Opinião

Agtechs

Daniel Ibri, cofundador e managing partner da Mindset Ventures

O setor dos agronegócios é conhecido como um dos mais resilientes da economia por uma simples razão: não sobrevivemos sem comer. Apesar disso, fazendas, plantações e terras sempre carregaram um estigma da indústria de tecnologia, uma vez que muitos de nós vemos a indústria agrícola de forma desfasada comparada com a transformação tecnológica pela qual muitos outros segmentos têm passado.

Você sabia, no entanto, que o agronegócio está atualmente passando pela sua própria revolução tecnológica nos últimos anos?

Os investidores perceberam.
Investimentos em agtechs – empresas com soluções tecnológicas voltadas para o agronegócio – estão em pleno crescimento. Recentemente, tamanha foi a popularização das agtechs, que elas passaram a compor sua própria categoria de investimentos no mercado de venture capital, com cerca de US$ 14 bilhões investidos em centenas de empresas nos últimos três anos. Além disso, o setor atraiu a atenção dos players de venture capital mais conhecidos do mundo, como o Y Combinator, a Khosla Ventures e a Sequoia, que passaram a ativamente buscar oportunidades neste mercado. Na Mindset Ventures estamos constantemente a monitorizar esta tendência desde que fomos criados, tendo avaliado centenas de empresas desta indústria e feito cinco investimentos em agtechs nos últimos cinco anos.

Drones, automação e blockchain

Tecnologias disruptivas utilizadas em outros setores da economia também têm influenciado positivamente o agronegócio. Após a introdução de drones no universo agrícola, por exemplo, a agricultura de precisão passou a evoluir em velocidade exponencial. Hoje em dia, imagens de satélites em tempo real podem ser ampliadas a um nível nunca imaginado há poucos anos, quando as fotos para o uso agrícola eram tiradas, na maior parte, a partir de aviões.

Nível de precisão de uma foto tirada por um drone da Taranis

Além disso, a combinação de fotos tiradas por drones e das imagens fornecidas por satélites passaram a capturar muito mais informações do que apenas aquelas visíveis a olho nu, sendo atualmente possível medir desde o nível de clorofila nas plantas até o status de irrigação de certas áreas das plantações com imensa precisão. A Taranis, por exemplo (uma das agtechs do portefólio de investimentos da Mindset Ventures), é capaz de diagnosticar problemas em plantações com grande precisão através de imagens tiradas por um sistema ótico acoplável a drones e aviões a um nível de detalhe impercetível até mesmo aos nossos olhos.

A automação também se tem tornado relativamente comum em fazendas de grande porte. Aos que assistiram ao filme Interestelar, um exemplo claro do que está acontecer no campo da automação é mostrado através das colheitadeiras autónomas de cana de açúcar, que não exigem a presença de um motorista e conseguem mapear a rota mais eficiente possível para finalizarem o serviço. Mas a automação vai além da maquinaria; algumas start-ups já têm desenvolvido formas de monitorizar automaticamente e em tempo real o status de temperatura, humidade e uma série de outros fatores em armazéns de grãos para evitar possíveis perdas dos insumos, trabalho que é exercido com excelência pela Telesense, outra empresa do nosso portefólio. Até mesmo fluxos de processos dentro de fazendas podem ser monitorizados e controlados de forma automática a fim de se economizar tempo e gastos desnecessários, tendo a Fieldin desenvolvido uma solução neste sentido.

Apesar de aparentar não possuir aplicação no agronegócio, o blockchain também tem sido utilizado entre as tecnologias desenvolvidas pelas agtechs, possibilitando a execução de transações seguras entre produtores sem a necessidade de um intermediário, consequentemente reduzindo custos transacionais. A aplicação de blockchain na agricultura é ampla e apresenta grandes perspetivas, podendo ser usada para tornar mais eficiente o processo de contratação de seguros agrícolas, otimizar o fornecimento de insumos, entre diversas outras razões.

Israel e Brasil – a combinação perfeita para o sucesso das agtechs

Israel é um dos polos de tecnologia agrícola mais importantes do mundo, sendo a agricultura particularmente importante para a cultura deste país. A população israelita é em grande parte formada por imigrantes cujos descendentes encontraram maneiras de transformar grandes espaços de deserto em áreas cultiváveis. Para fornecer água e comida adequadamente a uma população que crescia rapidamente, os israelitas foram forçados a inovar, recebendo suporte público e privado na criação de tecnologias agrícolas. Como resultado, hoje o país é um dos líderes no desenvolvimento de tecnologias ligadas ao tratamento e distribuição de água e à agricultura.

Dada a limitação geográfica do país, as agtechs israelitas costumam almejar a expansão internacional desde sua criação. Neste contexto, o Brasil aparece naturalmente como um dos destinos mais cobiçados por essas empresas em função do seu tamanho, diversidade de biomas e da maturidade do seu mercado agrícola. Parcerias entre agtechs israelitas e empresas brasileiras permitem a essas start-ups  adquirir rapidamente tração e absorverem grandes quantidades de dados para aperfeiçoarem seus algoritmos e tecnologias. A SeeTree, outra empresa do portefólio da Mindset Ventures, é um claro exemplo deste processo de expansão. A start-up utiliza uma combinação de software e hardware para monitorizar a saúde e produtividade de árvores em nível individual, tendo sido introduzida no país por nós para monitorizar árvores de um dos maiores produtores de laranja do mundo.

Construindo pontes entre Israel e Brasil

Apesar da combinação de agtechs israelitas com o mercado brasileiro possuir potencial de gerar resultados impressionantes, essa tarefa oferece uma série de dificuldades em função das diferenças culturais e regulatórias entre as duas nações. No meio disso, parceiros locais podem auxiliar as empresas israelitas a encontrarem potenciais clientes e prestadores de serviços, ajudar a contratar uma equipa local e estabelecer pontes com advogados brasileiros experientes.

Com o passar dos anos, a Mindset Ventures desenvolveu uma grande experiência neste tipo de atividade, sendo a Taranis e a SeeTree dois grandes exemplos do nosso esforço em auxiliar as nossas agtechs na expansão para o Brasil. Ajudamos estas empresas a contratar equipas locais, a encontrarem clientes e a negociarem contratos. Os primeiros passos são sempre os mais difíceis na expansão internacional, especialmente dentro do Brasil, e é por esta razão que concentramos tantos esforços nas etapas iniciais deste processo com nossas start-ups. Quando empreendedores de agtechs desenvolvem tecnologias que podem transformar a indústria e se conectam com os parceiros corretos para escalarem seus negócios, são criadas empresas incríveis. É com grande satisfação que podemos frequentemente participar neste tipo de processo.

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