Opinião
Sabe o que é o Caderno das Falhas? Há quem saiba e use todos os dias na empresa… infelizmente.

Confesso que fiquei pasmado quer pelo conceito, mas sobretudo por saber estar ainda a ser prática em várias empresas e de forma tão assertiva. Não sabe o que é? Prepare-se. Infelizmente há quem saiba muito bem, na pele, e com repercussões no salário no final do mês.
O “Caderno das Falhas” é uma prática ainda vigente nalgumas empresas portuguesas. Do que trata? De forma simples: uma folha (literalmente, em papel) afixada na sala dos colaboradores da loja, onde para cada mês existe um espacinho para cada dia do respetivo e onde são registadas as falhas de cada colaborador pela respetiva chefia.
A folha fica afixada na parede, para todos verem – quer o visado, quer todos os colegas. Para além dessa folha “sumário”, há depois uma outra onde é possível escrever mais detalhes e registar comentários em texto livre. Cabe à chefia, portanto, todos os dias identificar as falhas de cada elemento da equipa (sobretudo enfocado nos elementos comerciais) e apontar falhas várias e variadas.
Esta folha detalhe, guardada num caderno, é gerida pela chefia que chama o colaborador e lhe pede (exige) que assine/rubrique cada falha assinalada. Naturalmente, isto não é apenas com o objetivo de registo: no final do mês a repercussão vem no salário, pois consoante o número de falhas, assim serão afetadas as comissões.
Façamos uma pausa…
Há tanto que poderia ser comentado neste caricato modelo (desculpem mas estou a tentar ser eufemístico e comedido no comentário) de incentivos.
Comecemos pelo princípio.
Apontar falhas.
Como se chamar a atenção para os erros motivasse alguém.
E trouxesse ímpeto para melhorar fosse o que fosse por si só.
Em segundo:
tornar as falhas públicas.
Como se exibir os erros em frente de todos, envergonhando o colaborador publicamente no seio da equipa, fosse dissuasor dos erros e motivador de melhoria.
Em terceiro:
o carácter destrutivo e não construtivo.
Meramente apontar as falhas mas não aprofundar e ajudar na correção das mesmas, sendo parte colaborativa ao invés de crítica pura e simples.
E por fim:
o teor económico, onde parece que o objetivo de chamar a atenção para melhoria é totalmente fátuo, antes parecendo uma forma de conseguir minorar o valor das comissões a pagar ao final do mês.
Porque é que isto faz sentido a alguém?
Porque é que faz sentido a gestores de empresas e lojas que procurar melhores resultados vem, não da melhoria de processos pelo feedback e afinação dos mesmos, mas pela crítica interna e penalização?
Porque não há também o caderno dos sucessos?
Porque se acentuam os defeitos ao invés de estimular os sucessos?
Porque não acreditar numa cultura de empenho, de reforço positivo, ao invés do medo e da repressão?
Mês após mês, um caderno de falhas faz aquilo que eficazmente se pretende se é esse o objetivo: desmoralizar, frustrar, enfraquecer, desincentivar.
É como se as redes sociais optassem por retirar o botão de LIKE e colocassem um botão de DISLIKE – seria bonito ver as pessoas em debandada, a deixar de publicar fotos e vídeos e a ir embora encontrar um melhor espaço para estar.
Não deixa de ser frustrante, em pleno séc. XXI, ver ainda empresas sediadas na Revolução Industrial, apostadas em menosprezar o talento e esforço humano das suas equipas e apostadas em gerir pela repressão, ao invés do empoderamento, confiança, responsabilidade e objetivos. Ou inspirado pelo recém-lançado filme baseado num período da Nike e com a citação de Michael Jordan:
“O talento vence jogos, mas só o trabalho em equipe ganha campeonatos