Opinião
Não confundir protocolo com a etiqueta e boas maneiras

O protocolo sempre existiu de forma incipiente desde que foi necessário ordenar documentos ou pessoas. Mas refinou-se com o andar dos tempos e a crescente complexificação da vida e da organização das sociedades.
Hoje a palavra protocolo é associada a cerimónias oficiais com pompa e grande solenidade em que as entidades que nelas participam parecem obedecer a uma “marcação” preestabelecida, que evita, quando evita, atropelos, precipitações ou confusões.
Segundo a “Enciclopédia de Relações Internacionais”[1], o protocolo do Estado é o “conjunto de regras e procedimentos que, estabelecendo precedências, privilégios e distinções, regulam as relações dos órgãos e agentes do poder (ou dos poderes) no seio de uma determinada comunidade”.
É um instrumento da política externa da diplomacia, que ao longo dos séculos serviu para facilitar a convivência entre Estados e para dar dignidade e pompa aos atos oficiais. Rege-se por regras escritas, bastante rígidas, e quase intemporais. Este protocolo implica normas, legislação e regras, que só existem no âmbito oficial.
Mas existem outros protocolos para além deste. Cada instituição, seja ela um Instituto Público, um Ministério, uma Universidade, as Forças Armadas, uma Igreja ou uma Empresa, rege-se por rituais próprios e regras internas. Nesse caso, o protocolo, como escrevi no meu livro “Imagem e Sucesso”, baseia-se em três bês: boa educação, bom senso e bom gosto[2].
Resumindo, o protocolo é um código de ordenamento que, unido à aplicação de certas técnicas, contribui para uma afirmação positiva da instituição e dos seus dirigentes, enquanto as boas maneiras são um código de comportamento que facilita o relacionamento entre pessoas em sociedade. Não há protocolo sem boa educação, mas pode haver boa educação sem protocolo.
Ter boas maneiras, em meu entender, é tratar todos da mesma maneira. Protocolo é tratar cada um conforme as funções que desempenha ou a hierarquia que vigora na instituição. Ou seja, saúda-se o porteiro e o presidente da empresa da mesma maneira dizendo “bom dia”. Mas no caso do presidente acrescenta-se “Senhor presidente”. Claro que num evento o porteiro ficará na entrada e o presidente irá para o lugar de destaque atribuído pelo protocolo.
Apesar de serem diferentes das normas de protocolo, as regras das boas maneiras são fundamentais para gerir todas as situações que vão surgindo no dia a dia. Nunca se pode perder o sorriso, nem a boa educação. Mesmo que num evento com protocolo um convidado se tenha sentado num lugar a que não tem direito, há sempre uma maneira de, com ar simpático acompanhado de um sorriso, lhe perguntar se ele é a pessoa a quem aquele lugar se destina. Ele responderá que não e então, com o mesmo sorriso e simpatia, devemos perguntar-lhe o nome e o cargo. Depois pedir-lhe que nos acompanhe para o levar ao lugar que lhe corresponde. Ele ficará contente por saber que tem um lugar e por ser acompanhado até esse lugar por um elemento do protocolo. Mesmo que o coloquemos no primeiro lugar vago que encontrarmos, temos a questão solucionada.
Quanto à etiqueta, sempre foi importante e varia de sociedade para sociedade. O livro de etiqueta mais antigo está na Biblioteca Nacional em Paris, e foi escrito por volta de 2.400 AC, pelo faraó Ptahhotep, em folhas de papiro. Mas o termo etiqueta nasce em França, na Corte de Luís XIV, onde as pessoas ao chegarem ao pátio (cour) de Versalhes, recebiam pequenas folhas (etiquettes) onde estavam inscritas algumas instruções, breves, quanto à posição e ao comportamento que deveriam assumir nas cerimónias reais para que eram convidadas. E está por isso ligada ao nascimento do protocolo de corte.
Hoje a etiqueta é muitas vezes ridicularizada, mas, em tempos, foi sinónimo de boa educação, de elegância e de outras virtudes semelhantes que eram (e são) muito apreciadas em qualquer sociedade civilizada. Baseada nas boas maneiras, a regra era dar mais importância aos mais idosos – e por isso os mais velhos passavam à frente dos mais novos –, e às mulheres que, por serem consideradas mais frágeis, passavam à frente dos homens. Com o advento do feminismo e da luta pela igualdade, isto acabou. Nem nos lugares dos transportes públicos os mais novos cedem o lugar aos mais velhos, nem nos elevadores dos edifícios se cede a passagem às mulheres. Pessoalmente, confesso que continuo a gostar que um homem me ceda a passagem seja por ser mulher, seja por ser mais velha…
[1] Mendes, Nuno Canas & Coutinho, Francisco Pereira (org.) – Enciclopédia das Relações Internacionais (Alfragide: D. Quixote, 2014).
[2] Amaral, Isabel – Imagem e Sucesso (Alfragide: Casa das Letras, 2018).