Opinião

Viajar para liderar: o mundo como escola

Alberto Jorge Ferreira, fundador da F7 Consulting

Nesta fase em que me preparo para uma nova mudança de país no Médio Oriente, apetece-me escrever sobre viagens. Não apenas sobre deslocações físicas, mas sobre o que verdadeiramente significam: atravessar fronteiras, conhecer o desconhecido e, sobretudo, aprender com a diferença.

Viajar é uma das formas mais poderosas de aprendizagem que existem. Conhecer novas culturas, modos de vida e formas de comunicar não é apenas um privilégio — é um exercício profundo de empatia, adaptação e humildade. Num tempo em que a liderança se mede pela capacidade de compreender o outro, o mundo torna-se a melhor escola e o mais exigente dos Mestres.

Malcolm Gladwell escreveu, em Outliers, que “o sucesso é, em larga medida, uma questão de contexto”. Nenhum talento floresce no vazio — cresce no encontro com realidades diferentes, nas fricções e descobertas que nos obrigam a repensar o que julgávamos saber. É precisamente isso que viajar proporciona: a capacidade de ver o mundo com outros olhos e, nesse processo, de nos vermos também de forma diferente. Cada viagem é um espelho que reflete tanto as semelhanças como as diferenças, e cada experiência é uma lição sobre a complexidade humana.

Contudo, há um risco subtil nas generalizações. É fácil tomarmos as partes pelo todo — acreditar que uma região, por partilhar traços culturais ou linguísticos, é homogénea. Mas isso raramente acontece. Os países que compõem uma mesma área geográfica são, na sua maioria, profundamente distintos.
Os países nórdicos, por exemplo, partilham um ideal de igualdade, mas cada um interpreta e vive essa igualdade de forma única, refletindo tradições, histórias e prioridades sociais diferentes.

O mesmo se passa no Médio Oriente, onde a língua e a religião podem criar pontes de entendimento, mas as realidades políticas, económicas e sociais produzem contrastes significativos entre Estados vizinhos. Na Ásia, o Japão e a Coreia do Sul revelam visões de disciplina e tecnologia muito distintas da Índia ou do Sudeste Asiático. E em África, continente de mil rostos, as diferenças entre o norte e o sul, entre o litoral e o interior, entre grandes metrópoles e pequenas comunidades, são vastas e reveladoras, oferecendo lições de resiliência e criatividade em múltiplas dimensões.

As minhas viagens pelo Japão, pelo Médio Oriente, pelos países nórdicos, pela América Latina e por várias regiões de África foram muito mais do que deslocações profissionais — foram experiências transformadoras e intensamente humanas.

No Japão, aprendi o valor do silêncio e do detalhe. A paciência e a disciplina no gesto mais simples — um cumprimento, uma reunião, um chá — ensinam mais sobre liderança do que muitos livros, revelando a importância de cada ato e de cada atenção.

No Médio Oriente, percebi que os negócios são, antes de tudo, relações humanas. A confiança é o verdadeiro capital — e conquista-se com humildade, respeito e presença constante.

Nos países nórdicos, encontrei uma cultura de igualdade que desafia hierarquias e valoriza a transparência acima da autoridade. Aprendi a importância de ouvir antes de decidir, de respeitar o espaço de cada pessoa e de criar ambientes em que todos possam contribuir de forma genuína.

Na América Latina, o improviso é uma arte e a emoção, uma força motriz. Descobri que a espontaneidade, o calor humano e a generosidade são combustíveis de criatividade, de cooperação e de inovação autêntica.

Em África, encontrei resiliência e diversidade em cada conversa, em cada gesto. Trabalhar em contextos de recursos limitados, sejam eles tecnológicos, industriais ou financeiros, embora de energia e talento abundantes, ensinou-me a importância de escutar verdadeiramente e de valorizar as pequenas grandes iniciativas que fazem a diferença.

Cada país acrescentou algo à minha forma de estar e de liderar. Viajar tornou-me mais atento às nuances, mais sensível às diferenças, mais consciente da importância da pausa, da reflexão e da observação. Com o tempo, percebi que a liderança global não se constrói apenas em reuniões formais ou sessões de formação — constrói-se nas ruas, nas conversas informais, nos momentos de silêncio observacional, e na capacidade de interpretar o que não é dito.

Susan Cain escreveu, em Quiet, que “a sensibilidade é uma forma de inteligência”. E é isso que o mundo ensina a quem se permite conhecê-lo: compreender o outro é, em última instância, compreender melhor a si próprio. Viajar é, no fundo, uma prática contínua de liderança — porque liderar é também aprender sem parar, adaptar-se constantemente e reconhecer que nunca se sabe tudo.

O mundo muda-nos. E é nesse movimento — entre culturas, línguas, modos de vida e perspectivas — que a verdadeira liderança se forma: aquela que une competência e empatia, ação e escuta, ambição e respeito, visão estratégica e humildade prática.

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Alberto Jorge Ferreira

Alberto Jorge Ferreira

Alberto Jorge Ferreira é um executivo com mais de 30 anos de experiência em gestão estratégica, desenvolvimento de negócios e transformação empresarial. Ao longo da sua carreira, tem liderado operações em países da Europa, Médio Oriente, Ásia, América Latina e África, com experiência em setores como Tecnologia, Telecomunicações, Energia, Águas, Cidades Inteligentes, Defesa, e Gestão de Infraestruturas. Atualmente, é fundador e parceiro da F7 Consulting, uma boutique de consultoria que oferece serviços especializados em transformação empresarial, eficiência operacional e gestão... Ler Mais..

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