Opinião

As assistentes virtuais e a humanização das marcas

Nelson Teodoro, diretor de marketing Novabase

O cinema tem sido uma espécie de profeta das novas tecnologias e há muito que Hollywood nos habituou a misturar ficção e realidade e a introduzir tecnologias futuristas nas suas cenas. Hoje, até já existem empresas a contratar realizadores e produtores cinematográficos para projetar o que será o futuro das suas operações e o que os clientes podem esperar que a tecnologia faça por eles.

O KITT do Justiceiro é o primeiro exemplo que recordo, e apareceu no início dos anos 80, mas infelizmente, os exemplos hollywoodescos de heróis e vilões coadjuvados por uma entidade virtual dotada de inteligência e vontade própria têm sido muito pouco explorados por quem anuncia a imperiosa missão de humanizar a relação entre quem vende e quem compra.

Hoje, não basta humanizar as marcas. Ou, pelo menos, não nos moldes tradicionais. Hoje, tão ou mais importante do que essa humanização, é a hercúlea tarefa de dotar as marcas de inteligência e personalidade próprias para permitir que sejam capazes de tomar e influenciar as decisões dos consumidores com base na aprendizagem das suas preferências e expetativas.

As assistentes virtuais, a Siri ou a Alexa, por exemplo, fazem parte desse rol de invenções que todos temos à mão – no carro, nos eletrodomésticos, no smartphone – e que, aparentemente, podem desempenhar essa função. Mas a experiência que deles temos retirado pode ser frustrante e redutora, sobretudo se tivermos em conta o quão desaproveitado tem sido o potencial de disrupção tecnológica da IA e, dentro desta, do Machine Learning associado às assistentes virtuais.

As assistentes virtuais que dependem de uma Inteligência Artificial robusta, são, porventura, um dos grandes desafios da indústria atual. Quem nelas pretenda investir pode, aliás, esperar uma verdadeira corrida ao ouro, ainda que as variáveis e o investimento necessário sejam um desafio difícil de ultrapassar.

Ao contrário da assistente virtual tradicional, que apenas responde ao seu utilizador sem o questionar, os assistentes virtuais dotados de Inteligência Artificial permitem às empresas oferecer produtos personalizados e de valor acrescentado aos seus clientes. É nestas assistentes dotados de uma personalidade forte, aliás, que podem ser confiadas as tomadas de decisão com base num conjunto de critérios e aprendizagens retiradas do seu utilizador. E isto, como facilmente se depreende, representa um salto quântico sem precedentes na relação que as marcas hoje pretendem construir com os seus consumidores.

Por exemplo, uma assistente de IA pode ser capaz de fazer uma reserva num restaurante, ao invés de me indicar apenas o melhor restaurante da zona. Pode estabelecer um diálogo com o responsável da oficina para adaptar a data de revisão do meu carro à minha melhor disponibilidade. Pode decidir por mim qual o melhor destino de férias para um orçamento máximo de 1.500€ em função das minhas preferências e anteriores viagens, em vez de me apresentar uma lista de possíveis escolhas. Pode mudar automaticamente a temperatura do meu quarto com base no meu estado de saúde. Pode sugerir-me uma visita a uma nova atração na cidade com base em anteriores visitas que fiz e as pontuações que dei e adquirir automaticamente o bilhete em meu nome.

Estas, assistentes verdadeiramente disruptivas e inteligentes, quais divinas e omnipresentes entidades virtuais, estão muito mais perto de satisfazer as necessidades e expetativas dos seus utilizadores e, assim, de tornar as marcas mais humanas aos olhos dos seus clientes. As empresas precisam de entender isso e de ter a visão necessária para investir na disrupção e inovação tecnológicas dos seus negócios se querem partir na frente.

Por tudo isto, acredito que não basta apenas manifestar a necessária humanização das marcas como uma tendência ou imposição do marketing atual. Mais do que isso, é preciso recuperar as extraordinárias façanhas dos filmes futuristas de Steven Spielberg ou James Cameron para tirar ilações sobre como fortalecer a personalidade das marcas e humanizar verdadeiramente a relação destas com os seus consumidores.

Os exemplos de um assistente virtual inteligente e omnipresente podem parecer previsões de um futuro ainda incerto, mas não devemos ignorar que há sempre na ficção hollywoodesca um fragmento da realidade por explorar. É disso, pelo menos, que reza a História…

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Nelson Teodoro

Nelson Teodoro

Nelson Teodoro é atualmente Chief Operating Officer da Solid Dogma, agência criativa fundada por Pedro Pires e Alexandre Farto (mais conhecido por Vhils). Foi durante 16 anos diretor de marketing da Novabase, tendo como principal desafio apoiar os negócios da empresa na criação de uma oferta e de uma marca global. Antes de abraçar este desafio, o gestor esteve à frente das operações da Novabase em Moçambique como diretor geral. Anteriormente, ocupou funções ligadas à consultoria de Sistemas de Informação... Ler Mais..

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