Opinião
Sem saber ler nem escrever!
Na década de 80, “sem saber ler nem escrever”, descobri o mundo da computação. Eu acreditava que os computadores podiam fazer tudo, como um Deus electrónico, mas quando pedi ao TIMEX Sinclair 1000 para desenhar o planeta Saturno — sou fascinado por este planeta, talvez por ter anéis —, vislumbro apenas uma mensagem estranha na televisão a preto e branco: 0/0
Fiquei a olhar para aquele 0/0 por algum tempo no ecrã branco, como que à espera de que, de forma mágica, os anéis de Saturno se formassem.
Não surgiu nada! Esperei um pouco mais e nada. Eu não queria interromper o “Deus da Máquina” na sua criação; era um Planeta que pedia, não era coisa pouca!
Mas, nada! Percebi então que, nós humanos, tínhamos um papel muito significativo na acção das máquinas.
Quando eu era miúdo, era um sonhador — morava num tempo que não era o meu. Vivia com os meus avós maternos, com a minha mãe — viúva desde os meus três anos — e o meu irmão, numa casa velhinha na aldeia de Mosteiro de Fráguas. O meu irmão, mais velho do que eu apenas 13 meses, companheiro das minhas aventuras, sonhava com o ‘hardware’, eu com o ‘software’, embora não soubéssemos bem o que isso era.
Apesar de não sabermos o que eram essas coisas, a nossa intuição dizia-nos que era esse o caminho.
Os poucos manuais técnicos e aparelhos electrónicos que o nosso pai nos deixou, foram a base de tudo; não foi muita coisa, mas uma semente também não parece ser muita coisa antes de ser lançada à terra!
O meu irmão dissecava os aparelhos electrónicos, eu devorava os livros. E eis que chega o momento em que o meu irmão (um puto, ainda) monta um ‘kit’ que havíamos mandado vir pelo correio da versão da TIMEX do microcomputador ZX81 para Portugal, o TIMEX Sinclair 1000 que mencionei acima. Eram apenas 2KB de memória RAM a correrem num “super” microprocessador de 8 bits (Z80) a uma frequência de 3,25 MHz.
O interior da máquina, a que podemos chamar ‘Alma Digital’, fascinava-me. E foi com esta pequena grande máquina que comecei a explorar a Linguagem Assembler, vulgo Código de Máquina. Ao fazê-lo, sentia-me mais próximo desse mundo invisível onde tudo parecia ser possível.
No universo ETER9 o Jogo da Vida, ou apenas Vida (1970) — autómato celular — de John Horton Conway, é uma inspiração. Além da duplicação das pessoas (e empresas) para o mundo digital, a vida que nasce, vive e morre no éter da existência artificial, segue as mesmas regras do autómato celular.
Regra do Nascimento:
— Se uma célula tiver três vizinhos em qualquer direcção, nasce.
Regra da Sobrevivência:
— Se uma célula tiver dois ou três vizinhos em qualquer direcção, continua a viver.
Regra da Morte:
— Se uma célula não tiver nenhum ou apenas um vizinho, morre por isolamento. Se tiver quatro ou mais vizinhos, morre por sobrepopulação.
A própria tecnologia está cada vez mais a tornar-se parte de nós. E, quer queiramos, quer não, já estamos todos em processo de fusão com as máquinas… e ainda nem sequer nos apercebemos disso! Esta fusão é invisível e silenciosa e acontece de uma forma muito natural. Muitos teimam em separar a tecnologia inteligente das pessoas, como se existissem dois lados, duas equipas que se devem confrontar. Quase como se acontecesse um conflito entre os dois lados.
Eu não vejo assim. Prefiro ver homem e máquina unidos em prol de um objectivo só e comum: coexistir em sintonia absoluta!
Acredito que, no futuro, não existirá uma distinção clara entre humanos e máquinas, todos os aspectos da nossa vida serão transformados! A evolução tecnológica é exponencial, a tecnologia cada vez mais se alimenta de si própria! Diria mais: a tecnologia está cada vez mais a tornar-se inteligente… artificialmente inteligente!
E que tema este! Tão sensível e, por vezes, controverso!
Confesso: prefiro ver a Inteligência Artificial como um melhoramento a nós próprios, quando aliada ao ser humano propriamente dito, com aplicações cada vez mais vastas.
Alguns estudos revelam que a Inteligência Artificial pode duplicar o crescimento económico anual em 2035. Claro que isto levará a muitas mudanças em várias áreas. Prevêem-se, por exemplo, alterações à natureza dos postos de trabalho.
Mas, da mesma forma que não imaginamos voltar a ver profissões como vendedor de jornais de rua, também no futuro algumas profissões que vemos hoje cairão para dar lugar a outras. É natural que assim seja! Prevê-se que o impacto das tecnologias de Inteligência Artificial nos negócios aumente a produtividade laboral até 40%! Isto irá alterar a forma como todos encaramos o mundo!
E se, por um lado, a Inteligência Artificial está cada vez mais presente em sistemas digitais, este conceito tem levado ao desenvolvimento do ‘Machine Learning’, que se baseia na habilidade dos computadores aprenderem com a informação sem serem programados explicitamente para isso.
No fundo, em vez de ensinar aos computadores tudo o que precisam de saber e como realizar tarefas, cientistas e engenheiros chegaram à conclusão de que é muito mais eficiente codificá-los para “pensarem” como se fossem humanos, ensinando-os a aprender por eles próprios. Estes sistemas de ‘Machine Learning’ levam a Inteligência Artificial a outro nível, através das chamadas redes neuronais ou ‘Deep Learning’, onde o sistema aprende a realizar tarefas com base em quantidades enormes de informação, reajustando-se milhares de vezes até conseguir realizar uma tarefa.
No fundo, pretende-se que a máquina categorize a informação da mesma forma que um cérebro humano o faria.
Nota: Este artigo não obedece, propositadamente, ao Novo Acordo Ortográfico.
Empreendedor, Programador e Analista de Sistemas, Henrique Jorge é o fundador e CEO da ETER9 Corporation, uma rede social que conta com a Inteligência Artificial como elemento central, e que atualmente está em fase BETA.
Desde sempre ligado ao mundo da tecnologia, esteve presente no início da revolução da Internet e ficou conhecido pela introdução da Internet e das tecnologias que lhe estão associadas em Portugal, sendo um dos pioneiros nessa área.
Passando por vários episódios de desconstrução e exploração das linguagens dos computadores, chegou à criação da rede social ETER9, um projeto que tem conhecido projeção internacional, e que ambiciona ser muito mais que uma simples rede social. Através de Inteligência Artificial (IA) pretende construir a ponte entre o digital e o orgânico, permitindo a todos deixar um legado digital ativo no ciberespaço, inclusive pela eternidade. Fora do espaço virtual, é casado, pai de duas filhas, e “devora” livros.