Opinião

Um Portugal criativo com impacto global

Carlos Sezões, coordenador da Plataforma Portugal Agora

Quanto vale a criatividade e inovação de um País? Direi que vale muito. Cada vez mais. E, nesta nova era cada vez mais tecnológica e digital, pode ser um factor diferenciador de qualquer estado-nação no século XXI.

As chamadas indústrias culturais e criativas englobam múltiplas dimensões e atividades – desde as artes performativas, como teatro, dança, música, às artes plásticas, como pintura ou escultura; desde media e produção de conteúdos, do entretenimento e eventos ao design; do artesanato, tradicional e manual, ao digital, sofisticado, tecnológico e cada vez mais imersivo. Enfim, tudo o que acrescente valor, inovação e emoção à realidade social. Num report recente da Deloitte, The Future of the Creative Economy, com base na experiência e tendências de nove das maiores economias da Europa e da Ásia-Pacífico, estima-se que a economia criativa possa crescer 40% até 2030, criando mais de oito milhões de empregos adicionais nessas geografias.

Infelizmente, esta dimensão tem passado ao lado das preocupações dos poderes (políticos e outros) nacionais. Para muitos, as atividades culturais e artísticas têm desempenhado um papel meramente estético, decorativo e lúdico – acima de tudo, preservar as tradições e entreter. Algo visível nos fraquíssimos orçamentos da cultura – o orçamento do estado para 2023 indicava uns meros 0,43% da despesa total consolidada da administração central. Ou na dimensão ainda incipiente do mecenato cultural, efetuado por raras empresas.

Para começar: que papel e que estratégia para a cultura e para as indústrias criativas? A Cultura é, para mim, uma dimensão estratégica de qualquer sociedade. Deve ser entendida como catalisadora da criatividade, como motor do desenvolvimento pessoal, do espírito crítico e da inovação. Deve ter uma relação de simbiose com a educação e a formação e, através da partilha de conhecimento, promover uma sociedade mais participativa e exigente, com sentido crítico.

Este é o papel da Cultura nas sociedades verdadeiramente desenvolvidas – por maioria de razão num país com uma identidade cultural forte, como Portugal. E, factor não negligenciável, deverá ser uma realidade que crie empregos e riqueza nas comunidades que nela apostarem. Tal pressupõe, pois, ter uma Cultura e um acesso à criação artística não apenas de elites, mas que conte com o entusiasmo e participação de toda a Comunidade – com criação e atração de novos públicos. Com valor económico e impacto alargado em áreas como a dinamização da vida urbana ou de pequenas comunidades rurais. Como valor acrescentado em várias áreas de economia, onde se cruza criatividade e design – visível já hoje em Portugal em setores como o mobiliário, o têxtil, o vestuário, o calçado, os acessórios, utensílios para o lar ou a joalharia.

Se queremos alavancar a criatividade e as competências criativas, devemos começar por incentivar a fruição cultural – com envolvimento de escolas, associações, fundações, empresas e outros agentes vivos das sociedades. A criação de oferta educativa-criativa deve ser dinamizada – com módulos que estimulem a criatividade a partir do ensino básico. Parcerias entre o setor educativo e empresarial devem ser incentivadas. E o mecenato cultural por parte de empresas e outras instituições deve ser multiplicado (e cada vez mais incentivado a nível fiscal).

Por fim, há que atrair talento. A emergência da criatividade com “base digital” – ao nível de animação 3D, videojogos, realidade aumentada e virtual e a embrionária construção de metaversos – vai multiplicar e escalar trabalho e empregos tecnológicos, que podem ser exercidos que qualquer lado do mundo. Como será fácil concluir, as geografias com bons níveis de acolhimento, qualidade de vida e que construam ecossistemas criativos, estarão em posição de vantagem.

Em suma, estou ciente que estas áreas da economia ainda não têm o “share of voice” de outras tradicionais, como a agricultura, o turismo ou a indústria. Mas devemos começar a olhar para elas com atenção – orgulhando-nos e pensando como multiplicar casos de sucesso no mundo, como as obras de VHILS ou de Joana Vasconcelos, o consagrado design do calçado made in Portugal, os prémios recentes de ateliers portugueses de arquitetura ou o evento Trojan Horse was a Unicorn (referência global no entretenimento digital). E provocando a inovação em setores mais tradicionais, de forma simbiótica. Sim, podemos construir um Portugal mais criativo com impacto global – que gere trabalho, talento e riqueza.

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Carlos Sezões

Carlos Sezões

Carlos Sezões é atualmente Managing Partner da Darefy – Leadership & Change Builders, startup focada na transformação organizacional/ cultural e no desenvolvimento do capital de liderança das empresas. Foi durante 10 anos Partner em Portugal da Stanton Chase, uma das 10 maiores multinacionais de Executive Search. Começou a sua carreira no Banco BPI em 1999. Assumiu depois, em 2001, funções de Account Manager do portal de e-recruitment e gestão de carreiras www.expressoemprego.pt (Grupo Impresa). Entrou em 2004 na área da... Ler Mais..

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