Opinião

Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay!

Susana Duro, Senior Marketing Manager na Coca-Cola Europacific Partners

Quem não ouviu já a expressão “Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay.” É muito popular em países de língua espanhola e não só. Transmite a ideia de que, embora a pessoa não acredite em algo sobrenatural, reconhece que pode haver coisas inexplicáveis.

O que achei curioso e que me levou a escrever este artigo foi o facto de ter percebido que cada vez mais pessoas procuram respostas em fontes mais esotéricas, o que reflete uma constante na humanidade: a necessidade de controlo sobre o incerto e o desconhecido. No entanto, poucos são os que admitem esta procura porque receiam ser ridicularizados. Muitas pessoas procuram ajuda mais espiritual para os seus desafios pessoais, mas também há os que procuram ajuda para garantir o sucesso dos seus negócios.

Na antiguidade, a influência da espiritualidade e do esoterismo esteve profundamente entrelaçada com o poder e a tomada de decisões no mundo político e económico. Governantes, reis e imperadores frequentemente recorriam a conselheiros espirituais, videntes, astrólogos, e sacerdotes para obter orientação divina ou prever o futuro, acreditando que o sucesso das suas campanhas e reinos dependia de forças superiores e ocultas. Esses líderes não separavam o poder temporal das crenças espirituais, confiando que essas práticas poderiam revelar o destino ou trazer proteção.

Na civilização egípcia, faraós como Ramsés II eram orientados por sacerdotes e magos, que realizavam rituais para apaziguar os deuses e garantir a ordem divina, conhecida como maat. A construção de monumentos e decisões políticas estavam muitas vezes enraizadas nas previsões astrológicas e nas práticas espirituais. Os egípcios acreditavam que o equilíbrio entre o mundo dos vivos e dos mortos, entre o caos e a ordem, estava nas mãos dos seus líderes e conselheiros espirituais, que mantinham um contacto direto com as divindades.

Na Roma Antiga, os imperadores, senadores e generais consultavam augures e oráculos antes de tomar decisões militares e políticas. A leitura dos sinais dos pássaros ou das entranhas dos animais sacrificados era uma prática comum para determinar se um empreendimento tinha a aprovação dos deuses.

Na China antiga, os imperadores eram guiados por astrólogos e praticantes de geomancia (feng shui), que acreditavam que o alinhamento correto das energias e dos astros era essencial para o sucesso e a prosperidade. Eles consultavam adivinhos para interpretar os eventos cósmicos e decidir sobre guerras, construções e cerimónias.

Um dos exemplos mais emblemáticos desta relação foi o dos druidas na cultura celta. Os druidas eram figuras espirituais e líderes religiosos que desempenhavam papéis fundamentais não apenas nas práticas espirituais, mas também nas decisões políticas e militares dos celtas. Os reis celtas consultavam os druidas antes de iniciar batalhas ou empreender mudanças significativas, acreditando que eles tinham acesso ao conhecimento dos deuses e à sabedoria esotérica que poderia garantir o sucesso das suas campanhas.

Nas últimas décadas, temos assistido a um aumento da procura de práticas que integrem espiritualidade e bem-estar no local de trabalho, incluindo meditação, mindfulness, e consultas a líderes espirituais. A espiritualidade e o esoterismo têm desempenhado um papel crescente nas decisões empresariais de alguns dos maiores líderes do mundo dos negócios. Temos ouvido notícias de grandes gestores empresariais que recorrem a gurus espirituais para obter orientação sobre decisões estratégicas ou pessoais. Estas consultas podem envolver astrologia, numerologia, práticas de xamanismo ou simplesmente uma filosofia de vida espiritual.

Steve Jobs, cofundador da Apple, é um dos exemplos mais conhecidos. Ele tinha um interesse profundo por filosofias espirituais e práticas esotéricas, especialmente o budismo zen. Jobs fez várias viagens à Índia na juventude em busca de iluminação espiritual, e manteve uma relação próxima com diversos mestres espirituais. Ele era conhecido por meditar regularmente e atribuir à sua prática espiritual a clareza de pensamento e a intuição que o ajudaram a tomar decisões cruciais nos negócios. Embora Jobs não tenha consultado diretamente “gurus” em todas as decisões empresariais, a sua abordagem à vida e aos negócios foi fortemente influenciada por essas práticas espirituais.

Marc Benioff, CEO e fundador da Salesforce, uma das maiores empresas de software do mundo, é um grande defensor da espiritualidade no local de trabalho. Benioff recorre regularmente a práticas espirituais, incluindo meditação e mindfulness, para orientar as suas decisões. Ele também é conhecido por ter viajado à Índia, onde se conectou com vários gurus espirituais, como o famoso mestre Sai Baba, para buscar orientação. Benioff acredita que a espiritualidade e a compaixão devem ser integradas ao mundo dos negócios e tem implementado essas ideias na cultura da Salesforce.

Arianna Huffington, fundadora do Huffington Post e CEO da Thrive Global, é uma defensora vocal de práticas espirituais e holísticas para o bem-estar pessoal e profissional. Após sofrer uma crise de esgotamento físico, ela passou a adotar práticas de meditação, mindfulness e consulta a gurus espirituais para equilibrar a sua vida e melhorar a gestão dos negócios.

Oprah Winfrey, empresária e ícone da televisão, é uma figura que frequentemente recorre a conselheiros espirituais para orientar a sua vida e decisões profissionais. Oprah tem uma longa história de consulta a líderes espirituais. Ela é uma promotora de práticas como meditação e consciência espiritual e acredita que as decisões devem ser guiadas por uma conexão mais profunda com o propósito e a intuição.

Rupert Murdoch, magnata dos media, também demonstrou interesse no esoterismo e na espiritualidade ao longo de sua vida. Ele é conhecido por consultar astrólogos e outros conselheiros espirituais para o ajudarem em decisões importantes, tanto pessoais como profissionais. Embora Murdoch mantenha uma postura mais discreta sobre esses conselhos espirituais, relatos indicam que a influência de guias espirituais e práticas astrológicas já desempenhou um papel nas suas escolhas.

No mundo acelerado dos negócios, a intuição muitas vezes serve como um fator crucial, embora subestimado, para o sucesso. Enquanto os dados e a lógica fornecem uma base, muitos dos líderes mais bem-sucedidos do mundo confiam nos seus instintos para tomar decisões importantes.

A visão de Elon Musk para a SpaceX nasceu da sua profunda crença de que a humanidade se deve  tornar uma espécie multiplanetária. Embora muitos tenham inicialmente considerado essa ambição excessiva, a convicção intuitiva de Musk em reduzir os custos das viagens espaciais impulsionou a sua perseverança. Essa crença resultou no desenvolvimento do primeiro sistema de foguetes reutilizáveis da SpaceX, uma inovação que revolucionou o setor ao reduzir drasticamente os custos de exploração. Com sua visão inabalável, Musk abriu novas possibilidades para a exploração espacial comercial e o avanço da humanidade rumo ao espaço profundo.

A intuição de Jack Ma sobre o potencial da internet na China foi outro exemplo de visão que, no início, enfrentou ceticismo generalizado. Muitos investidores e especialistas duvidaram da viabilidade do comércio eletrónico num país onde o retalho físico era a preferência dominante. No entanto, Ma confiou nos seus instintos e continuou com o projeto do Alibaba. A sua compreensão intuitiva das necessidades dos consumidores chineses ajudou a empresa a superar as primeiras dificuldades, transformando o Alibaba numa potência global do comércio eletrónico.

A busca por algo além do visível e do racional é uma necessidade profundamente enraizada na humanidade. Em diferentes momentos da nossa vida, seja em decisões pessoais ou profissionais, somos confrontados com desafios que nos levam a procurar uma força superior, algo que inspire fé e ofereça direção. Essa fé, seja em algo espiritual, esotérico ou na própria intuição, age como um pilar que traz esperança, coragem e clareza em tempos de incerteza.

No ambiente profissional, grandes líderes, como Steve Jobs, Marc Benioff e Oprah Winfrey, exemplificam como a conexão com um propósito mais profundo não é apenas uma busca pessoal, mas uma ferramenta estratégica que permite enfrentar inovações e desafios de forma intuitiva e confiante. A intuição e a espiritualidade não se opõem à lógica; pelo contrário, elas complementam-se, preenchendo as lacunas que os dados e as previsões não conseguem cobrir.

Assim, seja qual for a nossa crença, é importante reconhecer que ela pode ser uma fonte de empoderamento e de propósito, ajudando-nos a enfrentar o desconhecido com coragem e determinação. Afinal, acreditar em algo maior do que nós mesmos é também acreditar no nosso potencial e na nossa capacidade de construir um futuro mais significativo.


Susana Duro tem mais de 20 anos de experiência no desenvolvimento e implementação de estratégias de marketing para marcas líderes de mercado e um sólido percurso profissional construído em empresas nacionais e multinacionais de referência dentro do mercado de FMCG.

É licenciada em Marketing e Publicidade pelo IADE, pós-graduada em Retail Management e em Direção Comercial no Indeg/Iscte e mestre em Marketing pela mesma instituição. Iniciou a sua carreira de marketing na Henkel Ibérica como gestora de produto, passando depois para brand manager na Dan Cake. Em 2004 entrou para a Nestlé onde esteve durante 11 anos. Aqui desempenhou a função de brand manager da categoria de Culinários, de trade marketing manager na categoria de chocolates e de head of trade marketing na categoria de Cereais de pequeno-almoço. Em 2017 entrou para a Coca Cola Europacific Partners como responsável pela equipa de Customer Development do Canal Alimentar. Em 2022 foi convidada para assumir a função de National Account manager ficando com a responsabilidade de várias contas no canal Horeca Organizado. É também professora na pós-graduação em Gestão de Vendas do INDEG_ISCTE, onde leciona a disciplina de Comportamento do Consumidor.

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