fora centro de muitas descobertas da ciência, matemática, medicina, astronomia, etc. E, em consequência, tivera que repelir muitas invasões, incluindo a de Alexandre Magno.
Em 1526, os Moghuls invadiram a Índia. Foi Dabur quem derrotou o poderoso Ibrahim-Lodi (que regia o Sultanato de Delhi), em Panipat, em 21 de abril de 1526. Estava o caminho preparado para o começo da Era Moghul que reinou por mais de três séculos. Foi, provavelmente o período alto na História da Índia, transformando-a no mais importante polo de cultura, de indústria e de comércio internacional. Em 1750, a Índia era responsável por 25% da produção industrial do mundo. Tais produtos e as ricas colheitas do Império eram vendidos em todo o mundo. As principais indústrias incluíam têxteis, pigmentos, construção naval, aço, pedras preciosas, especiarias, etc.
No seu apogeu, em 1690, o Império Moghul reinava sobre quase todo o subcontinente indiano, controlando 4 milhões de Km2 e uma população de cerca de 160 milhões. O Imperador Shah Jahan, que mandou construir o Taj Mahal, em homenagem à sua falecida mulher, herdara um império fabuloso, em 1627. Dizem os historiadores ingleses que, em 1700, a Índia produzia 27 % da riqueza mundial, enquanto a Europa não passava dos 23 %.(A.M.). Em 1500, tinham chegado os portugueses à India, pondo a descoberto a sua enorme riqueza que já era conhecida. Estabeleceram-se em Goa e levaram muitos produtos para a Europa, pela nova rota comercial, contornando o Cabo da Boa Esperança. Lisboa passou, assim, a ser o novo centro comercial do mundo. Isso despertou outros gananciosos europeus, dextros na arte de marinhar, que se lançaram em busca da riqueza da índia.
Os ingleses entram na Índia como comerciantes, através da East India Companay (EIC), fundada em 1600, quando Akbar ocupava o trono. No primeiro século, a Companhia estava focada no comércio, mas a pouco e pouco, com o apoio da Coroa, foi formando um exército de 200 mil soldados. A EIC foi ganhado presença no país e ao ver-se forte, entrou em confronto com o exército de Akbar.
Após a primeira Guerra Anglo-Moghul os interesses da EIC viraram-se para o território, durante o século XVIII, à medida que o Império Moghul declinava. As batalhas de Plassey e Buxar, na qual a EIC venceu o Nawab de Bengala, deixou-a com o controlo da industrializada Bengala Moghul e o direito de cobrar receitas em Bengala e Bihar, acabando por ser a maior força militar e política na Índia.”[1] A partir daí, vitória após vitória deu-lhe o domínio de toda a península, subjugando e explorando quanto possível.
A península do Hindostão tinha no seu ativo notáveis avanços, com descobertas que a Europa só faria mais de cinco séculos depois. As primeiras universidades são todas na índia, do século V AC, ao século XII da nossa era. Os europeus entretinham-se a guerrear, dominar e explorar. Os indianos dedicaram-se a pensar, a entender a natureza, a aplicar-se à matemática, à fisica, à medicina, à astronomia, etc.
Terá contribuído para o fracasso indiano frente aos ingleses, o facto de ser uma sociedade estratificada e dividida, sem coesão interna, com exploração dos estratos pobres, sem direitos, pelos mais poderosos. Seria fácil a qualquer dominador provido de armas que fosse de aliança em aliança, com traições a alternar, subjugando os principados e reinados locais, avançando como um tsunami, até tomar o controlo de toda a extensão do país.
Economistas Ingleses referem como a riqueza foi apossada e o país reduzido à fome, pobreza e miséria[2]. Outros autores têm dado grande relevo à qualidade da sua produção industrial, como é o caso de Jabez T. Sunderland[3]: “Quase todos os tipos de manufatura e produtos conhecidos no mundo civilizado – quase todo o tipo de criação da mente e mãos humanas, existente em qualquer parte, e premiados pela sua utilidade ou beleza – eram há muito feitos na Índia. A Índia era de longe a maior nação industrial e manufatureira, mais do que qualquer outra na Europa ou na Ásia.
Os seus têxteis – finos produtos dos seus teares, em algodão, linho, lã e seda – eram famosos no mundo civilizado; bem como a esplêndida joalharia e as pedras preciosas lapidadas em lindas formas; também o eram a porcelana e a cerâmica, de todos os tipos, qualidade, cor e formas; e os delicados trabalhos em metal: ferro, aço, prata e ouro.
“Tinha grande arquitetura – igual em beleza a qualquer outra do mundo. E notáveis trabalhos de engenharia. E grandes mercadores, homens de negócio, banqueiros e financeiros. Não era só a maior nação construtora de barcos, mas tinha muito comércio por mar e terra que se estendia por todos os países civilizados conhecidos. Assim era a Índia que os britânicos encontraram quando lá chegaram.”
*Professor da AESE-Business School, do IIM Rohtak (Índia) e autor do livro “O Despertar da Índia”
[1] O Saber na India: criação, aplicação e difusão, Nota da AESE Business School, da autoria de Prof. Eugenio Viassa Monteiro e do Eng. Carlos A. Monteiro.
[2] Angus Maddison e William Dalrymple.
[3] Jabez T. Sunderland, India in bondage: Her right to Freedom and a place among the great nations, New York: Lewis Copeland, 1929, p. 367. Citado em An Era of Darkness, Shashi Tharoor, pp 3 e seguintes.