Entrevista/ “A vergonha lusitana impede muitos de recorrerem ao layoff”

Ricardo Carvalho, CEO da Lisbon Project e business angel

“O estigma associado ao regime de layoff leva a que muitas empresas não acionem esta medida. No entanto, não deverão hesitar, porque o mais importante é preservar o negócio e os ordenados dos colaboradores a longo prazo”, defende Ricardo Carvalho, CEO do Grupo Lisbon Project e business angel, em entrevista ao Link To Leaders.

Ainda que possa parecer estranho ou longe da realidade, o mundo mudou num curto espaço de tempo e os negócios estão a mudar com ele. Em tempos de pandemia surgem sinais, mudanças nos comportamentos que aceleram em massa e que obrigam a repensar os modelos das organizações.

Porque ninguém escapa a esta pandemia, sejam pequenos, sejam grandes, o que poderão fazer as start-ups para se adaptar a esta nova realidade? Quais as indústrias que vão crescer radicalmente por influência direta do coronavírus? Que medidas devem os jovens empreendedores adotar para salvar os seus negócios?

Em entrevista ao Link To Leaders, Ricardo Carvalho, CEO do Grupo Lisbon Project e business angel na REDangels, fala sobre a disrupção produtiva provocada pela estagnação da economia, a influência que tem o estágio em que as start-ups se encontram neste momento e deixa um aconselho aos jovens empreendedores para recorrem às ajudas do Estado: “As empresas que se enquadrem deverão beneficiar dos mecanismos à sua disposição”.

“(…) se as start-ups se encontrarem a lançar ou a já a comercializar um produto ou serviço, naturalmente, o impacto será maior. Certamente, as vendas previstas para este ano, em plano de negócios, dificilmente atingirão as previsões estimadas”

Conseguirão as start-ups portuguesas adaptar-se às consequências do Covid-19?
A pandemia de Covid-19 marca uma etapa sem paralelo na história recente, provocando uma interrupção abrupta nas cadeias de produção a nível global. Os cenários e projeções económicos variam substancialmente mediante a variável tempo. A disrupção produtiva, provocada pela estagnação da economia, apresenta um impacto muito diferente no tecido empresarial consoante a sua duração seja três ou seis meses, podendo neste caso contagiar o setor financeiro e tornar-se um fenómeno sistémico.

Outra variável relevante é o estágio em que as start-ups se encontram, se estiverem em fase de desenvolvimento de produto no final da crise, o impacto não será tão profundo; se as start-ups se encontrarem a lançar ou a já a comercializar um produto ou serviço, naturalmente, o impacto será maior. Certamente, as vendas previstas para este ano, em plano de negócios, dificilmente atingirão as previsões estimadas.

Uma crise desta natureza torna-se, acima de tudo, uma crise de confiança, sentimento decisivo para quem investe em empresas que, na maior parte das vezes, não apresentam vendas. Como tal, levantar capital será, a médio prazo, mais difícil. No entanto, há um fator importante a ter em conta, uma start-up, tipicamente, apresenta características que podem ajudar a prevalecer num momento de crise profunda: agilidade, capacidade de adaptação e uma estrutura de custos leve.

Os jovens empreendedores devem recorrer às ajudas do Estado. As empresas que se enquadrem deverão beneficiar dos mecanismos à sua disposição. Acredito que a elevada carga fiscal, a que todos nós estamos sujeitos, deverá servir, em momentos como este, como um verdadeiro estabilizador automático da economia. O estigma associado ao regime de lay-off leva a que muitas empresas não acionem esta medida. No entanto, não deverão hesitar, porque o mais importante é preservar o negócio e os ordenados dos colaboradores a longo prazo.

Finalmente, cabe ainda ao Estado, acelerar medidas de reembolso de fundos P2020 e promover incentivos fiscais ao investimento por parte de sociedades de capital de risco e business angels.

Quais serão os setores mais afetados e quais as start-ups que poderão tirar “maior partido” da situação?
As start-ups que, de alguma forma, trabalhem com produtos associados a bens de consumo ou turismo serão bastante penalizadas. É uma consequência imediata e inevitável da pandemia. No entanto, há um aspeto positivo, que é o despertar da vertente de negócio digital em vários setores tradicionais. Soluções que se enquadrem no apoio na prestação de serviços remotos terão um crescimento exponencial, nomeadamente: onboarding e autenticação de clientes para banca e setor segurador, chatbots alicerçados em sistemas de machine learning, que apoiem grandes organizações a responder a um número cada vez maior de pedidos online.

Finalmente, destaco um setor crítico e que poderá evidenciar-se nesta fase: plataformas e softwares de TeleHealth. Apps de apoio a terapias de recuperação ou monitorização de pacientes à distância vão tornar-se numa aposta de futuro, devido à crise que atravessamos. Não faz sentido os sistemas nacionais de saúde ficarem sobrecarregados com utentes que podem ser tratados à distância. Adicionalmente, os Estados Unidos da América legislaram, já este ano, no sentido de remover barreiras regulatórias a este tipo de produto, o que provocará uma revolução naquela que, ainda, é a maior economia mundial.

De qualquer forma o maior ativo de qualquer start-up é o capital humano, logo, o mais importante é preservar as pessoas mantendo-as a salvo. Certamente melhores dias virão!

Que conselhos dá aos fundadores das start-ups?
Os empresários deverão recorrer a todas as ferramentas disponíveis. A “vergonha lusitana” impede muitos de recorrerem ao layoff. Deverão agir enquanto é tempo!


Esta é a quinta entrevista que publicámos ao longo da semana com business angels. Pode consultar as restantes abaixo.

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