Opinião

Por um Estado (mais) inteligente

Carlos Sezões, coordenador da Plataforma Portugal Agora

Já há muito que defendo e escrevo algo que é óbvio: o nosso Estado e a respetiva Administração Pública têm de mudar os seus processos e estruturas e serem mais eficientes e eficazes.

Para tal, é imperativo desenvolver estratégias para algo que designei no passado como “agilidade institucional”. Com efeito, vivemos num mundo cada vez mais incerto, volátil e complexo. Receitas tradicionais, lineares e centralizadas não funcionam – e temos esta evidência na atual incapacidade dos poderes públicos gerirem sistemas complexos como a saúde, a educação e ou a habitação.
Ou em responder eficazmente a imprevistos e calamidades, sejam elas de origem natural ou humana, como pandemias ou vagas de incêndios. Ou na resposta a transformação sociopolíticas e culturais, como as vagas migratórias. Em suma, os processos de análise de informação, tomada de decisão e execução das respostas não podem (ou não devem) ter o mesmo ritmo da burocracia dos séculos XIX ou XX.

Não existem soluções mágicas para este desafio. Teremos de endereçar várias linhas estratégicas e de ação. De uma nova arquitetura de “Governo”, como mais interação e cooperação interministerial orientada a resultados e impactos desejados na sociedade – com uma melhor gestão e formulação de decisões. De modelos de liderança pública mais sintonizados com os novos tempos (do “comando e controlo” ao “apoio e desafio”) a mais e melhores competências digitais.

Felizmente, temos hoje mais opções para desenhar as referidas soluções. Uma delas, tecnológica, é clara e deve ser aproveitada – a inteligência artificial (IA). A designada Generative AI (a tecnologia que gera conteúdo através de modelos matemáticos e algoritmos que aprendem e assente em large language models (LLM) – base do já famoso ChatGPT – tem o potencial de aumentar a eficiência e a eficácia dos governos e da administração pública de várias formas – assim seja encarada como uma oportunidade. Aqui deixo, desde já, alguns exemplos:

  • Melhor comunicação e envolvimento do cidadão: chatbots/assistentes virtuais com tecnologia AI podem fornecer aos cidadãos respostas instantâneas às suas questões, suportando conversas básicas de atendimento ao utente; tal pode incrementar o exercício de cidadania e o envolvimento dos indivíduos na vida das suas comunidades.
  • Modelagem e simulação de políticas: a Generative AI pode ser utilizada para modelar e simular cenários de políticas e projetos, com múltiplas variáveis, ajudando os governos e decisores públicos a antecipar os possíveis impactos de diferentes opções; tal permite a tomada de decisões com base em evidências, com avaliação mais racional de várias escolhas, pré-implementação.
  • Automatização de tarefas repetitivas: a AI pode automatizar tarefas administrativas de rotina, como entrada de dados, preenchimento de formulários – deslocando o capital humano para atividades mais complexas e de maior valor acrescentado;
  • Processamento de linguagem natural: a Generative AI pode processar e analisar grandes volumes de dados não estruturados, incluindo documentos, relatórios e feedback público; tal pode ajudar as administrações a extrair informações, identificar padrões e tomar decisões baseadas em dados com mais eficiência;
  • Análise preditiva para alocação de recursos: ao analisar dados históricos e tendências, a IA poderá ajudar os governos a prever e alocar recursos com mais eficiência – por exemplo, o número de funcionários nos vários serviços públicos, em função de fenómenos de sazonalidade ou emergências.

Sim, tudo isto não se fará por decreto, da noite para o dia. Exigirá tempo para estabelecer normas éticas (ex. privacidade de dados e supervisão humana das decisões), literacia e competências digitais e uma “cultura” de gestão baseada em dados e orientada a resultados. Mas há que começar. Ontem, de preferência.

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Carlos Sezões

Carlos Sezões

Carlos Sezões é atualmente Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders, startup focada na transformação organizacional/ cultural e no desenvolvimento do capital de liderança das empresas. Foi durante 10 anos Partner em Portugal da Stanton Chase, uma das 10 maiores multinacionais de Executive Search. Começou a sua carreira no Banco BPI em 1999. Assumiu depois, em 2001, funções de Account Manager do portal de e-recruitment e gestão de carreiras www.expressoemprego.pt (Grupo Impresa). Entrou em 2004 na área da... Ler Mais..

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