Opinião

A gestão moderna e o Bacalhau à Brás

Pedro Alvito, professor de Política de Empresa da AESE Business School

Estava eu em S. Paulo, no Brasil, a trabalhar e saudoso da comida portuguesa, quando me levaram, segundo os meus colegas de lá, ao melhor restaurante português da cidade. Seduzido pelo menu muito português, decidi-me por um Bacalhau à Brás que eu tanto gosto e que o empregado referiu como sendo uma das especialidades da casa.

Qual não é a minha surpresa quando me põem um prato à frente, contendo aquilo que eu definiria como ovos mexidos com bacalhau de cebolada acompanhado de batata palha. Perante a minha estupefação o empregado disse-me logo que se eu quisesse mais batatas era só pedir.

Quase trinta anos passados vejo novamente, para meu espanto, um dos chefs mais mediáticos do mundo a fazer uma bifana no pão à moda de Portugal que, no final resulta numa sanduíche que leva queijo, pimentos refogados, presunto tostado e rúcula, além de evidentemente a pobre bifana, neste caso, grelhada, e tudo isto num pão mais queimado do que torrado.

De facto, existem hoje em dia uns quantos personagens, não só na culinária, que porque são célebres ou o querem ser, excedem-se em criatividade, destruindo aquilo que é normal. Podiam chamar-lhe outro nome, mas agarram-se à fama do prato existente dando-lhe aquilo que acham ser um toque de novidade, que é a marca da sua personalidade genial, e no final… estragam tudo. Já não falo aqui no pastel de nata de camarão, que vi há dias, e que podia e devia chamar-se apenas de folhado de camarão com creme de nata.

É fantástico como este mal se pega à gestão das empresas ditas modernas que adotam modas, perdem tempo e dinheiro em “modernices”, em novos rumos e novas formas de se organizarem que, dando dinheiro a ganhar a muitas empresas de consultoria, o que resulta no final é uma mão cheia de nada, porque logo a seguir vem outra moda que é urgente adotar.

Recordo-me de uma enorme multinacional que uma vez queria exigir à empresa onde eu trabalhava, que no âmbito da parceria que tínhamos com eles, fizéssemos (o que estava na altura na moda): um leilão invertido para comprar a nossa principal matéria-prima. O problema é que no mundo só havia um fornecedor que cumpria as especificações por eles exigidas, mas convencê-los do ilógico da situação foi quase tarefa impossível. E perdem-se horas na gestão das empresas a fazer, a implementar, a modificar e a reajustar procedimentos que podiam e deviam ser simples.

É o querer mostrar que se é mais inteligente do que os outros, que estamos na crista da onda da inovação, que sabemos o que os outros não sabem e, mais do que isso, que temos uma maneira de fazer as coisas que é genial e única.

Na culinária e na gestão, sigo a regra do ‘keep it simple’ e o princípio fundamental de que o mais importante na mudança é saber o que não devemos mudar: não me estraguem o Bacalhau à Brás e, por favor, não inventem o desnecessário na gestão das empresas.


Pedro Alvito é, desde 2017, professor na AESE, onde leciona na área de Política de Empresa, tendo dado aulas também na ASM – Angola School of Management. Autor de duas dezenas de case studies publicados pela AESE e de dois livros publicados pela Editora Almedina – “Manual de como construir o futuro nas empresas familiares” e “Um mundo à nossa espera, manual de globalização”. Escreve regularmente em vários órgãos de comunicação social especializada. Desde 2023 é presidente do Conselho de Família e da Assembleia Familiar do grupo Portugália e membro do Conselho Consultivo da GWIKER.

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