Opinião
Ética e outros valores que perderam valor

Max Weber, sociólogo alemão, escreveu um dos textos mais influentes da sociologia: “A Ética Protestante e o “Espírito” do Capitalismo”. Nessa obra, o autor analisa a relação entre os valores e crenças do protestantismo, e o desenvolvimento do sistema capitalista.
Por seu lado, o filosofo Peter Singer, na sua obra Ética Prática (2023, Cambrige University Press), constata que embora a ética e a moralidade sejam frequentemente vistas como conceitos distintos, ele argumenta em sua abordagem que são essencialmente a mesma coisa. Ele usa esses termos de forma intercambiável, vendo ambos como a aplicação do raciocínio na classificação do que é certo e do que é errado.
Para Singer, ética não significa seguir cegamente uma regra predefinida, como não roubar, mas sim trata-se de considerar consequências de suas ações para todos, literalmente. Isso nos remete para a ética do trabalho. No conceito de Weber, o protestantismo enfatizava a importância do trabalho como uma virtude fundamental, criando assim uma “ética do trabalho” que favoreceu o desenvolvimento do espírito capitalista.
A degradação do sistema de valores
É importante lembrar o contexto histórico de 1905, quando a obra foi lançada, coincidente com o auge da Revolução Industrial, que transformou estruturalmente a sociedade, especialmente na organização do trabalho. Em regra, a reorganização estrutural das sociedades envolve a construção e/ou alteração de sistemas de valores e crenças. Naquele tempo, também se verificou uma crescente secularização e mudança social, com a modernização da sociedade acompanhada pela diminuição da influência religiosa, em detrimento da ciência e da racionalidade.
Atualmente, as tecnologias de informação e comunicação também trouxeram profundas alterações estruturais na sociedade, com a inteligência artificial generativa (IA) como sendo a inovação a mais recente. A pandemia de COVID-19 catalisou transformações significativas nos padrões de trabalho e vida social, como o trabalho remoto e o distanciamento social. E quanto aos valores morais e éticos, senhores líderes?
Casos de falta de ética
Pesquisas recentes, como a da consultora ADP, segundo o site Business Insider (2024), mostram que a competência número 1 exigida pelos empregadores atualmente é a ética no trabalho, mas essa é a habilidade mais difícil de encontrar. Com a IA generativa entrando nas organizações, competências como comunicação e resolução de problemas já não são mais as prioridades. A maioria das organizações sondadas (53%) busca candidatos com uma forte ética de trabalho, mas todas foram unânimes em reconhecer que essa é a habilidade mais difícil de encontrar.
Esses resultados indicam que deficiências em competências técnicas e sociais podem ser supridas por meio de formação, mas as habilidades morais parecem estar em declínio. Não sendo um problema geracional, contudo, os gestores, segundo a CNBC Make It, evitam contratar pessoas da Geração Z, afirmando que elas não têm ética de trabalho e são difíceis de gerenciar. De fato, 94% dos gestores dizem evitar contratá-los (Business Insider).
Casos de falta de ética empresarial
– O anúncio de emprego para o qual você se candidatou pode ser falso. Muitas empresas (especialmente nos EUA) publicam vagas inexistentes, sem intenção de contratar, numa clara falta de ética e responsabilidade. O Resume Builder entrevistou mais de 600 gestores de RH, e cerca de 70% deles consideram essa prática moralmente aceitável. As justificativas são: i) demonstra que a empresa está contratando e crescendo, o que impressiona investidores; ii) mostra que ninguém é insubstituível; e iii) sugere que há uma força de trabalho adicional para aliviar os trabalhadores sobrecarregados.
Como descobrir se a vaga à qual você se candidatou é falsa? Especialistas em recrutamento recomendam verificar se a vaga está aberta há mais de cinco meses, pois isso indica uma grande chance de ser uma vaga falsa.
– O automóvel que você conduz pode ter um software adulterado sobre emissões de gases. Em setembro, o ex-presidente de uma renomada marca de automóveis alemã foi levado aos tribunais por envolvimento em fraudes nos dados de emissões. Ele era conhecido por seu autoritarismo e “pavio curto”.
– Um supermercado de renome está sendo julgado na Alemanha por praticar “descontos enganosos”, violando a legislação comunitária. O esquema consistia em manipular preços, aumentando-os para depois reduzi-los, simulando uma oferta. A legislação da União Europeia impede que os comerciantes induzam os consumidores ao erro com tais práticas. Para ser legal, a redução de preços deve ser calculada com base no preço mais baixo praticado pelo comerciante nos 30 dias anteriores.
– Na Suíça, uma investigação sobre fraudes no sistema eleitoral ameaça a democracia direta. A suspeita é de que milhares de assinaturas falsas foram incluídas nos cadernos eleitorais. Esse sistema exige 100.000 assinaturas de eleitores para qualificar uma proposta para votação nacional. Tais descobertas podem minar a confiança dos cidadãos na democracia direta.
Conclusão: o declínio dos valores
Vivemos um tempo em que os valores éticos e morais parecem estar em constante declínio. Os líderes empresariais têm uma certa responsabilidade no estabelecimento e manutenção de valores que enformem a nossa civilização, valores que não mudem nem com o tempo nem com as gerações. A cultura organizacional sofreu com a pandemia e essa situação foi agravada por uma falha na transição geracional.