Entrevista/ “Podemos ter lojas de decoração La Redoute no futuro próximo”

A La Redoute é hoje um dos líderes do e-commerce nos setores de moda e casa. A empresa, que acaba de ser comprada pelo Grupo Galerias Lafayette, está presente em mais de 20 mercados, entre os quais Portugal. Ao Link To Leaders, o CEO da La Redoute Portugal falou dos desafios no nosso mercado e traçou o plano para os próximos anos. Há novidades a caminho.
Estávamos em 1988 quando a La Redoute deu os primeiros passos em Portugal. Lembra-se? Já passaram 30 anos. Foi no ano em que Rosa Mota venceu a maratona nos Jogos Olímpicos de Seul e em que nasceram as primeiras gémeas-proveta em Portugal.
A La Redoute, uma marca com 180 anos de história em França e 30 em Portugal, entrou de rompante na vida dos portugueses e facilitou o acesso às últimas tendências da moda, numa altura em que não havia centros comerciais e que em que a oferta era escassa e concentrada nas grandes cidades.
A marca transformou-se e reinventou-se. Da venda por catálogo à venda online foi um passo. Falámos com Paulo Pinto, o CEO da La Redoute Portugal para conhecer a estratégia para o mercado nacional e os desafios que têm enfrentado para estarem na linha da frente no que diz respeito ao comércio eletrónico de têxtil.
Quais são os vetores estratégicos da La Redoute para o mercado português?
Continuar a apostar no comércio digital através de uma oferta comercial que ao longo dos anos foi baseada naquilo que chamados de fashion e que está a evoluir neste momento, ou seja, basicamente nos próximos anos vamos cada vez mais dar destaque à nova família de produtos: tudo o que é decoração, móveis e têxtil lar, uma área na qual estamos a investir muito.
A La Redoute sempre foi conotada como uma empresa com catálogo. Desinvestiram completamente do papel?
Desinvestimos há alguns anos, de forma radical, no papel para poder canalizar o esforço e o conhecimento para a área do digital. Agora que estamos a consolidar o digital não pomos de parte voltar a fazer ações pontuais no papel. Mas a nossa plataforma principal de comunicação passou a ser a Internet.
Quando assumiu a direção-geral da La Redoute em Portugal traçou como objetivo estratégico reorientar a empresa para o e-commerce. Conseguiu cumprir esse objetivo? Quais os maiores desafios?
Há aqui um conjunto de desafios que foram aparecendo e que, num primeiro nível, tiveram a ver com o facto de termos de fazer os nossos consumidores evoluírem para uma nova forma de consumidor e, em paralelo, fazer evoluir os nossos colaboradores para esta nova forma de trabalhar, para este novo modelo de negócio.
Procurámos evangelizar o mercado português, dotando-o de conhecimentos e limitando o receio desta nova área. Também preparámos a nossa organização interna, nomeadamente os colaboradores para fazer face à nova tecnologia.
Essa adaptação à tecnologia foi feita à medida do mercado português ou implementaram um modelo de negócio que já existia noutros países?
Não. Portugal foi inclusivamente pioneiro em alguns aspetos. Dentro da organização, o mercado português tem tido um peso significativo porque temos uma série de valências e pela maturidade das equipas.
A La Redoute é uma verdadeira escola de gestão, a todos os níveis. Nós fazemos muito trabalho in house.
A oferta portuguesa ao nível da tecnologia está preparada para as vossas necessidades?
Em termos de CRM sempre foi tudo feito in house. A La Redoute é uma verdadeira escola de gestão, a todos os níveis. Nós fazemos muito trabalho in house. O centro de desenvolvimento informático para o mundo inteiro é todo feito aqui. Basicamente, este centro de competências informáticas serve as outras La Redoute no mundo há muitos anos. Toda a contabilidade do grupo é feita em Portugal e já o fazemos mesmo antes de algumas empresas começarem a falar de nearshore.
Considera que os portugueses continuam a ter receio de fazer compras online?
Devemos sempre pensar em dois vetores: o empresarial e o vetor de consumo. No vetor de consumo, o mercado português consome muito menos em termos de digital do que os outros países, como comprovam as estatísticas. Está a crescer, mas não temos os índices de penetração dos outros mercados porque a compra aqui é vista como um ato social, enquanto noutros países é um ato mais individualista. A La Redoute iniciou a digitalização em 2008. Estamos a falar de há 10 anos.
Qual a estratégia que têm para se aproximarem dos consumidores?
Quando iniciamos a estratégia de digitalização, um dos objetivos que tínhamos era ir à procura de novos clientes porque o nosso cliente estava a ficar envelhecido. Aquilo que sucedeu foi que transformámos os nossos clientes em consumidores digitais. Ajudou o nosso nome e posição no mercado.
O que fez a La Redoute para se modernizar e para fazer frente à concorrência?
Nós temos uma particularidade: temos criação própria, apesar de trabalharmos com marcas externas. Daí que os nossos criadores estejam sempre atentos às novas tendências para corresponder às necessidades e anseios dos consumidores.
O vosso enfoque na decoração exigiu uma nova forma de organização e procedimento logístico?
Houve uma evolução. Em termos de processos, posso dizer que movimentar têxtil ou móveis é diferente. Os procedimentos alteram-se, mas não há um rompimento completo com o que se fazia. Há sim novas variáveis e temos de nos adaptar.
Qual o segredo das vendas online da La Redoute?
Estarmos próximos do consumidor e considerar, desde sempre, que ele é a pessoa mais importante da empresa independentemente do canal ser papel ou digital.
Quais as medidas que implementaram para cumprir as regras do RGPD?
O facto de sermos uma multinacional tem muitas vantagens. Criámos uma comissão interna no grupo 18 meses antes da entrada em vigor das novas regras para monitorizar tudo o que tinha de ser alterado, todos os textos para que estivessem em consonância com as novas regras. Temos um diretor técnico como a lei obriga. Como a nossa filosofia é centrada no cliente, e no processo não nos causou transtorno.
Quantos clientes têm neste momento em Portugal?
Em termos de base dados temos 800 mil clientes.
E quanto faturaram no ano passado?
Só a casa mãe pode fornecer números. Ainda por cima acabámos de ser comprados pelo grupo Galerias Lafayette. A La Redoute e as Galerias Lafayette são duas empresas francesas históricas que têm em comum o facto de terem sido comerciantes precursores e inovadores ao serviço dos seus clientes durante 180 e 120 anos, respetivamente. A associação a um investidor a longo prazo, tão prestigioso como o Grupo Galerias Lafayette, dá-nos meios para prosseguir, aumentar e acelerar a nossa estratégia.
Que sinergias vão resultar desta compra?
Muitas. Eles são muito fortes em têxtil, nós em decoração. Estamos já a trabalhar nas sinergias que procuram ser win-win.
Em termos práticos, o que podem os consumidores portugueses esperar desta aquisição a curto prazo?
Por enquanto nada. Nem os portugueses, nem os franceses. Vamos unir sinergias, que talvez sejam visíveis em 2020/2021.
Vamos procurar ter presença para além do online, muito ligada à área da decoração.
Faz parte da estratégia da La Redoute em Portugal apostar nas lojas físicas?
Em Portugal não temos lojas físicas. Digamos que vamos começar a analisar esta possibilidade, até porque temos lojas de decoração fora de Portugal. No futuro vamos poder contar com alguns conceitos inovadores, não necessariamente associados a lojas. Hoje em dia, o conceito de loja já começa a ser pouco moderno para o mundo tradicional. Vamos procurar ter presença para além do online, muito ligada à área da decoração. No têxtil não perspetivamos o offline, mas na decoração sim. Uma das variáveis possíveis é termos lojas de decoração La Redoute.
O que quer dizer com conceitos inovadores?
Andamos a estudar internamente coisas que podem vir a surpreender o mercado. Uma possibilidade é encontrar equipamentos em espaços públicos através dos quais podemos fazer a compra. Mas hoje em dia não temos nada concreto. Estamos a procurar ideias que valorizem a marca.
A La Redoute trabalha com start-ups?
Sim, quer aqui em Portugal, quer nos outros países onde estamos presentes. As start-ups são uma ajuda em termos tecnológicos.
Quanto representa em termos de faturação o mercado português para a La Redoute?
O mercado português pesa 3% na globalidade da La Redoute. A França e a Inglaterra continuam a ser os países mais representativos.
Em que mercados operam?
Estamos no mundo inteiro, mas só temos países com estruturas comerciais na Europa: Inglaterra, Rússia, Suíça, Bélgica, Espanha, Portugal. Temos parcerias na China e nos Estados Unidos.
Qual a autonomia da empresa em Portugal no que diz respeito ao desenvolvimento de iniciativas, de estratégias…? Têm de seguir a política da casa mãe?
Somos uma empresa peculiar e temos total autonomia. Há uma coleção comum a todos os mercados e depois cada país tem a sua estratégia. As equipas de marketing têm liberdade e tomam decisões.
A crise tornou o consumidor português mais astuto, mas atento.
Como define o consumidor português?
É um consumidor muito exigente que procura good will, que sabe acompanhar a evolução tecnológica. A crise tornou o consumidor português mais astuto, mas atento. E mais impulsivo hoje do que era há 10 anos. É consumista e procura oportunidades. Mas isto também se sente na Europa. O perfil do consumidor La Redoute é uma mulher com 35-45 anos, com filhos, ativa, que trabalha, que compra para toda a família, para ela, para casa e que também começa a comprar decoração La Redoute.
Quais os projetos que têm em carteira para o próximo ano em Portugal?
Uma aposta forte no mobiliário. Estamos a mudar a nossa plataforma tecnológica para a tornar mais eficiente em termos de backoffice e de ligação de sistemas.
Como perspetiva futuristicamente o ato de compra?
Não será de um dia para outro que as compras vão evoluír para um conceito mais futurista do que aquele que já conhecemos. Nos próximos anos o que vamos ver é uma consolidação completa do mobile, da televisão e uma forma de interagir com as empresas que não será pelo touch, mas pela voz. O reconhecimento do consumidor vai ser muito mais eficiente. Todavia, as coisas vão acontecer passo a passo porque o que pode vir a aparecer é um novo canal, mas não vai mudar a nossa forma de viver.