Opinião

Reforçar o peso da indústria no PIB

Alexandre Meireles, presidente da ANJE*

A industrialização em Portugal foi difícil e tardia. O primeiro impulso industrializador só ocorreu durante o Liberalismo Vintista (1820-1834), mas foi travado pela guerra civil e por constantes mudanças governamentais. Posteriormente, houve um surto de desenvolvimento industrial durante a Regeneração (1851-1890) e um segundo surto no final do século XIX, com o aparecimento das grandes companhias industriais.

A partir de então, o crescimento da indústria foi fortemente limitado pelas circunstâncias políticas, desde a instabilidade da I República ao impulso coletivista do PREC, passando pelo condicionamento industrial do Estado Novo.

Nos anos 80/90, a indústria portuguesa caracterizava-se, grosso modo, por unidades fabris pesadas e de baixo valor acrescentado, empregando mão-de-obra pouco qualificada e consumindo intensivamente recursos naturais. Estas fábricas tinham impactos consideráveis no ambiente e ofereciam condições de trabalho pouco dignas, embora se revelassem por vezes competitivas graças, sobretudo, aos baixos custos de produção. Mas, com a globalização dos mercados na passagem do século XX para o XXI, muita desta indústria sucumbiu por falta de competitividade e obsolescência tecnológica.

A imagem da indústria enquanto atividade poluente, pouco especializada, com baixos salários e reduzido valor acrescentado prevaleceu como um estigma até quase aos dias de hoje. Assim foi em Portugal, mas também no resto da Europa, onde, durante as últimas décadas, o setor secundário entrou em declínio, registando uma quebra de cerca de 10% no emprego e uma descida superior a 15% na contribuição para o PIB europeu. Números que fizeram soar as campainhas de alarme, havendo hoje um consenso na Europa em torno da necessidade de relançamento da indústria.

Também em Portugal há muito que se defende a reindustrialização do país. Relembro que o à época Ministro da Economia, Santos Pereira (2011-13), estabeleceu como meta o crescimento para os 20% do contributo da indústria para o PIB nacional (nas décadas de 1970 e 1980 andava perto dos 30%). Dez anos volvidos, esta meta ainda me parece pertinente, exequível e mobilizadora. Pertinente, porque o relançamento da economia portuguesa passa, em larga medida, pelo aumento da produção de bens transacionáveis. Exequível, porque Portugal tem na indústria setores tradicionalmente exportadores e que continuam a revelar-se competitivos (têxteis, calçado, maquinaria, mobiliário, cortiça, cerâmica, plásticos, químicos, etc.), bem como setores baseados no conhecimento nos quais o nosso país vai ganhando alguma notoriedade internacional (biotecnologia, farmacêutica, dispositivos médicos, tecnologias digitais, energia, materiais, etc.). Mobilizadora, porque reúne o consenso dos parceiros sociais, desde as associações empresariais aos sindicatos, que veem no desenvolvimento da indústria um importante fator de promoção do crescimento, da competitividade, do emprego e da coesão social.

Existem, portanto, condições para uma agenda industrial em Portugal. Contudo, a meu ver, essa agenda só será concretizada se incluir um conjunto de medidas estruturais. A saber: a redução da burocracia, que é bastante pesada nos licenciamentos industriais; o aumento dos incentivos à inovação, para que a indústria desenvolva produtos de maior intensidade tecnológica; a criação de linhas de financiamento específicas para novos negócios na indústria; a dinamização dos polos de competitividade; a reformulação do Programa COMPETE, de forma a torná-lo menos seletivo sem sacrificar o rigor na avaliação dos projetos; a aceleração da transição energética, reduzindo a dependência de energia do exterior; e a implementação de bónus no IRC para empresas que criem emprego e valorizem salários.

*Associação Nacional de Jovens Empresários

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Alexandre Meireles

Alexandre Meireles

Alexandre Meireles foi presidente da Direção Nacional da ANJE-Associação Nacional de Jovens Empresários até julho de 2024. Natural de Amarante, é licenciado em Engenharia Eletrotécnica, no ISEP, e tem o Curso Geral de Gestão da Porto Business School. A sua carreira profissional está ligada a diferentes setores de atividade, entre os quais restauração e saúde. No período de 2009 a 2011 foi energy division coordinator no grupo Mota-Engil, e depois dessa experiência abraçou a atividade empresarial. Alexandre Meireles é cofundador... Ler Mais..

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