Entrevista/ “Temos refugiados a aprender português e a dar cursos de árabe”

Hugo Menino Aguiar, cofundador e CEO do SPEAK

Conheça o SPEAK, uma nova plataforma que pretende introduzir mais facilmente emigrantes na sociedade, ensinando-lhes português e dando-lhes também a possibilidade de dar a conhecer a sua própria cultura.

Nascido em Leiria, o SPEAK é uma plataforma que pretende dar a conhecer novas línguas e culturas através dos chamados “buddies” que, neste momento, ensinam dez idiomas diferentes às pessoas inseridas no programa.

Colmatando a barreira linguística, compreendendo as verdadeiras dificuldades dos emigrantes de interagirem com os locais e diminuindo a exclusão social destes indivíduos, no SPEAK os recém-chegados a Portugal são a agentes de mudança e parte da solução numa sociedade cada vez mais multicultural.

Como é que nasceu o SPEAK?
Percebemos que Leiria tinha vários migrantes, mas que não nos cruzávamos com eles no dia a dia. Além disso, tínhamos também a experiência de estar no estrangeiro e sentirmos dificuldade em nos integrarmos por não falarmos a língua e não termos oportunidades de convívio com os residentes locais.

Perante o desafio de viver num país diferente do nosso, percebemos em vários eventos, que quando um grupo de pessoas de nacionalidades diferentes se encontra pela primeira vez, é comum a curiosidade de aprender alguma coisa sobre a língua ou países dos outros e a vontade de ensinar alguma coisa sobre a sua língua ou cultura. Tudo isto aliado à curiosidade sobre o mundo, gostarmos de viajar, de línguas, e de diversidade levou-nos até à ideia do SPEAK. O SPEAK pretende resolver o problema da exclusão social de migrantes, abordando os principais desafios que as pessoas encontram quando se mudam para uma nova cidade, tais como não falar a língua local, não conhecer pessoas, ser alvo de racismo e xenofobia e não ter uma rede a quem recorrer.

Assim, o SPEAK facilita a aquisição de ferramentas que permitem ultrapassar a barreira linguística e cria oportunidades de interação entre pessoas de diferentes culturas. Fazendo-o através de um programa de partilha de conhecimentos linguísticos e culturais entre migrantes e pessoas locais, o SPEAK oferece uma estrutura flexível e descontraída de que junta o desenvolvimento de competências à descoberta da interculturalidade.

Paralelamente aos cursos, os participantes dinamizam diversos eventos culturais, criando espaços de contacto informal que potenciam a criação de laços de amizade e de redes de apoio informais.

Desta forma, o SPEAK promove a compreensão mútua, contribuindo para a construção do sentimento de pertença dos migrantes à comunidade de acolhimento, facilitando a sua interação numa língua não materna e dando-lhes acesso a uma rede social. Além disso, dissemina os valores de aceitação e valorização da diversidade cultural na sociedade, fortalecendo o capital social do país.

O SPEAK mede o seu sucesso através da forma como consegue responder a estes desafios. O impacto gerado pelo projeto mede-se após a participação nos cursos de 12 semanas, em que:

  • existe um aumento em 15% no sentimento de pertença na comunidade local;
  • existe um decréscimo de 30% na sensação da língua como uma barreira;
  • existe um aumento de 40% na sensação que a comunidade valoriza a sua cultura.

Qual é o modelo de negócio? Como é que geram receitas?
O SPEAK procura promover a democratização da aprendizagem de línguas, por isso cobramos apenas uma fee simbólica de 25€ por um curso de 18 horas ao longo de três meses.

Quantas línguas é que estão a ser lecionadas pelos vossos “professores”?
O número de línguas vai variando consoante os pedidos de cada cidade. Neste momento, temos as inscrições abertas para cerca de 10 idiomas.

Já estão representados em nove cidades, no entanto, só duas delas é que são fora de Portugal, em Berlim e Torino. Estão a pensar expandir-se para mais algum país a curto, médio prazo?
Sim, o SPEAK tem um plano de crescimento a 5 anos. Pretendemos levar esta solução para as cidades onde é maior a necessidade de integração social de migrantes, que infelizmente tem vindo a aumentar com a crise de 2015. Pretendemos em 2018 escalar para 11 cidades europeias e em 5 anos estarmos nas principais cidades da Europa – cerca de 60.

Quem é o vosso principal grupo-alvo? Para onde é que direcionam mais a vossa atenção quando querem angariar clientes?
A beleza do SPEAK é que é para toda e qualquer pessoa que goste, precise ou queira aprender uma nova língua e/ ou partilhar a sua. Assim, acabamos por ter refugiados a aprender português e a dar cursos de Árabe, Portugueses que vivem e trabalham cá a aprender diversos idiomas, estudantes de erasmus, etc… No SPEAK temos igual número de estrangeiros e de pessoas locais, e esta diversidade é fundamental para o projeto, pois só assim é possível a verdadeira integração social.

O que é que oferecem aos vossos participantes? E aos “professores”?
O SPEAK é um projeto para qualquer pessoa, sejam locais, migrantes, refugiados, estudantes estrangeiros e locais. Cerca de 50% dos participantes do SPEAK são Portugueses e os outros 50% são estrangeiros. O SPEAK cria, através dos cursos e dos eventos organizados pela comunidade, a possibilidade de os participantes não só quebrarem a barreira linguística, como criarem redes de apoio informais que são essenciais na resolução de diversos problemas, desde os mais simples – como descobrir os melhores locais para comprar comida de qualidade a preços acessíveis – até problemas mais complexos – como aceder ao sistema nacional de saúde e procurar emprego.

O projeto tem sido igualmente enriquecedor para os membros da comunidade local, que têm tido a oportunidade de contactar com culturas de todo o mundo e de aprender línguas que vão desde o inglês e francês, ao árabe e mandarim.

O ecossistema português de start-ups está na moda e há uma quantidade significativa de empreendedores internacionais a mudarem-se para o país. Há algum empreendedor de outra nacionalidade envolvido no SPEAK?
A comunidade do SPEAK é bastante diversa, tem desde pessoas que chegaram a Portugal para estudar, para montar negócios e tem também bastantes pessoas locais. Neste momento, estamos a querer testar o modelo de escala de Franchising Social, em que uma pessoa com dinamismo e paixão pela área de integração social e pelo projeto pode, através do pagamento de uma fee levar o projeto para a sua cidade. Neste sentido temos tido vários participantes do SPEAK que se mostraram interessados em apostar no projeto.

 

*Start-up registada no Viable Report

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