Entrevista/ “Os operadores de transportes estão a tentar encontrar o seu lugar no novo paradigma da mobilidade”

“Devido à nossa avançada tecnologia conseguimos ligar todos os intervenientes através da nossa plataforma: empresa; passageiros (colaboradores); operadores; motoristas, cada um dotado das ferramentas que necessita”, revelou Rui Stoffel, CEO e cofundador de BusUp, em entrevista ao Link To Leaders depois de anunciar o fecho de uma ronda de investimento no valor de cinco milhões de euros.
A BusUp fechou recentemente uma ronda de investimento, de série A, no valor de cinco milhões de euros, liderada pelo Proeza Ventures, o maior fundo de investimento em mobilidade da América Latina, acompanhado pelo fundo de capital de risco norte-americano, líder em mobilidade, Autotech Ventures (investidor na Lyft) e o fundo Finaves V, da mesma linha de negócio do IESE.
Segundo a empresa, que se apresenta como líder na gestão de transporte empresarial na Europa, esta injeção de capital permitirá potenciar a sua atividade em mercados recentemente abertos, como os Estados Unidos, e consolidar a sua liderança nos atuais, como Portugal.
A start-up, que foi fundada em 2016, em Barcelona, pelos sócios espanhóis Alex Canals, Rui Stoffel e Eva Romagosa e pelo brasileiro Danilo Tamelini, já se está a preparar para o pós-pandemia. Rui Stoffel garante ao Link To Leaders que “para o mercado português temos grandes perspetivas de marcarmos presença no setor fabril e industrial. Achamos que vamos ser fundamentais para as empresas que já têm serviço de transporte empresa, mas que voltarão ao escritório em formato híbrido ou flexível”.
Como surgiu a BusUp?
A BusUp surge em Barcelona a partir de um grupo de amigos e visionários (Alex Canals, Rui Stoffel e Eva Romagosa) entre os quais encontra-se um empresário do ramo automóvel, Alex Canals, que é quem identifica a necessidade de modernização do setor.
Que balanço faz destes cinco anos de atividade?
Muito positivo. Houve vários pontos altos e que marcaram o antes e o depois. O primeiro foi o apoio de 1 milhão de euros que conseguimos através de um programa europeu muito competitivo para start-ups (Horizon 2020 – SME Instrument Phase 2) que permitiu desenvolver a tecnologia. A seguir tivemos o apoio de empresas de transporte de autocarros que apostaram no nosso negócio com pequenos investimentos ou colaborando comercialmente. Outro grande momento foi termos conseguido colocar em prática e demonstrar as vantagens do transporte partilhado em Portugal e agora com a ronda de investimento Série A abriremos as portas nos Estados Unidos.
A expansão para o mercado americano será um desafio?
Depois das provas dadas nos mercados Ibérico e brasileiro, em que o modelo provou ser um sucesso, trazendo benefícios a muitos centros empresariais e empresas/ indústrias, o nosso maior desafio será a expansão no mercado americano. Temos consciência que é um mercado bastante diferente do que estamos habituados, mas este investimento possibilitará que estejamos preparados a todos os níveis para este desafio.
“Uma deslocação eficiente e flexível ao trabalho é hoje em dia um dos fatores mais importantes no momento de aceitar um novo desafio profissional e a sua falta a principal razão para procurar um novo trabalho”.
Qual é vosso modelo de negócio?
Uma deslocação eficiente e flexível ao trabalho é hoje em dia um dos fatores mais importantes no momento de aceitar um novo desafio profissional e a sua falta a principal razão para procurar um novo trabalho. Cada vez mais as empresas investem em benefícios sociais para os seus colaboradores com o único objetivo de melhorar a qualidade de vida, produtividade e aumentar a capacidade de reter o talento. Entre os vários benefícios oferecidos, estão os serviços de transporte empresa, que exigem recursos financeiros.
Dispor da informação necessária para manter uma operação otimizada, ou seja, alinhar de forma contínua a procura com a oferta e fazer uma gestão adequada do dia a dia são pilares para conseguir um serviço sustentável e atrativo para os utilizadores. Não obstante, apenas algumas empresas podem disponibilizar este tipo de serviço dado que apenas é factível quando a empresa tem mais de 500 trabalhadores. As PME não têm trabalhadores suficientes para poder disponibilizar este tipo de serviços de forma eficiente.
Em época de pandemia, as grandes empresas têm vindo a ser confrontadas com a necessidade de gerir um cenário de trabalho híbrido ou flexível. Esta nova realidade reduz de forma considerável a ocupação dos serviços de transporte empresa e acrescentam uma nova variável à gestão, a procura variável. Este novo cenário está a ter grandes implicações na adaptação não só da dimensão e da utilização do espaço de escritório, onde a partilha de secretarias e salas de reunião será o novo normal e onde os colaboradores serão solicitados a reservar antecipadamente os recursos dos seus escritórios, mas também na adaptação da oferta das rotas e serviços de deslocação da empresa às necessidades variáveis dos seus colaboradores.
Por outro lado, os operadores de transportes estão a tentar encontrar o seu lugar no novo paradigma da mobilidade, mas muitas vezes sem a tecnologia e modelos empresariais necessários capazes de fornecer aos seus clientes soluções otimizadas, flexíveis e acessíveis.
Quais são os benefícios para as empresas ao optarem pelo serviço da BusUp?
A BusUp vem resolver o problema das empresas, dos colaboradores e operadores. A BusUp é um prestador de serviços de mobilidade especializado em serviços de transporte eficiente e flexível. É a primeira empresa no mundo a oferecer serviços de transporte empresa partilhados e a tecnologia que suporta a operação.
Devido à nossa avançada tecnologia conseguimos ligar todos os intervenientes através da nossa plataforma: empresa; passageiros (colaboradores); operadores; motoristas, cada um dotado das ferramentas que necessita. Iniciamos o processo com um estudo de mobilidade para entendermos melhor as necessidades de mobilidade dos colaboradores da empresa. Depois, com os nossos algoritmos, podemos criar rotas mais eficientes e à medida das necessidades dos colaboradores da empresa.
Caso a empresa decida que quer partilhar as suas rotas, procuramos empresas vizinhas que possam ocupar lugares vazios das rotas, tornando as mesmas mais eficientes e otimizadas e fazendo com que o dono da rota possa ver os custos baixarem ao final do mês. Desta forma, com a BusUp, empresas que tenham poucos colaboradores podem usufruir de uma diversidade de rotas apenas, pagando o custo do lugar ocupado.
Outra das vantagens é a personalização de uma plataforma de reserva de lugares para os utilizadores e acesso a plataforma de gestão para empresa. E ainda temos um serviço chave na mão em que as empresas não precisam preocupar-se com a contratação do operador, nem gestão do mesmo, além da gestão de todas as incidências seja com motoristas ou passageiros. Os relatórios de produtividade e outros registos para que a empresa esteja sempre a par do que é a sua operação.
Quanto pode poupar uma empresa ao recorrer aos vossos serviços?
Já tivemos clientes com poupanças que chegaram a 40% ao optarem pela partilha das suas rotas.
“Temos cerca de 80 rotas em Portugal e umas 380 a nível mundial, estando algumas delas em standby devido à pandemia”.
Quantas rotas têm atualmente?
Temos cerca de 80 rotas em Portugal e umas 380 a nível mundial, estando algumas delas em standby devido à pandemia.
E clientes?
Temos mais de 100 clientes corporativos em todo o mundo, a maioria empresas ou centros empresariais/industriais, mas também escolas, universidades, hospitais e alguns eventos também.
Como entraram no mercado português?
Entramos no mercado português na sequência do projeto europeu que nos possibilitou demonstrar que a solução podia ser escalável e aplicada a nível mundial. Fizemos a prova piloto com grande sucesso no Lagoas Park, que serviu de exemplo para outros centros empresariais onde também estamos (Taguspark, Quinta da Fonte etc) e muitas empresas que já trabalham connosco ( Nestlé, Siemens, Accenture, Auchan, Cognizant, etc.) e que beneficiam de um transporte mais flexível, económico e sustentável que garante a segurança dos seus colaboradores.
O que mais difere o mercado espanhol do português na gestão do transporte empresarial?
As primeiras operações/rotas começaram nos dois países quase em simultâneo, mas o mercado português foi, sem dúvida, mais aberto e inovador. O principal motivo do sucesso da BusUp em Portugal é precisamente o facto de a nossa plataforma permitir uma gestão eficiente das rotas partilhadas. Em Portugal os nossos clientes estão localizados em centros empresariais ou zonas onde se concentram empresas.
Os centros empresariais foram a nossa primeira grande aposta e a recetividade foi excelente. O que mais valorizam é a capacidade da nossa tecnologia de gerir uma rede de rotas partilhadas pelas empresas do parque e a contratação multioperador combinada com um serviço de gestão diária das operações que permite externalizar parcial/totalmente a gestão do serviço. O grande pioneiro foi o Lagoas Park, que abraçou o projeto como sendo seu desde o princípio. As empresas aderiram e uma grande rede de transportes servia diariamente centenas de trabalhadores antes do Covid.
A Quinta da Fonte foi também um parque em que fomos muitíssimo bem-recebidos, abrangidos por uma onda de grandes melhorias e implementações em prol das empresas, chegámos a fazer um piloto para que as empresas pudessem experimentar. Hoje temos um grande cliente com rotas em funcionamento e que possibilitam às empresas da Quinta da Fonte que queiram beneficiar os seus colaboradores com a compra de lugares, sem terem que criar rotas novas.
Quanto faturaram no ano passado?
No ano passado, em plena pandemia, conseguimos crescer 50% na faturação entre os três mercados nos quais estamos presentes, estando praticamente parados há seis meses.
“Em 2019 Portugal esteve na linha da frente com a maior faturação. No entanto, como a maior parte dos nossos clientes a nível nacional são de serviços e tecnológicos, com o aparecimento da pandemia muitos estão em teletrabalho”.
Qual é neste momento o mercado mais representativo em termos de faturação para a BusUp?
Em 2019 Portugal esteve na linha da frente com a maior faturação. No entanto, como a maior parte dos nossos clientes a nível nacional são de serviços e tecnológicos, com o aparecimento da pandemia muitos estão em teletrabalho. O Brasil, por outro lado, como tem maioritariamente clientes no setor industrial foi quem conseguiu estar à frente desde que a pandemia apareceu.
O que tem contribuído para o sucesso do transporte de partilha de rotas da BusUp?
As empresas compreenderam a enorme mais valia ao partilharem o transporte empresa. Em primeiro lugar a poupança: com os nossos algoritmos de otimização de rotas podemos oferecer melhores rotas e grandes economias para os nossos clientes e utilizadores. Em especial no contexto em que vivemos, a economia na gestão das rotas torna-se fundamental, e temos casos de grandes sucessos onde conseguimos grandes economias para os nossos clientes. A empresa que possui a rota ocupa os lugares vazios com colaboradores de empresas vizinhas que tenham necessidades de mobilidade semelhantes, todos ganham.
Por outro lado, as empresas que não teriam hipótese de ter rotas próprias, ao adquirirem lugares em rotas de outras empresas possibilitam aos seus colaboradores terem acesso a uma rede de transportes e diversidade de origens. Outro fator é a segurança: no contexto em que vivemos, limitamos as reservas à quantidade permitida, assegurando que o operador e a empresa cumpram com as normas, e o passageiro vá em segurança no autocarro.
Sem falar das regras básicas de obrigatoriedade da máscara e do álcool em gel na entrada do transporte. Se um infetado utilizar as rotas, conseguimos identificar em menos de uma hora quais as rotas utilizadas pelo passageiro e a listagem de passageiros que utilizaram a mesma rota e respetivos condutores. Essa rastreabilidade possibilita que as empresas e o operador possam tomar medidas imediatas.
Também a flexibilidade é uma vantagem que a plataforma possibilita, podendo ter passes mensais, semanais, diários e até de cinco dias, por exemplo. A troca de rota e cancelamento são também vantagens, tornando-se num transporte que se adapta aos imprevistos dos passageiros sem quaisquer custos adicionais.
A opção de escolha para total ou parcial financiamento do transporte dos colaboradores é outra flexibilidade, além da divisão dos colaboradores por centros de custos. E por fim a transparência: As empresas têm uma plataforma personalizada online, além do acesso à plataforma empresa para acompanhamento, controlo, reporting e faturação simplificada.
As empresas portuguesas já começaram a ver a mobilidade corporativa como um investimento e não como uma despesa?
Nestes últimos anos pudemos ver que as empresas começam a estar nas mãos de profissionais que se preocupam mais com temas como as emissões de CO2 poupadas pela empresa. A sustentabilidade faz hoje parte da maior parte das empresas. Muitas empresas aderiram e vem aderindo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.
Também a captação e retenção dos talentos, em especial quando os escritórios estão mais afastados dos grandes centros e com pouco acesso aos transportes. Temas como estes levam a que o transporte empresa seja um dos benefícios pensado pelas empresas. Os diretores de RH entendem que colaboradores que não têm o stress do trânsito conseguem produzir melhor. Também já é bastante claro que o fácil acesso ao transporte, ou seja, o como chegar à empresa é uma das primeiras razões para escolha ou não de certos trabalhos. Um bom exemplo de que as empresas portuguesas já veem a mobilidade como uma das suas prioridades é a quantidade de empresas que aderiu ao Pacto de Mobilidade empresarial para a Cidade de Lisboa.
“Para o mercado português temos grandes perspetivas de marcarmos presença no setor fabril e industrial. Achamos que vamos ser fundamentais para as empresas que já têm serviço de transporte empresa, mas que voltarão ao escritório em formato híbrido ou flexível”.
Quais os objetivos da BusUp para este ano para o mercado português?
Para o mercado português temos grandes perspetivas de marcarmos presença no setor fabril e industrial. Achamos que vamos ser fundamentais para as empresas que já têm serviço de transporte empresa, mas que voltarão ao escritório em formato híbrido ou flexível.
Como perspetivas as tendências de mobilidade no regresso ao trabalho no pós-pandemia?
As principais tendências indicam que a grande maioria dos colaboradores prefere um cenário de trabalho híbrido ou flexível, onde possa trabalhar a partir de casa durante alguns dias/horas da semana. Este novo cenário terá grandes implicações na adaptação não só da dimensão e da utilização do espaço de escritório, mas também na adaptação da oferta das rotas e serviços de deslocação da empresa às necessidades dos seus colaboradores.
As empresas que já têm serviço de transporte empresa mas que voltarem ao escritório em formato híbrido ou flexível vão precisar de um sistema de gestão inteligente que adapte a oferta à procura, caso não queiram autocarros com a metade dos lugares vazios ou deixarem colaboradores na rua, por falta de capacidade dos autocarros.