Opinião
Quando a IA tem lugar à mesa da Comissão Executiva
Imagine-se uma reunião da Comissão Executiva dentro de alguns anos: na sala, além dos diretores, está presente um assistente de IA, projetado em tempo real, capaz de analisar cenários, simular impactos e questionar pressupostos. Não substitui a liderança, mas funciona como um “espelho crítico” que desafia a intuição e reforça a qualidade das decisões.
Antevê-se que a empresa de amanhã — seja uma PME ágil ou uma grande organização global — seja moldada por uma convivência permanente entre humanos e sistemas de IA avançada. A tecnologia deixará de ser apenas uma ferramenta e tornar-se-á uma presença estrutural no quotidiano empresarial, influenciando decisões, processos, modelos de negócio, bem como a forma como cada profissional contribui para a criação de valor.
Se, numa PME, a IA funcionará como um “reforço de competências “de gestão, porque automatiza tarefas administrativas, apoia a análise de mercado, antecipa necessidades de clientes e melhora a eficiência operacional, nas grandes empresas o impacto será exponencial. Os modelos preditivos orientarão investimentos, a gestão de risco será contínua e dinâmica, e as cadeias de valor reorganizar-se-ão em função dos fluxos de dados e, não tanto da geografia.
Os próprios clusters competitivos sofrerão mutações significativas. As fronteiras sectoriais tornam-se mais porosas e a concorrência passa a surgir de empresas que partilham dados, infraestruturas tecnológicas ou plataformas de IA. Isto significa que a competição será cada vez mais entre ecossistemas e não apenas entre empresas.
Nas cadeias de abastecimento, o impacto tenderá a ser expressivo. A rastreabilidade torna-se quase total: sistemas inteligentes detetam práticas laborais inadequadas, avaliam pegadas de carbono e garantem maior conformidade ética. A transparência deixa de depender da boa vontade das empresas e passa a ser estrutural, alimentada por dados em tempo real.
Em termos da estrutura organizacional, os cargos de topo tenderão a conhecer uma nova faceta. O líder máximo deixa de ser um gestor executivo para se tornar o curador da visão, responsável por alinhar propósito, cultura e tecnologia. A sua missão estará focada na combinação da capacidade preditiva da IA com o julgamento humano, garantindo que as decisões são eficientes, mas também éticas, transparentes e socialmente responsáveis. Em vez de liderar apenas equipas humanas, passará a orquestrar ecossistemas híbridos onde algoritmos e pessoas colaboram para gerar valor.
O CMO terá de ser um gestor de ecossistemas de experiência, combinando dados em tempo real com criatividade aumentada pela IA. O CFO, por sua vez, terá um papel ainda mais estratégico: interpretar modelos financeiros gerados por IA, avaliar probabilidades de cenários e negociar recursos para iniciativas que dependem de algoritmos adaptativos. Também é natural que surjam novos papéis no organograma: Chief AI Officer (responsável pela governação da IA), Chief Data Ethicist (que gere o uso responsável de dados), responsáveis de simulação estratégica e até gestores de equipas híbridas — humanos e agentes autónomos.
A forma de comunicar não fica de fora desta transformação. Os sites continuarão a existir, mas assumirão um carácter mais modular e dinâmico, adaptando-se automaticamente ao visitante. As redes sociais podem manter a sua relevância, embora a fragmentação das plataformas e a emergência de espaços digitais imersivos obriguem as marcas a comunicar em formatos mais sensoriais, interativos e personalizados. Crescerão vídeos sintéticos, conteúdos conversacionais, experiências imersivas e interfaces de voz.
Ainda assim, os planos estratégicos ou de marketing, continuam a ser necessários, mas com ciclos muito mais curtos. A volatilidade dos mercados não elimina a estratégia; obriga-a a tornar-se iterativa, testada continuamente e ajustada por modelos preditivos que incorporam variáveis em constante mudança.
A empresa de amanhã será, em última análise, uma organização adaptativa: aprende, antecipa, simula, experimenta e evolui. E a liderança será o ponto de equilíbrio entre a inteligência das máquinas e a sabedoria humana.








