Entrevista/ 5 questões a Ricardo Marinho, cofundador e CEO da Plani.AI
“Atrair investimento não é um “achievement”, mas sim uma etapa necessária para subir mais um degrau na escada do sucesso de um negócio tech”, afirma o cofundador e CEO da Plani.AI. Ricardo Marinho fala da sua experiência como empreendedor e da sua visão sobre o mercado.
A Plani.AI é uma plataforma que ajuda as empresas e start-ups a gerar mais rapidamente os seus planos de negócios, de marketing ou estudos de mercado, entre outras valências, recorrendo a inteligência artificial. O projeto é fundado por Ricardo Marinho, Ângelo Monteiro e Stefan Aguiar que, assim, respondem à procura dos empreendedores por este tipo de ferramentas.
O que é para si inovação?
Temos a tendência de achar que inovar é criar algo novo, mas esse pensamento pode ser limitador. Inovar na maioria das vezes é melhorar algo que já existe. Na verdade, será altamente improvável criar algo que seja realmente novo, algo nunca antes visto. Citando Picasso “Bons artistas copiam, grandes artistas roubam” é uma abordagem que pode ser aplicada à inovação, onde demonstra que muito do que temos hoje é um remix de algo que já existia, mas aplicado de uma forma diferente e refinada. Aquilo que um bom produto tem hoje em apresentação, pode ser aplicado de forma notável noutro com uma visão distinta. E quem beneficia com isso é o utilizador final.
A inovação também tem várias caras porque ela não se aplica apenas a produtos ou serviços, mas a vários conceitos. Pode e deve ser aplicada em métodos, sistemas e comportamentos. Na maioria das vezes ela nasce de uma necessidade identificada. Porém, difícil é o processo para a identificação dessa necessidade, seja por ego, por falta de visão ou por sermos leigos em determinada matéria.
Se estivermos atentos, facilmente conseguimos identificar padrões que nos permitem perceber onde as melhorias podem ser aplicadas por forma a elevar um avanço substancial naquilo que cada um considera ser importante. Porque inovar é isso, é provocar uma ação que permite desbloquear uma limitação plausível mas que assegura algum tipo de evolução. Por vezes pode ser um pequeno detalhe, outras, um conjunto de mecanismos mais prolongados e desafiantes para atingirmos o mesmo resultado final que é: garantir algum tipo de evolução. O mais interessante é que inovação está sempre em mutação. Aquilo que inovamos hoje, muitas vezes causa uma cadeia de relacionamentos que precisará novamente de ser avaliada lá na frente devido a algum tipo de mudança de circunstância ou ambiente que essa mesma inovação provocou.
Por fim, mas não menos importante, a inovação requer um certo timbre de coragem e perseverança para nos questionarmos e estarmos preparados com o que advém como resposta a essas questões, pois não se trata apenas da necessidade de habilidades técnicas, mas também um lado emocional e mental preparado.
“(…) na verdade, o líder é só mais uma peça para atingir um propósito”.
Qual a competência fundamental para exercer a liderança nos dias de hoje?
Nos meus 10 anos em cargos de liderança percebi que os dois aspetos fundamentais que se conjugam entre si e, onde acredito ser o ponto de partida para uma boa liderança, é a capacidade de saber ouvir e observar. Diria até que, na maioria das vezes, é mais importante saber escutar do que saber comunicar. Saber observar, do que apenas agir. Claro que ser comunicativo é uma característica também ela fundamental pois é um instrumento que permite inspirar, mas não esquecendo que as ações de um líder também inspiram. Quando realmente escutamos e observamos ficamos a conhecer quase ao pormenor os quatro elementos essenciais que um líder precisa de saber gerir para obter resultados de excelência dos seus pares: O que os motiva?, O que receiam?, Onde são excelentes?, Onde são medíocres?
E quando um líder está munido com esse conhecimento não precisará de falar ou agir em demasia, mas apenas o necessário. Eu não olho para a posição de liderança como se fosse uma pirâmide, onde o líder está no topo e os seus seguidores nos restante patamares. Por vezes sinto que se perceciona com um certo glamour a posição de um líder, como se fosse o “MVP (Most Value Player)”, mas, na verdade, o líder é só mais uma peça para atingir um propósito.
Deste modo, eu olho para esta posição mais como uma network, onde o líder e equipa estão lado a lado e são uma força motriz. O líder dita o rumo e envolve os elementos, mas não se pode esquecer que é só mais uma peça neste ambiente. Na equipa existem outras atividades a serem asseguradas de igual importância às responsabilidades de um líder (que certamente não conseguirá fazer sozinho) e, por isso, terá de saber influenciar para que alguém as execute com excelência. Por fim, o que define um bom líder é, na verdade, algo muito simples: a produtividade apresentada, a satisfação dos pares e os resultados obtidos.
Uma ideia que gostava de implementar?
É de conhecimento comum que a Inteligência Artificial está na ordem do dia. Pela primeira vez a humanidade está a assistir a um “ser” com inteligência que se compara à de um humano e que rapidamente o ultrapassará. Varias questões aqui se levantam e muitas delas, ainda sem resposta.
Uma das características que define um humano altamente inteligente é a sua capacidade de memória. No entanto, no caso de uma AI, ela é a própria memória.
Posto isto e, não descartando as preocupações, mas olhando para as suas capacidades, concordo com as ideias que li também aqui no Link to Leaders, em como a AI já é um grande avançado tecnológico e que terá um impacto tremendo nas nossas vidas. Dado este impacto, defendo que o acesso a este enorme avanço fosse distribuído de forma equitativa, à semelhança da própria Internet. Mas a verdade é que não o é. A AI também se está a mostrar uma grande oportunidade de negócio, basta olhar para as empresas cotadas em bolsa que fornecem os Chips ou que desenvolvem os LLMs (Large Language Models) actuais.
Usando como exemplo, a Plani.AI, uma plataforma para gerar estratégias de negócio que estou a construir com a minha equipa, precisa de aceder aos melhores recursos de uma AI para entregar valor aos clientes o que quer dizer que precisamos de subscrever um serviço para ter acesso aos melhores recursos desta tecnologia. Assim sendo, quem não consegue subscrever esse mesmo serviço não terá acesso aos modelos mais avançados e ficará em desvantagem.
Imaginemos que teríamos de pagar por cada vez que acedíamos a um site começado por WWW. Iria causar uma divisão social onde os menos capacitados financeiramente seriam desfavorecidos. Se hoje o acesso à Internet é gratuito foi porque muitas entidades colaboraram com essa visão, foi porque um dos pais da Internet, Tim Berners-Lee, de alguma forma, garantiu que o acesso era aberto a todos.
Seria agora de esperar que com esta nova tecnologia também houvesse essa mesma colaboração a nível global. Para que uma AI descentralizada fosse distribuída de forma justa evitando a dita divisão social onde todos podiam usufruir de igual forma para as necessidades gerais de cada um. Mais e melhores produtos/serviços podiam emergir. Por isso, gostaria de implementar ou ver implementada esta ideia com a consciência de que carece de um enorme sentido de colaboração devido aos custos das infraestruturas que são elevadíssimos, à semelhança da própria Internet.
(…) atrair investimento não é um “achievement”, mas sim uma etapa necessária para subir mais um degrau na escada do sucesso de um negócio tech”.
Que argumentos não devem faltar numa start-up para atrair investimento?
Atrair investimento não é muito diferente de atrair clientes e por isso, ter competências em vendas pode ser um factor determinante para atrair investidores interessados. Existem investidores para diferentes estágios de uma start-up e tendencialmente será mais fácil atrair um investidor com um projeto validado. A validação é ter vendas, ou em hipótese, comprovar que o público alvo está a usar o produto ou serviço.
Cada vez menos investidores investem em pitch decks ou apresentações de negócio. A validação é muito importante e facilita todo o processo. Em seguida, com a validação atingida começa a “operação de charme”, lembrando que atrair investimento é um jogo de números. Ouvir vários “nãos” até ter um “sim” faz parte do “jogo” e é essa rejeição que ajuda não só o refinar o pitch, mas também o produto. Uma boa dose de resiliência e uma equipa coesa com competências que se complementam e úteis ao projeto também abona a favor da captação deste recurso.
Lembrando que atrair investimento não é um “achievement”, mas sim uma etapa necessária para subir mais um degrau na escada do sucesso de um negócio tech. Atrair investimento também é contrair dívida e por isso ter um plano financeiro lógico com atributos que se aproximam ao máximo da possibilidade de gerar lucro para um investidor podem aumentar as hipóteses de garantir fundos.
Erros que as start-ups nunca devem cometer?
As start-ups devem religiosamente evitar uma abordagem de “Fake it till you make it” levado ao extremo. Acredito que esta expressão pode causar alguma confusão nos empreendedores perante aquilo a que realmente se destina. É muito comum para as start-ups estarem em constantes experimentos, com protótipos algo disfuncionais ou produtos mínimos que ainda não são tão viáveis, mas que cumprem parte do objetivo.
Um produto tem uma visão por trás, tem uma ambição a ser alcançada e muitas vezes é necessário apresentar simulações para ser possível transmitir essa mesma visão. Porém um empreendedor não se pode esquecer que precisa de ter as capacidade in house para atingir essa visão. Os argumentos têm que ser reais. Tem de saber quais são os instrumentos que o levam a alcançar essa visão e o plano certo para lá chegar. Eu diria que aqui o plano é fundamental.
As start-ups e os seus empreendedores não deveriam assumir realidades que não sabem ser possível (tecnologicamente) de serem alcançadas. Sei bem que existem processos que demoram, uma feature de um dispositivo que estamos à espera de ser lançado e que é fundamental para o nossos produto, mas que atrasa tudo… Faz parte. Contudo, que exista o conhecimento empírico que é possível ser alcançado. Não ter esse conhecimento é apenas uma crença ilusória e pode ditar surpresas desagradáveis. As vezes a linha entre estar a mentir ou ser demasiado otimista pode ser muito ténue.