Opinião
“Os engenheiros nacionais continuam a ser muito valorizados internacionalmente”
O projeto português que ajudou a recuperar a destruição do “El Ninõ” no Peru, aliando inovação à engenharia de pontes, valeu à BERD um contrato de 17 milhões e agora o prémio European Steel Bridge Awards. Em entrevista ao Link To Leaders, Pedro Pacheco, CEO da empresa, fala sobre este reconhecimento e dos projetos que tem desenvolvido nos cinco continentes, e revela que “o maior investimento de sempre está agora em curso e deverá fazer emergir a maior área de negócio da BERD no próximo triénio”.
São 145 pontes, têm um sistema modular inovador criado pela engenharia portuguesa e ajudam a ligar margens no Perú, onde ruíram mais de 70 pontes em 2017, na sequência do fenómeno climatérico “El Niño”. Valeram à BERD – Bridge Engineering Research & Design um contrato de 17 milhões de euros e, agora, um prémio internacional de uma das mais importantes instituições na área das estruturas e engenharia de pontes, a ECCS European Steel Bridge Awards 2022.
“O projeto do Peru assegurou ao Ministério dos Transportes e Comunicações Peruano uma redução de custos na ordem dos três milhões de euros, e garantiu uma redução de emissão de CO2 superior a 3000 Ton, quando comparado com a média dos fornecedores internacionais mais relevantes”, explicou Pedro Pacheco, CEO da BERD, ao Link To Leaders, mostrando-se otimista com o crescimento da empresa.
Desde a sua génese, em 2006, a BERD mantém um crescimento consistente da faturação média anual. No triénio 2018-2020 atingiu uma faturação média anual de cerca de 10 milhões de euros. No presente triénio a BERD está a crescer cerca de 15% e existem bons indícios que vai ultrapassar esta fasquia, segundo adianta o responsável.
A BERD venceu o prémio especial European Steel Bridge Awards, em Istambul, com o projeto de pontes modulares no Peru. O que contribuiu para este reconhecimento?
A inovação foi, sem dúvida, o que mais contribuiu para este reconhecimento, pois, graças à aposta em I&D, conseguimos aportar valor ao conceito base de ponte modular criado por Donald Bailey na Segunda Guerra Mundial. Basta pensarmos que, durante várias décadas, este conceito foi mantido e utilizado com pequenas alterações por todos os construtores internacionais na área das pontes modulares.
Ao criar a unidade de pontes modulares da BERD, questionamos este conceito e apresentámos ao mercado uma solução com grande evolução ao nível da engenharia, incluindo a otimização da estrutura, com relevantes impactos na redução da pegada carbónica e do valor económico e, não menos importante, no aperfeiçoamento estético. O projeto do Peru assegurou ao Ministério dos Transportes e Comunicações Peruano uma redução de custos na ordem dos três milhões de euros e garantiu uma redução de emissão de CO2 superior a 3000 Ton, quando comparado com a média dos fornecedores internacionais mais relevantes.
O nosso projeto foi valorizado pela inovação, sustentabilidade e estética, por uma instituição de máximo prestígio mundial na área de pontes metálicas em aço, que consagrou o prémio especial European Steel Bridge Awards, às pontes modulares da BERD no Peru.
Esta é a prova de que a engenharia de pontes portuguesa tem condições para ocupar um lugar de liderança no mapa internacional da engenharia civil?
Sem dúvida, tanto a engenharia portuguesa como os engenheiros nacionais continuam a ser muito valorizados internacionalmente. A engenharia civil portuguesa possui uma reconhecida capacidade técnica, contando na base com uma elevada qualidade de formação. Os engenheiros portugueses apresentam uma forte responsabilidade e disponibilidade individual, que procuram colocar em todos os trabalhos que desenvolvem, surpreendendo pela criatividade, capacidade de adaptação e capacidade de interação em diferentes contactos e culturas. Essas qualidades, intrínsecas nesta comunidade quando aliadas às melhores práticas de planeamento com elevado sentido coletivo, trazem resultados notáveis.
Todas estas capacidades estão definitivamente patentes na nossa equipa de elite e colocadas em todos os projetos que desenvolvemos e beneficiam das referidas virtudes “portuguesas”. Temos conseguido cativar os nossos clientes e a BERD conseguiu tornar-se numa marca premium de engenharia de pontes e a equipa, por agora, é 90% portuguesa, apenas com cerca de 10% de colaboradores não nacionais.
“A maior dificuldade na área das pontes modulares tem sido a sensibilização e envangelização das entidades públicas para desenvolverem projetos que protejam as populações”.
O que distingue o projeto de pontes modulares no Perú dos outros e quais foram os maiores desafios que encontraram?
O que mais distingue foi a evolução do conceito das pontes, quer em termos de otimização estrutural, quer em termos de estética. A durabilidade das pontes modulares também evoluiu, podendo ser utilizadas não só de forma provisória, mas com uma duração de 20 a 50 anos. A BERD investiu na área de negócio das pontes modulares, criando uma spin-in, que foi alvo de investimento de 2015 a 2018, mas a atividade efetiva no mercado foi iniciada no final de 2018, com a conquista do concurso internacional lançado pelo Ministério dos Transportes e Comunicações Peruano para o fornecimento de pontes modulares, com vãos entre os 15 a 60 metros, no valor de cerca de 17 milhões de dólares.
Avançou em 2019 com a exportação de 125 pontes modulares para o Peru, e com mais 20 posteriormente. Graças a este projeto, e a outros que, entretanto, fechamos, foi possível atingir resultados nesta área de negócio com um impacto de mais de 50% da faturação da empresa desde então.
A maior dificuldade na área das pontes modulares tem sido a sensibilização e envangelização das entidades públicas para desenvolverem projetos que protejam as populações. A BERD considera que muitos concursos públicos estão contaminados com exigências técnicas que faziam sentido no século XX, mas que agora já não fazem, pelo contrário só aumentam o preço e a pegada carbónica das soluções. O desafio da missão da BERD tem sido a disseminação da informação técnica e científica que evidencia a necessidade da melhoria dos cadernos de encargos do século XXI.
No entanto, o balanço tem sido extremamente positivo, dado que o projeto do Peru potenciou novas oportunidades em novos mercados neste novo segmento. As pontes modulares da BERD já foram entregues também em Moçambique e no Canadá, no qual a empresa venceu dois concursos. No total já foram entregues cerca de 200 pontes modulares. A par, estão abertos projetos em diversos países, designadamente na Europa, África, e América do Norte e América do Sul. No que diz respeito ao propósito da sua utilização, tendencialmente os países mais desenvolvidos investem na sua aquisição antes das catástrofes, prevenindo situações que podem vir a ocorrer, enquanto os países em vias de desenvolvimento, habitualmente, procuram as pontes modulares após a ocorrência de catástrofes.
O que mais pesou na decisão de mudar o conceito tradicional da engenharia de pontes para um conceito novo e mais sustentável?
Para a BERD, a inovação só o é se se traduzir em valor substantivo para os seus clientes e aumentos dos resultados EBITDA da empresa. A BERD questionou se o paradigma e o pressuposto se deveriam manter, nomeadamente, e como mero exemplo indicativo, o condicionamento “do peso de 300 kg das peças”, assim criado de modo a poderem ser transportadas por quatro militares. Tendo em conta que existem equipamentos que podem transportar peças muito maiores e mais pesadas, a BERD colocou este pressuposto em causa.
Questionou também, como exemplo, um outro aspeto mais técnico, as pontes Bailey eram desenvolvidas como uma modelação transversal (painéis iguais em paralelo). Testámos e tivemos sucesso na concretização da implementação de uma modelação longitudinal de peças diferentes ao longo da ponte, mas iguais na mesma posição relativa, permitindo a redução do peso das pontes, com forte Impacto na pegada carbónica.
No fornecimento do Peru há dois resultados que são muito apreciados, uma evolução estética grande, assim como uma evolução ao nível do conceito de engenharia muito mais sustentável, com redução média do peso das pontes e da pegada carbónica de 20%, no consumo de aço face aos projetos convencionais, com uma redução da pegada de carbono, tendo sido emitidas menos 3.240 toneladas de CO2 comparativamente à média dos projetos tradicionais.
“Nos últimos 10 anos a BERD teve um crescimento de cerca de 500%. E, temos fortes indícios de que vamos ultrapassar este valor nos próximos 10 anos”.
Que balanço faz destes 16 anos da BERD? O que mais mudou?
A BERD é uma empresa com atividade essencialmente internacional especializada em engenharia de pontes. Nestes 16 anos conseguiu afirmar-se, incontestavelmente, como uma marca premium a nível mundial, sendo líder a nível da Europa no segmento de cimbres autolançáveis (e assegurando a sua posição neste segmento no TOP 2 mundial).
O balanço é claramente positivo, pois desde a sua génese tem mantido um crescimento consistente e expressivo ao nível da faturação média anual. No triénio 2018-2020 a empresa atingiu uma faturação média anual de cerca de 10 milhões de euros e, no presente triénio, está a crescer cerca de 15%, mas existem bons indícios que irá ultrapassar esta fasquia. Nos últimos 10 anos a BERD teve um crescimento de cerca de 500%. E, temos fortes indícios de que vamos ultrapassar este valor nos próximos 10 anos.
Ao nível das mudanças do setor, torna-se necessário explicar que a área de engenharia de pontes absorve as inovações de forma lenta, podendo, de certo modo, ser comparada à igreja. A título de exemplo, pode ser referido que a patente de 2004, que deu origem à BERD, apesar de já ser usada na Alemanha repetidas vezes há vários anos, este ano foi objeto de uma apresentação especifica desta tecnologia na Alemanha, por um prestigiado engenheiro de pontes e influencer nesta área, referindo os enormes méritos da tecnologia e tratando-a como se fosse uma novidade absoluta, quando a patente foi registada há 18 anos.
Há três anos em entrevista ao Link To Leaders disse que “temos como objetivo fechar o primeiro contrato nos Estados Unidos em 2019”. E agora, quais são os principais objetivos da empresa?
A entrada no mercado USA é já um objetivo conseguido, aliás, a BERD tem projetos em cinco continentes. Neste momento os territórios mais relevantes são Europa, América do Norte, América do Sul e África. A Europa é atualmente o principal mercado, seguido pelos EUA, Canadá e a América do Sul, num segundo nível, e, finalmente, por África, sendo que na Ásia, tendo a BERD já alguns projetos realizados, não se prevê que seja um mercado especialmente quente a curto prazo.
Dito isto, podem surgir boas surpresas, por exemplo, em Africa. Nos EUA têm surgido oportunidades na área dos equipamentos, sendo que os clientes satisfeitos são uma importante montra da empresa. O acompanhamento do sucesso da atividade da BERD que habitualmente gera uma publicidade autêntica. Neste momento, estamos a capitalizar o primeiro contrato, procurando refletir o investimento dos últimos anos num crescimento nos próximos anos no importante mercado que são os EUA.
Que projetos têm atualmente em mãos?
Estamos a desenvolver projetos no Reino Unido, na Alemanha, nos EUA, na Eslováquia, nos Países Baixos, no Canadá e em Moçambique, envolvendo também clientes franceses em algumas obras como, por exemplo, uma que terminou recentemente no Egipto. Neste momento, não sendo comum, também temos um projeto em Portugal.
Quanto investe, em média, a BERD em investigação e desenvolvimento?
Neste momento, cerca de 22% a 25% dos recursos da BERD são investidos em I&D e este valor deverá aumentar em 2023. A inovação é utilizada para responder às necessidades dos clientes da BERD e para criar novas soluções, apropriando mais valor e potenciando resultados, acrescentando produtos e áreas de negócio, criando produtos e originando novas patentes (foram, entretanto, desenvolvidas mais quatro patentes).
Com que volumes de negócio e faturação encerraram 2021? Quanto preveem faturar este ano?
Em 2021, a BERD faturou 11 milhões de euros e em 2022 prevê uma faturação entre 12 e 13 milhões. As perspetivas da empresa para 2023 são muito positivas, prevendo um crescimento de 20% ou mais, dado que já temos vários contratos em pipeline, fechados e planeados para serem realizados no próximo ano.
“Em termos de faturação do atual triénio os mercados com maior relevância são o Reino Unido, a Alemanha, a França, Moçambique e os EUA (…)”.
Quais os países com maior peso na faturação da BERD?
Em termos de faturação do atual triénio os mercados com maior relevância são o Reino Unido, a Alemanha, a França, Moçambique e os EUA, seguidos dos Países Baixos, da Eslováquia, do Peru, do e o Egipto. Mas rapidamente serão adicionados outros países.
Projetos para o futuro da BERD? Novas áreas de negócio?
A BERD está a reforçar a aposta nas atuais três áreas de negócio, nomeadamente a área de equipamentos, venda e aluguer de alta tecnologia para a construção de pontes, seguida pela consultoria e projeto de pontes, e a mais recente área de pontes modulares – para fins emergentes ou para fins mais perenes. Mas o maior investimento de sempre está agora em curso e deverá fazer emergir a maior área de negócio da BERD no próximo triénio. Sobre isso, falaremos depois, com factos, como é apanágio da BERD.
Respostas rápidas:
O maior risco: a perturbação da cadeia global de supply chain (mesmo já tendo algum conhecimento para mitigar os danos).
O maior erro: deixar de inovar e subestimar o financiamento de projetos.
A maior lição: a Inovação só o é se trouxer valor substantivo aos clientes e resultados à empresa:
A maior conquista: a BERD tem três conquistas maiores ex-aequo, a primeira patente que deu origem à BERD, o recorde mundial de engenharia de pontes conseguido na Turquia, e a forte penetração na área de pontes modulares – mas acredito que a maior conquista – “is yet to come”.