Opinião

Dieta organizacional: macronutrientes em tempos de pandemia.

Carlos Rocha, economista e gestor

A pandemia da Covid-19 não avisou que vinha. Provavelmente as próximas pandemias também não avisarão. Empresas não estavam preparadas, países não estavam preparados, famílias não estavam preparadas, as pessoas não estavam preparadas e por isso foi preciso um esforço enorme de adaptação ao novo contexto.

Até agora, em todo o planeta, a maioria das economias mundiais entrou em recessão em 2020, milhões já perderam rendimentos, muitas empresas e negócios faliram, sistemas de saúde entraram em colapso, mais de 3.5 milhões de pessoas morreram até o final de maio.

Apesar disso alguns (países, empresas, pessoas) conseguiram recuperar mais rapidamente: já se pensa em retirar os apoios nomeadamente as moratórias, a maioria das economias já vai crescer este ano e mais de 165 milhões de pessoas já recuperaram. Prescrever o sucesso desta recuperação não cabe no âmbito desta reflexão, mas o certo é que os países, empresas, famílias e indivíduos tiveram algo que permitiu essa recuperação. No caso de países, uma saúde das finanças públicas ajudou muito porque tinham espaço orçamental para as despesas de saúde e para as vacinas. No caso de indivíduos, conhecemos os fatores de risco, nomeadamente as comorbilidades.

E no caso das empresas e organizações no geral? Pessoalmente não sei, cada organização deve fazer o seu diagnóstico.

Mas certamente a qualidade da liderança e dos recursos humanos pode ter feito a diferença. Efetivamente, são os líderes que devem adotar a visão estratégica e as políticas das suas organizações mas cabe aos recursos humanos a sua implementação.

No caso dos indivíduos, apesar de não ser linear, o pensamento comum é de que existem certos riscos nomeadamente as comorbilidades, pelo que a recomendação geral dos profissionais é a adoção de um estilo de vida saudável bem como as medidas de distanciamento social.

Um estilo de vida saudável implica uma alimentação saudável, com os nutrientes necessários e indispensáveis. Segundo a ciência, macronutrientes são componentes da alimentação fundamentais para os organismos e para os animais. E numa empresa, o que poderia ser equivalente aos macronutrientes em tempos de pandemia? Poderiam ser os inputs necessários para dar resiliência e aguentar o modelo de negócio particularmente durante a pandemia.

Recrutamento e seleção

Poderíamos identificar um bom processo de recrutamento e seleção que filtrasse e detetasse e escolhesse efetivamente os melhores quadros, mas numa perspetiva temporal de longo prazo e não simplesmente no momento da seleção.

Um bom sistema de recrutamento e seleção e de gestão de competência no geral, supre a empresa com competências a longo prazo, formando futuros lideres e evitando o que chamo de gap geracional, ou seja entre os novos quadros e os quadros pré-reforma não existe um meio, capaz de fazer a transição da cultura e dos valores organizacionais. Um gap geracional pode implicar perda de experiência, cultura, saberes e competências.

Dados, informação e conhecimento

As proteínas estão presentes em todos os processos celulares. Analogamente, hoje numa organização, num ambiente competitivo e pós pandémico, os dados, podem determinar a morte ou a sobrevivência. Mas só dados não são suficientes, pois são apenas matéria prima, pelo há que saber transformá-los em informações, conhecimento e sabedoria.

Assim a organização pós pandémica deve reforçar o business intelligence, ter mindset, software e hardware mais pró negócio e mais pró resolução de problemas. Uma organização com estas características, certamente terá um forte pendor de inovação e saberá contra-atacar qualquer ataque da concorrência, ou seja, terá, em analogia, um sistema imunitário muito forte. A rotina pode bloquear a inovação.

Inovação

A inovação pode também ser vista como fonte de energia, o que seriam os lípidos do organismo. Inovação pode não ser apenas em novos produtos e serviços, mas também em novos modelos de negócios em tempos de pandemia, novos procedimentos para eliminar desperdício, novas formas de organizar o trabalho, para melhorar a eficiência energética e aumentar a produtividade. Isso não tem que ser simplesmente para start-ups, as empresas incumbentes devem também inovar.

Até ao próximo sucesso da humanidade na luta contra esta pandemia.

 

Versão do texto em inglês

Organizational diet: Macronutrients in a pandemic.

The Covid-19 pandemic did not announce that it was coming. Probably upcoming pandemics will not warn you. Companies were not prepared, countries were not prepared, families were not prepared, people were not prepared and so it took a huge effort to adapt to the new context.

So far, across the planet, most of the world’s economies have gone into recession, millions have lost income, many companies and businesses have gone bankrupt, healthcare systems have collapsed, more than 3.5 million people have died directly.

Despite this, some (countries, companies, people) managed to recover more quickly: it is already considered to withdraw support, namely moratoriums, most economies will already grow this year and more than 165 million people have already recovered. Prescribing the success of this recovery does not fall within the scope of this reflection, but the fact is that countries, companies, families and individuals had something that allowed this recovery. In the case of countries, a healthy public finances helped a lot because they had fiscal space for health expenses and vaccines. In the case of individuals, we know the risk factors, namely comorbidities.

What about companies and organizations in general? Personally I do not know, each organization must make its diagnosis and prepare better for crises.

But certainly the quality of leadership and human resources may have made a difference. Effectively, it is the leaders who must adopt the strategic vision and policies of their organizations, but it is up to the human resources to implement them.

In the case of individuals, although not linear, the common thought is that there are certain risks that are comorbidities, so the general recommendation of health professionals is a healthy lifestyle, which we all know or should know, as well as measures of social distancing.

A healthy lifestyle implies a healthy diet, with the necessary and indispensable nutrients. According to the dictionaries, macronutrients are the fundamental components of food for organisms and animals; the main nutrients are proteins, lipids and carbohydrates. And in a company, what could be equivalent to macronutrients in a pandemic? They could be the necessary inputs to provide resilience and support the business model during the pandemic and beyond.

We could identify a good recruitment and selection process that would effectively filter and detect the best staff, but from a time perspective and not simply at the moment of selection process. A human body that does not eat properly may not have sufficient resilience to inflammation.

A good recruitment and selection system and competence management in general, supplies the company with long-term skills, training future leaders and avoiding what I call the generational gap, that is, between the new staff and the pre-retirement staff does not exist a medium, capable of making the transition from cultural and organizational values. A generational gap can imply loss of experience, culture, knowledge and skills.

Proteins are present in all cellular processes. Similarly, today in an organization in a competitive and post-pandemic environment, data can determine death or survival. But data alone is not enough, as they are only raw material, so it is necessary to know how to transform them into information, knowledge, wisdom and insight.

So the post-pandemic organization must reinforce business intelligence, have mindware, software and hardware more for the business and in a perspective of problem solving. An organization with these characteristics will certainly have a strong penchant for innovation and will know how to counter attack any attack from the competition, that is, it will have, in analogy, a very strong immune system. Routine can block innovation.

Innovation can also be seen as the source of energy, which would be the body’s lipids. Innovation may not only be in new products and services, but also in new business models, new procedures to eliminate waste, energy efficiency, increased productivity. This does not have to be simply for start-ups, incumbents must also innovate.

Until the success of humanity in the fight against this pandemic.

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Carlos Rocha

Carlos Rocha

Carlos Rocha é economista e atualmente é vogal do Conselho de Finanças Públicas de Cabo Verde e ex-presidente do Fundo de Garantia de Depósitos de Cabo Verde. Foi administrador do Banco de Cabo Verde, onde desempenhou anteriormente diversos cargos de liderança. Entre outras funções, foi administrador executivo da CI - Agência de Promoção de Investimento. Doutorado em Economia Monetária e Estabilização macroeconómica e política monetária em Cabo Verde, pelo Instituto Superior de Economia e Gestão – Lisboa, é mestre em... Ler Mais..

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