Entrevista/ “Existe a noção de que todas as start-ups têm na sua conceção uma ideia multimilionária”

Francisco Moreira e Steve Folwell integram uma start-up inglesa de sucesso e agora partilham em livro as experiências e os conhecimentos adquiridos. Leia a entrevista na íntegra a Francisco Moreira, coautor da obra “A Start-up Vencedora”.
Que tipo de star-up construir? Como se deve começar? O que fazer para que o negócio seja bem estruturado? Estas são algumas das questões que pode ver respondidas no livro a “A Start-up Vencedora”. O Link To Leaders falou com Francisco Moreira, coautor do livro, sobre o que é preciso para lançar um negócio lucrativo e sobre a sua experiência com a LOVESPACE, uma start-up inglesa de sucesso.
Francisco Moreira é gestor e um apaixonado pela escrita. Mestre da Hult International Business School, foi product manager na CSC, uma empresa que integra a Fortune 200. É membro fundador e foi responsável pelo planeamento estratégico da Oeiras International School, em Portugal. Integrou a LOVESPACE na fase de arranque, sendo atualmente o seu International Expansion director.
O que o levou a lançar, juntamente com Steve Folwell, o livro A Start-up Vencedora?
Este livro é o resultado de uma conversa contínua que o Steve Folwell e eu temos tido enquanto trabalhamos na LOVESPACE e também nas várias conversas ao longo dos anos com empreendedores e com aqueles que ambicionam ser empreendedores. O Steve, junto com o Brett Akker e o Carl Ameln, lançou a LOVESPACE – a primeira empresa de “storage-by-the-box” – com o objetivo de transformar a indústria do self-storage.
Tem sido um percurso desafiante com vários grandes momentos de aprendizagem, que nos permitiram desenvolver um método que nos tem servido bem na LOVESPACE. Método este, que acreditamos ser útil, tanto para outros empreendedores como para os que ainda estão a ponderar lançar o seu próprio negócio. Este livro é uma reflexão sobre os elementos essenciais para a criação de uma start-up de sucesso. Desde o desenvolvimento de um produto que tenha procura, ao financiamento do crescimento da empresa.
O nosso livro tem conselhos importantes para os empreendedores aplicarem em todas as fases da criação do seu negócio. Mas se tiver que os resumir numa só ideia, destaco que um empreendedor deve evitar dar um passo maior do que a perna…
Que conselhos deixa a quem quer criar um negócio?
O nosso livro tem conselhos importantes para os empreendedores aplicarem em todas as fases da criação do seu negócio. Mas se tiver que os resumir numa só ideia, destaco que um empreendedor deve evitar dar um passo maior do que a perna para que possa investir no que funciona e eliminar o que não funciona.
Isto traduz-se em três conceitos essenciais:
- Minimum Viable Product (MVP) – Desenvolver produtos e serviços é caro, precisam de investimento em capital e recursos humanos e leva tempo. E nem sempre é possível prever que versão de um produto vai ter maior sucesso com o público alvo. Por isso, a lógica é investir o mínimo possível para se criar um produto ou serviço com as funcionalidades mínimas, que cumpra o propósito para o qual foi desenhado.
- Invistam no vosso crescimento – Em todos os momentos, uma empresa deve estar a investir no seu crescimento. Pois, sem clientes é impossível melhorar o MVP e aprender o que os clientes realmente querem. Só quando se investe no crescimento é que é possível identificar os canais de marketing de maior sucesso, quais os clientes que serão mais lucrativos e quais as funcionalidades do vosso produto e/ou serviço que vos darão o maior retorno sobre o investimento.
- Saibam os vossos números – De uma forma resumida, para um negócio ser lucrativo cada cliente tem de gerar uma receita maior do que o custo de servir esse cliente e de o adquirir. As decisões de investimento têm de afetar um desses três elementos. Se não souberem os valores relativos a cada um destes elementos, torna-se impossível tomar decisões acertadas e lucrativas.
Um empreendedor tem de criar primeiro o seu MVP e de o disponibilizar ao seu público alvo. Se a reação for positiva, ou seja, se a empresa angariar clientes para o seu MVP, então tem aí uma indicação do seu potencial sucesso.
Como saber que uma ideia pode ter sucesso ou estar votada ao fracasso?
Se aceitarmos que o sucesso é definido como existindo procura suficiente para o produto ou serviço que o empreendedor cria, então identificar se uma ideia está votada ao sucesso ou fracasso vai sempre depender da reação do público alvo. Um empreendedor tem de criar primeiro o seu MVP e de o disponibilizar ao seu público alvo. Se a reação for positiva, ou seja, se a empresa angariar clientes para o seu MVP, então tem aí uma indicação do seu potencial sucesso.
Em cada etapa de crescimento da start-up o que o empreendedor está a fazer é a confirmar que existe procura suficiente pelo produto para se justificar o negócio que se vai criando à volta desse e outros produtos ou serviços.
Quais os ingredientes para uma start-up vencedora?
De uma forma simplificada os ingredientes são o desenvolvimento de um produto ou serviço que tenha procura suficiente para se justificar a existência do negócio, que é publicitado de uma forma lucrativa, e cujo desenvolvimento, produção e prestação de serviço é realizado de uma forma eficiente.
Como é impossível um empreendedor conhecer perfeitamente todas as áreas de um negócio, e como não consegue estar em todos os sítios ao mesmo tempo, o grande ingrediente de uma start-up vencedora é ser liderada por um fundador que sabe contratar as pessoas certas e criar as condições para que estas possam ser as mais eficazes e eficientes no seu trabalho.
A aversão ao risco de falhar na minha opinião pode explicar porque é que ainda existem muitas mentes brilhantes que continuam a trabalhar em cargos que não lhes permite realizar o seu potencial…
O facto de os portugueses associarem o falhanço a uma conotação negativa pode justificar o encerramento de muitas start-ups?
A aversão ao risco de falhar pode explicar porque é que ainda existem muitas mentes brilhantes que continuam a trabalhar em cargos que não lhes permite realizar o seu potencial – seja numa start-up ou noutra empresa. Pode também explicar porque é que ainda existem pessoas que veem as start-ups como uma moda e um estilo de vida demasiado arriscado, e por isso acredito que tenha levado a que existam menos start-ups do que poderia haver.
No que toca ao encerramento de muitas start-ups, acho que, normalmente, deve-se a fatores mais tangíveis como, por exemplo, um produto que não captou clientes suficientes para fazer crescer um negócio, ou até uma empresa com um produto com sucesso, mas que, num momento chave, teve o azar de não conseguir financiamento. O mais importante, para os que tentam e falham, é perceber que falhar faz parte da vida do empreendedor. Daí existir a expressão “Fail often, fail fast”. Porque o importante é aprender com os erros e construir uma melhor empresa a partir dos mesmos.
O que devem fazer os empreendedores se não tiverem uma ideia que vale milhões?
Existe a noção de que todas as start-ups têm na sua conceção uma ideia multimilionária. Ou seja, é atribuído ao empreendedor a capacidade de antecipar o futuro e de saber que a ideia se iria tornar num negócio multimilionário. Não só penso que a maioria dos negócios multimilionários se tornaram assim como resultado de horas de trabalho e sorte, como acredito que esta perspetiva não faz justiça aos milhões de empreendedores que todos os dias trabalham em start-ups cujo objetivo não é ser uma nova Farfetch ou Talk Desk.
Nos primeiros dias, o maior desafio é encontrar clientes. Quando se cresce aparecem desafios de financiamento, contratação, operacionais, etc…
Quais os desafios que os jovens empreendedores continuam a ter de enfrentar?
Ser empreendedor é escolher um estilo de vida, através do qual o dia a dia é superar desafios. Estes desafios vão ganhando novas formas consoante a etapa em que uma start-up se encontra. Nos primeiros dias, o maior desafio é encontrar clientes. Quando se cresce aparecem desafios de financiamento, contratação, operacionais, etc…
Acho que para um jovem empreendedor a forma como encara estes desafios vai depender em grande parte da experiência que tem. Por exemplo, é mais fácil para um empreendedor encontrar financiamento se tiver contacto com investidores. Não é muito provável um empreendedor saído da faculdade ter tais contactos. Mas se este jovem empreendedor tiver trabalhado numa start-up antes de criar a sua, e ao longo de três, quatro anos for criando uma rede de contactos e construindo uma boa reputação, vai ser tudo mais fácil.
Por isso, o maior desafio para um jovem empreendedor é a falta de experiência. Mas até este obstáculo dá para ser superado. Vai dar trabalho? Sim, claro. Mas a vida do empreendedor é esta: superar os obstáculos que impedem as suas ideias de se realizarem.
Com a LOVESPACE é muito mais simples. Nós tratamos da recolha, do armazenamento e da entrega final. O cliente apenas vai ao nosso site e faz a encomenda diretamente e dentro de poucos minutos.
Como surgiu a ideia de criar a LOVESPACE?
Surgiu de uma observação feita pelos nossos fundadores de que a indústria de armazenamento pessoal (“Self-Storage”) é uma indústria onde a tecnologia é pouco utilizada e os níveis de serviço ao cliente são mínimos. E é também uma indústria onde os clientes têm pouca flexibilidade de contratação dos serviços. Um cliente que procura armazenar os seus bens, seja para ganhar espaço em casa ou para fazer uma mudança, tem imenso trabalho.
No modelo clássico, tem de ser o cliente a decifrar de quanto espaço precisa, depois tem de ligar aos vários armazéns para descobrir alguém que tenha esse espaço, depois ainda tem de alugar uma carrinha, embalar as suas coisas, realizar o transporte e descarregar tudo para o armazém. Que neste caso normalmente é uma sala dentro de um armazém de terceiros. E neste modelo é comum um cliente estar efetivamente a alugar uma sala e, mesmo que retire alguma coisa dessa sala, tem sempre de pagar pelo espaço todo.
Com a LOVESPACE é muito mais simples. Tratamos da recolha, do armazenamento e da entrega final. O cliente apenas vai ao nosso site e faz a encomenda diretamente e dentro de poucos minutos. Os clientes apenas pagam por item (caixa, cadeira, mesa, etc…) e pelo que têm no armazém, evitando assim pagar por espaço que não utilizam.
É mais fácil empreender em Londres ou em Portugal?
Ser empreendedor nunca é fácil, independentemente do país ou da cidade onde se está. Como as dificuldades/facilidades de se empreender em Londres ou Lisboa são inteiramente subjetivas à realidade de cada empreendedor, ao tipo de start-up e da indústria da mesma, o que penso ser de maior valor é pensar como é que uma start-up na Europa se pode aproveitar do que há de bom em cada mercado.
O grande benefício que temos em pertencer à União Europeia é que nos é possível beneficiar das realidades de cada um dos países dos estados-membros. Por exemplo, existe mais capital para investimento em Londres do que em Lisboa, e por isso é importante para algumas start-ups terem presença em Londres. Por outro lado, a vida londrina é cara e por isso os salários são mais elevados. Para uma start-up que tem um budget limitado, é muitas vezes preferível contratar mais pessoas em Portugal e ter uma equipa maior que pode ter mais impacto, do que contratar uma pequena equipa em Londres.
Para si, quem é neste momento a start-up vencedora em Portugal? E porquê?
Portugal está a passar por um momento histórico, com várias start-ups a terem sucesso junto dos seus clientes, o que tem levado a ritmos de crescimentos elevadíssimos e a que muitas sejam consideradas “unicórnios”, como é o caso da Outsystems, Unbabel, Talk Desk e a Farfetch. Todas são impressionantes e têm tido sucesso em áreas muito diversas.
Respostas rápidas:
O maior risco: Não investir no crescimento.
O maior erro: Não ouvir o cliente.
A melhor ideia: Crescer primeiro, depois otimizar.
A maior lição: Antes de tomar uma grande decisão parar, encontrar um momento de reflexão, reavaliar e só depois atuar.
A maior conquista: Sentir que contribui para o sucesso das pessoas que trabalharam para mim, principalmente quando as vejo a lançarem os seus próprios negócios ou a conquistarem cargos de chefia.