Entrevista/ “No futuro, o profissional de recursos humanos vai gerir robôs e pessoas”
O diretor de recursos humanos do Grupo Tap Air Portugal define-se como um gestor de pessoas “todo o terreno” e muito “mão na massa”. Pedro Ramos defende a importância das pessoas nas empresas e lembra que “pessoas e negócios são duas faces da mesma moeda”. Ao Link To Leaders falou ainda do facto de, no futuro, o profissional de RH ter de gerir pessoas e robôs.
A importância das pessoas no seio das organizações é um tema central na carreira de Pedro Ramos, profissional que atualmente lidera os recursos humanos do Grupo Tap Air Portugal. Em entrevista ao Link To Leaders, além de abordar a estratégia da Tap no domínio dos recursos humanos e de recrutamento, fala também dos desafios que este setor – cada vez mais de gestão de pessoas e menos de recursos humanos – atravessa. Pedro Ramos vai ser um dos oradores convidados do Congresso RH que este ano também se realiza em Lisboa, no dia 5 de março.
Qual a estratégia do Grupo TAP AIr Portugal para a contratação e retenção de talentos?
A TAP é, cada vez mais, uma empresa global pelo que a sua visão e dimensão de “mercado de trabalho” não se esgota dentro das fronteiras de Portugal. Contudo, são cada vez mais os portugueses qualificados que se têm juntado à grande “família TAP” neste processo de profundo crescimento.
Hoje a TAP (e tem sido já nestes dois últimos) é a companhia que mais tem criado postos de trabalho qualificados nas suas diferentes áreas de intervenção e estamos muito satisfeitos com a qualidade dos recursos humanos que temos recrutado no mercado nacional também.
Um outro fenómeno que estamos a vivenciar com muito entusiasmo é a atração e a contratação de portugueses que, entretanto, estavam em outros mercados de trabalho internacionais (pilotos, comissários de bordo, técnicos de manutenção aeronaves, entre outros) e que, com a TAP têm agora a oportunidade de regressar em “grande” ao mercado de trabalho português. Mas, como referi para além de atrairmos talento nacional, também atraímos talento internacional.
Assim, a TAP tem estado a contratar muito nestes dois últimos anos e vamos continuar a fazê-lo em 2020. Temos prevista a contratação de várias centenas de pessoas nas mais diversas áreas, sobretudo nas nossas áreas de operações de voo e manutenção. Estamos presentes em feiras de emprego nacionais e internacionais e estamos muito atentos aos fenómenos e processos de atração de talento internacionais.
Que apostas fazem em termos de posicionar a empresa como employer brand?
No que à retenção de talento e ao employer branding diz respeito, somos claramente uma empresa TOP … E estamos a trabalhar com imensa acuidade em cada vez mais proporcionar uma ótima “experiência de colaborador”. Obviamente, estamos muito atentos ao que de melhor se faz no mundo, sobretudo em termos das companhias aéreas e recentemente reformulámos todas as nossas carreiras profissionais e aumentamos o conjunto de benefícios que disponibilizamos aos bens mais preciosos da nossa companhia – as nossas pessoas! Por isso temos sido reconhecidos nos últimos anos com prémios: Melhor empresa onde se gostaria de trabalhar! Primeiros lugares na empresa com Melhor Employer Branding, etc.
Quantas pessoas foram contratadas pela companhia no último ano? Quais são as vagas mais preenchidas?
São números impressionantes! No ano passado, fizemos 1335 admissões nas mais diversas áreas… Mas com forte predominância nas admissões para funções operacionais: pilotos, assistentes e comissários de bordo, técnicos de manutenção de aeronaves, entre outros. Mas, no ano anterior já havíamos contratado 1612 novos trabalhadores. Quando digo que somos o maior empregador em Portugal, é mesmo verdade! Os números falam por nós…
Já agora, todos estes processos de assessment, seleção e contratação são feitos pela direção de Recursos Humanos (internamente) e ainda estamos vivos. A TAP é uma grande companhia, mesmo!
Como define o perfil dos trabalhadores da companhia aérea?
São perfis de elevadíssima qualificação! Privilegiamos pessoas com fortes qualificações escolares e académicas (conforme os casos), mas sobretudo com um “package” em termos de soft skills bem estruturado.
Avaliamos os “projetos pessoais” de cada um dos nossos candidatos, queremos muito saber quais os propósitos individuais de cada um dos candidatos e fazemos o match (sempre) entre os perfis pessoais com os nossos diversos contextos organizacionais dado que somos um grande grupo.
O nosso objetivo é sempre articular cada uma das nossas pessoas com o nosso propósito comum e com os nossos contextos de negócio. Por isso, explicamos bem o nosso negócio e propósito a cada um dos novos colaboradores do Grupo TAP.
“A nossa preocupação hoje não é contar horas de formação, é claramente consolidar a passagem de uma “cultura de training” para uma “cultura de learning” (…)”.
Quanto investiu a TAP na formação de pessoas no último ano?
A TAP Investiu muito nos seus processos de formação! Os números são sempre muito grandes… Mas prefiro dizer que cada uma das nossas pessoas tem um package de formação técnica e comportamental que vai muito além do que está previsto na Lei…
Criámos um conceito de “Universidade TAP” que alargou bem mais (ainda) o que a formação da TAP vinha a fornecer nos últimos 75 anos de existência da companhia. A nossa preocupação hoje não é contar horas de formação, é claramente consolidar a passagem de uma “cultura de training” para uma “cultura de learning” dentro da nossa companhia. Isto está quase conseguido!
O que tem mudado no âmbito da gestão de recursos humanos na TAP?
Temos hoje claramente um visão muito para além de “Recursos Humanos”… Estamos muito apostados em criar uma boa experiência do colaborador. Na TAP vivemos hoje um momento único no que toca à gestão de pessoas… Estamos a viver um momento de enorme crescimento exponencial e, ao mesmo tempo, um tempo de profunda mudança e transformação cultural. Estes dois processos vividos intensamente, em simultâneo, não sendo fácil, é uma excelente oportunidade de inovar em matéria de gestão de pessoas no que respeita aos processos, aos programas, às politicas, mas, sobretudo, em termos de práticas efetivas e com elevado impacto em toda a nossa organização.
Colocámos a pessoa (colaborador) no centro do processos de aprendizagem e definimos um propósito e valores que trabalhamos todos dias para alcançarmos o “desígnio comum” de em terra e no ar proporcionarmos uma experiência acima das nuvens!
Gostamos de pessoas, das nossas pessoas, e ouvimos as suas sugestões e ideias sobre como todos juntos podemos continuar a crescer e a transformarmos com o objetivo de, todos juntos, e cada vez mais, fazermos a diferença no mercado internacional como companhia aérea de referencia mundial.
Qual a estratégia da TAP ao nível da comunicação interna?
A comunicação interna tem basicamente um objetivo claro… Estar próximo e promover a proximidade entre as áreas e as nossas pessoas… O resto são processos e meios… Uma TV corporativa, um portal de colaborador cada vez mais poderoso e abrangente… Eventos internos de reconhecimento que façam sentido e que promovam a meritocracia… Mas, claramente o objetivo é continuar a apaixonar, encantar, surpreender as nossas pessoas…. E ouvir, ouvir muito… antes de falar!! A lógica dos dois ouvidos para apenas uma boca em ação…
Passou pela Groundforce onde foi diretor de recursos humanos e administrador executivo, pela CARRIS, pela OGMA, pela Imprensa Nacional-Casa da Moeda, entre outras empresas. Em todas estas empresa esteve envolvido no processo de gestão da mudança e transformação. De que forma a sua experiência profissional nestas empresas contribuiu para a pessoa que é hoje e para a sua visão nos recursos humanos?
É verdade, eu tenho ao longo da vida participado em vários processos de mudança e transformação! Obviamente, sendo eu um gestor de pessoas “todo o terreno” e muito “mão na massa” tenho tido a oportunidade de me ir formando e transformando num gestor de mudança cada vez mais empreendedor. Por isso, acho que tenho adquirido a minha qualificação no terreno e, necessariamente, o que sou hoje, e faço hoje, é o produto de anos de aprendizagem continua e continuada em terrenos de profunda turbulência organizacional. E isso necessariamente habilita-me para poder enfrentar novos e renovados desafios…
“(…) não faz mais sentido falar em recursos humanos, e sim em gestão de pessoas, porque as pessoas é que fazem a diferença. Em um futuro próximo, talvez falemos em pessoas e robôs, além de equipas mistas”.
Considera que para as empresas as pessoas são o bem mais precioso?
Liderar pessoas é, definitivamente, uma paixão. Mas a esta carga emocional cada vez mais é importante associar uma forte componente racional. Um bom gestor de pessoas é alguém que consegue, em simultâneo, desafiar, desinstalar, mobilizar, obter sinergias, mas também valorizar, reconhecer e confiar… naqueles que são o bem mais precioso das empresas – as pessoas – por forma a que se consigam atingir resultados.
Gosto de pessoas, de trabalhar com pessoas, mas nunca perco de vista o foco nos objetivos e nos resultados. Sou por natureza “muito irrequieto”, comunicativo, talvez até excessivamente interativo! Gosto de arregaçar as mangas e ir ao “terreno” falar com as pessoas e viver os seus momentos mais significativos. Assim, procuro estar próximo (presencialmente ou de forma digital), por forma a potenciar um maior link entre as nossas pessoas e as nossas organizações internas, na procura das melhores soluções para podermos prestar todos – cada um à sua medida e no seu contexto específico – um serviço de excelência aos nossos clientes. Leio muito, faço muito networking, partilho muitas histórias de sucesso e insucesso e isso contribui muito para a minha auto-motivação.
Já agora… a importância dos colaboradores é essencial para as organizações, não existem empresas sem pessoas, portanto, as pessoas são essenciais no sucesso das empresas. Tem uma máxima que eu potencializo muito que é o “people and business”. Sou um profissional de RH que gosta de pessoas. Acho que é impossível trabalhar com RH sem gostar de pessoas, mas eu não sou RH só por isso. Sou porque as pessoas são essenciais para atingir resultados.
A importância que o colaborador tem é muito grande, devido ao fato de ser o primeiro embaixador da sua organização, por isso fala-se tanto em “employer branding”, por exemplo. É de extrema importância manter esses colaboradores vinculados ao negócio. No passado, as pessoas estavam nos negócios e eram recursos, eu não gosto muito da expressão “Recursos Humanos”. Hoje, o foco é o colaborador e a sua experiência, não faz mais sentido falar em recursos humanos, e sim em gestão de pessoas, porque as pessoas é que fazem a diferença. Em um futuro próximo, talvez falemos em pessoas e robôs, além de equipas mistas.
Quais os desafios que se colocam à gestão de pessoas nos dias de hoje?
Vai ser necessário gerar cada vez mais equipas mistas de pessoas e robôs, e este é um grande desafio. Vamos ter que começar a trabalhar a digitalização e os processos tecnológicos, não apenas como uma extensão das competências humanas, mas como elementos que fazem parte de suas equipas.
No futuro, o profissional de recursos humanos vai gerir robôs e pessoas, e estas terão cada vez menos tempo para trabalhar, porque não estarão mais disponíveis 24h por dia. Os profissionais vão ter que gerir uma pluralidade de profissionais, vai ser de fato uma gestão da diversidade. A diversidade cognitiva é a capacidade de integrar pessoas diferentes que pensam de forma diferente, isso é bom para a organização. Ou seja, ninguém mais quer pessoas que pensam da mesma maneira.
No passado, nós gostávamos de formar pessoas que dissessem o mesmo e pensassem o mesmo, hoje os RH têm que se formar para aproveitar a diferença de pensamento de cada um. Portanto, os desafios do futuro serão inúmeros, mas extraordinários.
“(…) Pessoas & Negócios” são duas faces da mesma moeda”.
Para si o que é ser um bom gestor de pessoas?
Alguém que sabe que com as pessoas se obtém resultados! Alguém que, para além de gostar de pessoas, gosta de potenciar o atingimento de resultados e os sucessos dos negócios. Alguém que sabe que “Pessoas & Negócios” são duas faces da mesma moeda.
Há alguma companhia área que seja para si um modelo a seguir na contratação de pessoas?
A TAP Air Portugal, claro! Por tudo o que disse acima. E uma coisa é certa… as nossas pessoas amanhã farão sempre melhor do que hoje! Temos uma cultura de superação! E isso é fantástico!
Lançou um livro no ano passado. Quais são as principais mensagens que passa?
Em 2019 publiquei três livros! Sou muito intenso na passagem das minhas mensagens. Todos têm algo em comum… PESSOAS & NEGÓCIOS! As pessoas são o bem mais importante das empresas e organizações pois é nas relações e nas interações que estão os sucessos nos negócios.