Opinião

Falta de tempo… ou de disponibilidade mental?

Rosário Pinto Correia, Católica Lisbon School of Business and Economics

Há muitos, muitos anos, quando me queixava de que há uma semana não falava com a minha Mãe porque não tinha tempo, levei uma resposta torta: “O problema não é falta de tempo, é falta de disponibilidade mental…”.

Não percebi, achei que quem me descompunha não percebia nada de nada e continuei a fazer tudo da mesma forma. Filhos, casa, emprego, marido, amigos, ginásio… e sempre o tempo a não chegar para falar com a minha Mãe tanto quanto queria.

Passaram uns anos e, de repente, a falta de disponibilidade mental voltou-me à memória:
A propósito da vida maluca que levamos e do comentário muitas vezes repetido “não tenho tempo para nada”;
A propósito do tempo que não dedicamos a tentar encontrar onde devemos mesmo usar o tempo que temos;
A propósito da falta de capacidade que temos para escolher o que é de facto importante, em vez de só pensarmos no que é imediato e urgente;
Mas, sobretudo, a propósito da loucura do Natal.

O advento começa quatro domingos antes do Natal (este ano a 3 de dezembro):
E é nesse dia que começa a época do Natal para aqueles para quem o Natal tem sentido religioso;
É nesse dia que os cristãos se começam a preparar para o nascimento de Jesus, de forma mais consistente;
E era também nesse dia que se começava a decorar as casas e lojas, que se acendiam as luzes de Natal nas ruas e que se pensava de forma mais presente no Natal – que tinha, para todos, crentes e não crentes, um significado especial de solidariedade, família e partilha.

Agora assisto estupefacta a um espetáculo de Natal que não reconheço:
Cidades iluminadas e decoradas já em outubro;
Jantares de Natal que se multiplicam, já em novembro – por vezes com pessoas de quem até não estamos muito perto – e nos entopem a agenda, se a todos aderirmos;
Esquemas de troca anónima de presentes – sem que consiga perceber a lógica de comprar um presente sem saber a quem se destina;
Lojas cheias de pessoas apressadas e maldispostas, com listas intermináveis de presentes que precisam de “despachar” (palavra horrível para descrever a oferta de alguma coisa a alguém!…);
Eventos atrás de eventos com o objetivo de recolher fundos ou donativos para as mais diversas causas, muitos sem esforço de outro envolvimento que não a contribuição monetária ou equivalente de quem neles é desafiado a participar;
E muitas mais loucuras … todas atafulhadas e atabalhoadas, num tempo que devia ser de calma e de paz!

No meio desta confusão, temos sempre presente um queixume: esta altura do ano é horrível, não temos tempo para nada, estou estoirado e ainda faltam duas semanas para o Natal, …
Fica por isso a pergunta: será mesmo que não temos tempo… ou será que não temos disponibilidade mental para o que é importante?

Quando nos passa à frente algo de verdadeiramente marcante – uma doença de alguém que nos é próximo, um pedido de ajuda a que não podemos virar as costas, uma causa por que nos apaixonamos, um desafio profissional irresistível – o tempo aparece para fazermos aquilo que temos ou queremos mesmo fazer, certo?
Será que é preciso acontecer alguma coisa, para pararmos e pensarmos no que estamos a fazer?

Se conseguirmos tomar um bocadinho de distância do frenesim em que caímos, conseguiremos ver melhor as armadilhas em que estamos a cair e poderemos lutar para fugir delas.
E o tempo aparece para o que é importante, porque já temos disponibilidade mental para fazer as nossas escolhas!

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Maria do Rosário Pinto Correia

Maria do Rosário Pinto Correia

Maria do Rosário Pinto Correia é Founder e CEO da Experienced Management e regente da disciplina de Marketing in The New Era (licenciatura em Business Management) na CLSBE. Coordena, ainda, três programas de Executive Education - PGV - Programa de Gestão de Vendas, EI - Estratégias de Internacionalização e CE – Comunicação Estratégica, e é responsável pelo desenvolvimento de atividades da Executive Education da CATÓLICA-LISBON no Brasil e na Ásia. Licenciada em Ciências Económicas e Empresariais pela Universidade Católica Portuguesa,... Ler Mais..

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