Entrevista/ “Queremos ter impacto global e transformar o modo como se compram produtos tecnológicos”

André Rodrigues Pereira, Country Manager do Back Market Portugal

Depois de um ano no mercado nacional, o Back Market tem um novo Country Manager. André Rodrigues Pereira assumiu o cargo na empresa de dispositivos eletrónicos recondicionados, e, em entrevista ao Link To Leaders, reafirmou o objetivo de querer ter um impacto global e transformar o modo como se compram produtos tecnológicos. E vai continuar a apostar numa estratégia de sensibilização para a mudança de hábitos de consumo.

“O meu objetivo passa por contribuir para a alteração de hábitos dos consumidores portugueses e potenciar a economia circular através da sensibilização para as vantagens da tecnologia recondicionada”, explicou o novo Country Manager da Back Market para Portugal.

André Rodrigues Pereira assumiu cargo com a certeza de querer também “expandir o acesso à tecnologia de uma forma mais económica e sustentável”, até porque, afirma, “como sociedade estamos a consumir e descartar produtos eletrónicos a um ritmo vertiginoso”. Além disso, constata “estamos a ser ativamente incentivados pelos fabricantes a atualizar os nossos aparelhos com mais frequência do que o necessário”.

Perante os números avassaladores de lixo eletrónico, destacados por André Rodrigues Pereira, o responsável do Back Market no mercado nacional apoia, a par do recondicionamento, o direito à reparação. “A indústria precisa de caminhar no sentido de fazer mais reparações e promover menos consumo”, frisou na entrevista ao Link To Leaders.

Revelou ainda que, hoje, o mercado recondicionado não se limita aos smartphones – os computadores e tablets, consolas de jogos, robots domésticos começam a ganhar espaço – e que as mentalidades estão a mudar para se avançar para outra forma de consumir tecnologia.

Ao fim de um ano em Portugal como avalia a evolução da empresa?
O balanço que fazemos é realmente positivo. A adesão dos consumidores portugueses ao Back Market tem crescido e isto ajuda-nos a perceber que podemos mudar a forma como as pessoas adotam hábitos mais sustentáveis no dia adia.

Entramos em Portugal com o mesmo objetivo com que o projeto nasceu: queremos ter impacto global e transformar o modo como se compram produtos tecnológicos. Sabemos que é um longo caminho a percorrer, mas, desde o início do nosso projeto, em novembro de 2014, já construímos uma base de 6.5 milhões de clientes e 1.500 vendedores em todo o mundo.

A criação de um mercado de economia circular em produtos tecnológicos é uma vantagem para todos e um imperativo principal nos dias de hoje. Além de ajudar a reduzir a obsolescência programada, também é fundamental para resolver uma crise crescente de lixo eletrónico que passa despercebida ao público em geral, mas que está a causar graves danos ao meio ambiente.

“(…) o recondicionamento é parte integrante da economia circular e que permite poupar o ambiente, fazendo efetivamente diferença no planeta”.

O perfil do consumidor português enquadra-se no conceito de produtos recondicionados? Como tem sido a adesão?
O consumidor português está cada vez mais disponível para escolher os recondicionados como primeira opção e nós queremos que vejam o Back Market na linha da frente quando fazem esta reflexão. A segunda edição do Barómetro do Oney Bank T concluiu que 94% dos portugueses estão dispostos a alterar os hábitos de consumo diário para proteger o ambiente. Duas das principais razões apontadas para esta mudança são o combate ao desperdício e a sustentabilidade do produto – veja-se que o mesmo relatório diz que os portugueses já veem a tecnologia recondicionada como uma compra a fazer.

Por esta razão, o Back Market vai continuar a apostar numa estratégia de sensibilização para a mudança de hábitos de consumo, mostrando que o recondicionamento é parte integrante da economia circular e que permite poupar o ambiente, fazendo efetivamente diferença no planeta.

Em que mercados internacionais está presente?
Estamos presentes em 16 mercados: França, Bélgica, Espanha, Portugal, Alemanha, Itália, Áustria, Reino Unido, Finlândia, Holanda, Irlanda, Grécia, Eslováquia, Suécia, EUA e Japão. Contamos ainda com seis escritórios e 700 colaboradores, bem como um Laboratório de Inovação em Bordéus que permite garantir a qualidade e funcionalidade dos nossos dispositivos recondicionados.

“As nossas equipas técnicas fazem dezenas de visitas mensais a lojas de recondicionadores (…) para garantir que os vendedores cumprem os padrões de qualidade exigidos”.

Quais as bases de funcionamento da plataforma? Como se processa o encontro entre comprador e fornecedor?
Funcionamos como intermediário entre o consumidor final e os fornecedores e, acima de tudo, como garante final de qualidade de todos os produtos que são vendidos através da plataforma. As nossas equipas técnicas fazem dezenas de visitas mensais a lojas de recondicionadores, assim como encomendas anónimas para garantir que os vendedores cumprem os padrões de qualidade exigidos.

Antes de um parceiro poder vender os seus produtos na plataforma tem de passar por um processo meticuloso de onboarding – e nem todos cumprem os requisitos necessários para o fazerem. Temos, a título de exemplo, um período de “quarentena” que é a fase inicial da sua operação na plataforma na qual os vendedores não podem vender mais de dez produtos por dia. Uma vez admitidos, existe um trabalho de monitorização e orientação para garantirmos que a qualidade do serviço se mantém.

Estamos bastante focados na experiência que o consumidor tem na plataforma: queremos que todo o processo seja o mais fácil e divertido possível, à semelhança do que é comprar um produto novo. Além disso, trabalhámos para educar os clientes sobre o valor e a importância de comprar produtos usados em vez de novos, sendo algo que fazemos de forma consistente na plataforma, em todo o processo de compra e através da nossa estratégia de marketing.

O segmento dos recondicionados é recente em Portugal. Já é uma área de negócio muito concorrencial?
Felizmente a economia circular, especificamente a direcionada a aparelhos tecnológicos, está a aumentar, o que amplia também a concorrência. No entanto, destacamo-nos por sermos o primeiro e maior mercado de dispositivos recondicionados a nível global, e o líder em vários países. Temos 1.500 recondicionadores na plataforma, portanto temos oferta suficiente para corresponder à procura dos consumidores, o que não é o caso dos nossos concorrentes indiretos, que às vezes terão uma oferta mais limitada.

Além disso, o modelo do nosso marketplace permite-nos trazer verdadeiro valor acrescentado aos nossos parceiros e ao setor: no desenvolvimento da logística e dos serviços de reparação, no aprovisionamento de dispositivos e peças, na investigação e desenvolvimento. Além disso, enquanto plataforma, disponibilizamos uma vasta gama de produtos aos clientes, e não apenas smartphones.

“Queremos devolver o poder ao consumidor, com um grande foco na economia circular (…)”.

Nessa ótica, o que distingue a vossa oferta?
Ao contrário de outras plataformas, estamos a oferecer às pessoas mais do que uma forma de comprar aparelhos eletrónicos com desconto. Queremos devolver o poder ao consumidor, com um grande foco na economia circular – o Back Market está constantemente a educar, informar e capacitar os consumidores para agirem com o seu poder de compra e para compreenderem o valor de comprar recondicionados, sem comprometer a qualidade e a preços mais baixos.

Como está a encarar este desafio de Country Manager da Back Market em Portugal?
Desde sempre procurei estar ligado a projetos sustentáveis no meu percurso profissional. Aceitei este desafio consciente do impacto positivo que o Back Market tem já hoje a nível global. Por isso, o meu objetivo passa por contribuir para a alteração de hábitos dos consumidores portugueses e potenciar a economia circular através da sensibilização para as vantagens da tecnologia recondicionada.

Espero conseguir adicionar valor ao que já é feito e levar este projeto ainda mais longe. É um grande compromisso, mas estou muito motivado para reforçar a notoriedade do Back Market em Portugal e dessa forma expandir o acesso à tecnologia de uma forma mais económica e sustentável.

“(…) estamos a ser ativamente incentivados pelos fabricantes a atualizar os nossos aparelhos com mais frequência do que o necessário.

Numa altura em que os gigantes tecnológicos fazem lançamentos constantes de novos produtos, num apelo muitas vezes ao consumo desmedido, como é que o Back Market consegue promover a ideia de maximizar a vida dos equipamentos eletrónicos?
Esta é uma pergunta de extrema relevância para nós. Parece-me que como sociedade estamos a consumir e descartar produtos eletrónicos a um ritmo vertiginoso e estamos a ser ativamente incentivados pelos fabricantes a atualizar os nossos aparelhos com mais frequência do que o necessário.

Antes de mais, é necessária consciencialização por parte das marcas e dos consumidores sobre os impactos das suas escolhas, para que se responda à urgência da alteração dos hábitos de consumo. De forma prática, a aplicação desta consciência ecológica pode ser transcrita no reconhecimento da real “validade” dos produtos tecnológicos, que é maior do que aquela que lhes atribuímos.

Depois, e quando é mesmo preciso trocar de aparelho, devemos olhar as opções que temos no mercado. Soluções como as que apresentamos, como os produtos recondicionados, devem passar a ser a primeira escolha. As opções de green tech precisam de ter maior presença no mercado, para que esta possibilidade seja também mais clara e aliciante, quando existe realmente a necessidade de consumo.

Além disso, e de forma particular no mercado dos recondicionados, é preciso que as pessoas estejam dispostas a experimentar estes produtos para perceberem que eles estão em perfeitas condições de utilização, passam por rigorosos testes para o confirmar e apresentam prazos de devolução e garantia. Como exemplo claro podemos referir que, até à data, reduzimos as taxas globais de defeitos dos produtos da plataforma para menos de 5%. Para referência, a taxa de falhas não oficiais de novos dispositivos ronda os 3% (veja-se o iPhone X e o iPhone 8 Plus, que saíram ambos no final de 2017, e registaram uma taxa de falhas de 3% no primeiro trimestre de 2018).

Como é que as grandes tecnológicas olham para este novo negócio que lhes “rouba” potenciais clientes?
Acredito que a inovação tecnológica nunca deixará de existir. O Back Market surge como solução para quem valoriza mais o consumo comedido e sustentável de tecnologia, e prefere pagar até menos 70% por produtos igualmente funcionais e com qualidade.

Quais os vossos números neste momento? Quantidade de equipamentos vendidos, marcas preferenciais?
Atualmente, os smartphones representam quase 70% das vendas através da nossa plataforma em Portugal. Este é um valor que segue a tendência global de procura da plataforma e mostra-nos uma clara tendência de necessidade de diversificação na indústria de recondicionados. Os produtos mais vendidos em Portugal em 2022, até à data, foram os iPhones 7 e 11 e o Samsung S9.

E já um bom negócio? Qual a vossa faturação no primeiro ano de atividade?
Por cumprimento de políticas internas não comunicamos sobre faturação da empresa.

“Estima-se até que, em 2040, a tecnologia de comunicação seja responsável por 14% das emissões de CO2”.

A economia circular é a solução para cuidar do ambiente ou é apenas mais um negócio?
De uma forma geral, a nível ambiental, as grandes vantagens da aposta na economia circular são a redução de utilização de recursos e a diminuição do descarte de produtos para aterros, que se traduz numa diminuição das emissões de CO2.

Num nível mais específico, mas que serve também para clarificar de que forma isto acontece, olhemos para o mundo do digital. Atualmente, este representa perto de 4% das emissões globais de carbono, a nível global, e a produção de eletrónica é responsável por perto de metade deste valor. Estima-se até que, em 2040, a tecnologia de comunicação seja responsável por 14% das emissões de CO2.

Na outra margem do processo, mas contribuindo fortemente para os valores já apresentados, temos o lixo eletrónico. Em Portugal, existe, em média, um consumo de 220 mil toneladas de novos equipamentos elétricos e eletrónicos ao ano. Segundo a diretiva europeia que sugere a recolha de 65% da média dos equipamentos vendidos, nos últimos três anos, devíamos ter recolhido perto de 130 mil toneladas de lixo eletrónico, mas tal não se verificou.

Além disso, apesar da reciclagem ser importante, não é suficiente, especialmente quando estamos a comprar e a descartar novos aparelhos a um ritmo que não pode ser reciclado adequadamente. O descarte eletrónico é o fluxo de resíduos sólidos em mais rápido crescimento, batendo até o setor da moda.

Os resíduos eletrónicos estão a aumentar em todo o mundo e existe ainda uma estimativa de que 57 mil milhões de quilos em ouro e outras matérias-primas, equivalente ao peso de 250 navios contentores quando carregados ao máximo, encontradas em componentes eletrónicos, são queimadas ou despejadas, segundo o Global E-waste Monitor 2020 das Nações Unidas.

Existem dados que nos mostram claramente o impacto da indústria de recondicionados. De acordo com uma pesquisa da agência francesa ADEME, ao recondicionar um smartphone podemos poupar 79,68kg de CO2 (equivalente a 492km numa viagem de carro); 258kg de matérias-primas (o peso de 12 bicicletas); 68,400L de água (a quantidade recomendada de consumo de água para um adulto durante 103 anos); 175g de lixo eletrónico, equivalente a 20 pares de airpods.

Além disso, mais do que recondicionar, acreditamos que a indústria precisa de caminhar no sentido de fazer mais reparações e promover menos consumo. Apoiamos o direito à reparação, o que significa que os consumidores devem ter pleno acesso à informação, peças sobressalentes e ferramentas necessárias para efetuar reparações, se o desejarem e pensarem que são capazes de o fazer.

“(…) a bem da preservação do planeta, o modelo de economia circular deverá tornar-se a primeira opção e não continuar apenas como uma alternativa, incluindo na tecnologia”.

Quais as tendências que prevê para esta área de atividade?
Começa a verificar-se a existência de uma maior consciência ambiental no consumo, o que deverá vir a crescer. Assim, no futuro, e a bem da preservação do planeta, o modelo de economia circular deverá tornar-se a primeira opção e não continuar apenas como uma alternativa, incluindo na tecnologia. As razões para que os consumidores optem por produtos recondicionados são claras, por isso, acreditamos no desenvolvimento da área.

No mercado de recondicionados, assistimos hoje a uma tendência crescente para a diversificação de produtos. Quando a aventura do Back Market começou em novembro de 2014, os smartphones representavam 90% das vendas, em comparação com menos de 70% atualmente. Estamos a assistir ao aparecimento de outras categorias de produtos que estão a ocupar cada vez mais espaço, em particular computadores e tablets, consolas de jogos, robots domésticos.

Esta diversificação da oferta e da procura é a prova de que o mercado recondicionado não se limita aos smartphones e que as mentalidades estão a mudar para se avançar para outra forma de consumir tecnologia.

Respostas rápidas:
O maior risco: As vezes em que não tomei riscos.
O maior erro: Presumir que se tu não o fizeres alguém o fará por ti.
A maior lição: Em todas as boas histórias é preciso continuar a virar a folha.
A maior conquista: A oportunidade de contribuir para o crescimento de uma empresa com a missão do Back Market em Portugal.

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