Opinião

O “Sr. Jerónimo”: a história de um pingo doce e de uma joaninha dourada

Pedro Celeste, diretor-geral da PC&A

A partida de Alexandre Soares dos Santos merece um tributo à sua memória e a tudo aquilo que foi capaz de construir, desde que, em 1996, tomou conta dos destinos da Jerónimo Martins, que havia nascido no Chiado em 1792.

Tenho o grato orgulho e satisfação de conhecer de perto muito do excelente trabalho criado pelo Grupo Jerónimo Martins, na condição do coordenador de um dos programas avançados de gestão para os seus executivos. A quantidade de profissionais de excelência, dos mais variados níveis hierárquicos da empresa, que tive a sorte de conhecer ao longo dos anos, obriga-me a esta singela homenagem, tão sofrida como sentida.

Para quem esteve atento à magnifica entrevista de Sérgio Figueiredo a Alexandre Soares dos Santos em fevereiro deste ano (agora replicada), percebe a dimensão da obra que criou, desenvolveu, liderou e da qual passou testemunho em 2013, garantindo a preservação da cultura empresarial que sempre o orientou.

É uma história de (muitos) altos e (alguns) baixos, própria de quem é persistente, perseverante e aprende com os erros. Se os baixos se podem resumir à experiência no Brasil, à tardia valorização do cartão de fidelização como ferramenta estratégica de negócio, a um período de particular desfoque do seu posicionamento e ações pontuais de promoção irrepetíveis, a verdade é que todos esses momentos foram importantes para aprender, voltar a inovar e crescer com valor.

Hoje, o Grupo Jerónimo Martins emprega mais de 100.000 colaboradores, está presente em 3 geografias, onde opera com 4.100 lojas, tem um volume de negócios que atinge 17,5 mil milhões de euros e regista resultados líquidos superiores a 400 milhões de euros. Segundo a Delloite, o maior empregador nacional privado é o Pingo Doce, com 25.209 colaboradores.

Uma perspetiva inovadora de internacionalização levou o Grupo à Polónia, onde hoje detém a maior cadeia de supermercados do país, Biedronka (joaninha em polaco) com 2.900 lojas e 58% da quota de mercado, a que acrescem as 230 farmácias Hebe. Na verdade, esta joaninha dourada representa quase 70% do volume de negócios de todo o grupo. Mais tarde, em 2013, chega à Colômbia com a cadeia de lojas de proximidade Ara, onde já detêm 532 pontos de venda e regista vendas de 600 milhões de euros.

É neste contexto que o Grupo Jerónimo Martins alcançou o 55.º lugar no ranking mundial de retalhistas, subindo 60 posições nos últimos 10 anos. Porque a cultura empresarial permaneceu coerente e consistente, perdurando até aos dias de hoje. Foi precisamente esta cultura que permitiu que Alexandre Soares dos Santos nunca se tivesse referido a Belmiro de Azevedo como concorrente, mas sim como “um grande empresário, homem de visão, ação e corajoso”.

O foco em querer sempre fazer melhor, a vontade permanente de aprender a todos os níveis de gestão, de dar liberdade interna à criatividade para a implementação de ações que criam valor para o cliente e empresa, mesmo que disruptivas, são alguns dos eixos marcantes da sua liderança.

É na sequência deste figurino que, em 2009, surge a Fundação Francisco Manuel dos Santos que tem como objetivo a promoção do debate de questões estruturantes para a economia e sociedade. E é nesse quadro que se projeta a Fundação para a Educação, num formato que tem a ambição de ser transformacional na maneira como se alimentam as competências pessoais, assentes na qualificação das pessoas.

Sam Walton, o fundador da WalMart, a maior cadeia de retalho alimentar do mundo, deixou-nos uma frase muito célebre: “Só há um Chefe. O Cliente. É o único que pode despedir toda a gente numa empresa, desde o presidente ao rececionista, ao optar por consumir num concorrente”.

É precisamente nesse registo que retenho uma das frases marcantes da entrevista do “Sr. Jerónimo” como, por muitos, era carinhosamente apelidado: “nós somos o que os consumidores exigirem de nós”, demonstrativo da importância em estar sempre do lado de quem decide. Mais uma vez, estava certo!

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Pedro Celeste

Pedro Celeste

Doutorado em Gestão pela Universidade Complutense de Madrid. Diplomado pelo INSEAD, London Business School, Wharton School, University of Virginia, MIT Management Sloan Management School, Harvard Business School, Imperial College of London, Kellogg School of Management de Chicago e IESE Business School. Na Católica Lisbon School of Business & Economics é Diretor Académico dos Executive Master in Management e coordenador do Programa Avançado de Marketing para Executivos, do Programa de Gestão Comercial e Vendas, do Programa de Gestão em Marketing Digital... Ler Mais..

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