Entrevista/ “Qualquer processo de internacionalização é complexo e envolve sempre investimento financeiro e humano”

Christelle Domingos, diretora executiva da InovCluster
Christelle Domingos, Diretora Executiva da InovCluster – Associação do Cluster Agro-Industrial do Centro

“Ao longo da nossa jornada, ajudámos na execução de mais de 50 projetos cofinanciados, que abrangem mais de 54 mercados internacionais, e organizámos mais de 700 eventos, workshops e formações, que contribuíram para a modernização e internacionalização de 944 empresas”, revelou Christelle Domingos, diretora executiva da InovCluster.

Sediada em Castelo Branco, a InovCluster, que tem como objetivo promover a inovação e a competitividade no setor agroindustrial da região Centro, conta atualmente com 147 associados, 112 empresas, 15 associações e cooperativas, 12 instituições de ensino superior e Informação e Tecnologia, e 8 entidades públicas.

Ao Link to Leaders Christelle Domingos, diretora executiva da InovCluster, referiu que até à data reembolsaram “mais de 1 milhão de euros de apoio às empresas relativo a projetos de qualificação e inovação e atingimos o marco de 17 milhões e meio em projetos cofinanciados“.

Neste momento, a Associação do Cluster Agroindustrial do Centro está a organizar, através do programa export.i9, o pavilhão nacional de Portugal na Biofach 2025, que terá lugar de 11 a 14 de fevereiro em Nuremberg e para o qual as empresas interessadas e elegíveis podem obter um financiamento de até 50%.

O que é a InovCluster e qual o objetivo?

A InovCluster é uma associação privada, sem fins lucrativos, criada em 2009, por um grupo de empresários e de relevantes instituições da região Centro, com o claro objetivo de promover a inovação, a competitividade e o desenvolvimento do setor agroindustrial, especialmente nas regiões do Centro de Portugal. Enquanto EEC – Estratégia de Eficiência Coletiva, tem desenvolvido um conjunto de iniciativas que fomentam a emergência da economia de aglomeração. Tem como base a valorização de iniciativas inovadoras e a qualificação ou a modernização de um agregado de empresas, de índole nacional, regional ou local, fomenta o espírito de cooperação, do funcionamento em rede entre as empresas e entre estas e outros atores relevantes para o desenvolvimento das referidas economias de aglomeração, como é o caso das instituições de ensino e investigação, e entidades públicas e privada.

A estratégia do Cluster Agroindustrial da Região Centro, designadamente enquanto território de qualidade agroindustrial, assenta em cinco pilares estratégicos: o território, as fileiras, as infraestruturas e serviços de apoio, o capital humano e a capacitação, investigação, inovação e internacionalização.

Pretendemos, assim, contribuir para que a região se afirme ao nível nacional, ibérico e europeu como um território líder nas fileiras agroindustriais de excelência, suportado na singularidade e na qualidade dos seus agrorecursos, na preservação da biodiversidade e da diversidade paisagística dos seus espaços agrícolas e rurais, e na competitividade dos sistemas produtivos locais e regional.

“Não duvidamos que contribuímos para um setor mais robusto, mais comunicativo e mais preparado para os desafios de um mercado altamente competitivo e global”.

A InovCluster comemorou 15 anos de existência. Que balanço faz e quais os marcos que mais destaca?

O balanço que fazemos é largamente positivo. Não duvidamos que contribuímos para um setor mais robusto, mais comunicativo e mais preparado para os desafios de um mercado altamente competitivo e global. Ao longo da nossa jornada, ajudámos na execução de mais de 50 projetos cofinanciados, que abrangem mais de 54 mercados internacionais, e organizámos mais de 700 eventos, workshops e formações, que contribuíram para a modernização e internacionalização de 944 empresas. Reembolsamos mais de 1 milhão de euros de apoio às empresas relativo a projetos de qualificação e inovação e atingimos o marco de 17 milhões e meio em projetos cofinanciados.

Não posso deixar de salientar ainda a atribuição do Bronze Label que muito nos dignificou e que se revela o ponto de partida para o nosso objetivo maior: o Gold Label que outrora este cluster já beneficiou em 2016. A conquista do Cluster Management Excellence Label GOLD será uma validação do nosso compromisso contínuo com a excelência e a inovação no setor agroalimentar e isso impulsiona-nos a continuar a trabalhar arduamente para promover a colaboração, o desenvolvimento e a competitividade no nosso setor e sempre numa perspetiva de valorização do nosso maior ativo: os nossos associados.

Quais são as vossas áreas de intervenção e que tipo de apoios oferecem aos vossos associados?

A InovCluster tem trabalhado essencialmente em cnico áreas de intervenção para conseguir dar resposta uma resposta efetiva a toda a cadeira de valor do setor. Começamos com a área de Inovação e Desenvolvimento Tecnológico, onde apoiamos a criação de novos produtos e processos através de projetos de investigação e desenvolvimento (I&D) e em colaboração com universidades e centros de pesquisa. Uma segunda área, sobre a qual dedicamos grande parte da nossa intervenção é a Internacionalização, onde prestamos apoio à expansão das empresas para mercados internacionais, através da participação em feiras, missões empresariais e ações promocionais. Já foram realizados mais de 15 projetos de internacionalização, abrangendo 54 mercados​. Também referir a área de Comunicação onde disponibilizamos todo o apoio aos nossos associados para a criação de uma imagem forte que sirva de alavanca para a promoção e visibilidade dos seus produtos, serviços e empresa. Ao nível da área de Empreendedorismo prestamos apoio a empreendedores na transformação das suas ideias em negócio e ao nível do financiamento, que é a quarta área de intervenção, identificamos as soluções adequadas para cada tipo de necessidade dos nossos associados, dentro dos sistemas de incentivo disponíveis. Para último, e de forma propositada, referir a unidade de Cooperação, que no fundo é o que está na base da nossa intervenção e no nosso ADN enquanto cluster. Dedicamo-nos a fortalecer redes de cooperação que conectem as empresas, a academia e demais instituições de forma estratégica para potenciar a inovação e o crescimento do setor.

Temos olhado com muita atenção em duas áreas emergentes, que pese embora tenhamos já um interessante trabalho a este nível e sejam áreas em pleno desenvolvimento no setor, procuramos em sede da nossa nova estratégia para 2030, e a par com um conjunto de parceiros, incidir mais a nossa atuação. Estou a falar na área da sustentabilidade e economia circular para sensibilizarmos os produtores e empresários para a adoção de práticas agrícolas e industriais sustentáveis, com foco na eficiência energética, gestão de resíduos e descarbonização da cadeia agroalimentar; e também a área da digitalização e indústria 4.0. ,de modo a fomentar a digitalização de processos produtivos, promovendo a integração de tecnologias digitais na indústria agroalimentar.

Em que é que consiste o projeto Export.i9?

O projeto Export.i9 é um projeto que vem dar continuidade aquilo que tem sido o trabalho da InovCluster em sede da internacionalização desde 2013, mas agora com uma imagem e uma estratégia de comunicação renovada, para se adaptar às constantes mudanças no cenário global e digital. É um projeto recente, iniciado em 2023, apoiado pelo Compete 2030, e que tem como objetivo apoiar a internacionalização de pequenas e médias empresas (PME) do setor agroalimentar. Entre os apoios oferecidos, o Export.i9 foca-se em facilitar o acesso das empresas a mercados externos, através de ações como a participação em feiras internacionais, missões empresariais e missões inversas, oferecendo até 50% de financiamento para essas atividades. As empresas também recebem suporte na digitalização dos seus processos de vendas, incluindo criação de lojas online, adesão a marketplaces e desenvolvimento de estratégias de marketing digital.

Os mercados prioritários deste projeto incluem Espanha, Suécia, Alemanha, EUA, Canadá, China e Emirados Árabes Unidos, com o objetivo de maximizar o impacto da internacionalização das PME em mercados estratégicos. Além disso, o projeto visa equipar as empresas com as ferramentas necessárias para se destacarem no competitivo cenário internacional, especialmente no ambiente digital.

“Desde 2013, a InovCluster já organizou a participação de 285 empresas em 57 feiras internacionais, reforçando a visibilidade e competitividade dos produtos nacionais no exterior”.

Qual tem sido o contributo da InovCluster para o crescimento da economia portuguesa?

Podemos afirmar que o contributo da Inovcluster para o crescimento da economia portuguesa, particularmente no setor agroalimentar, se situa a vários níveis. Ao nível da internacionalização a InovCluster ajudou a posicionar empresas portuguesas no mercado global, facilitando o acesso a novos mercados como nos países nórdicos, EUA, Canadá e Emirados Árabes Unidos. Desde 2013, a InovCluster já organizou a participação de 285 empresas em 57 feiras internacionais, reforçando a visibilidade e competitividade dos produtos nacionais no exterior​. Ao nível da inovação, o nosso trabalho tem permitido contribuir para o aumento da produtividade e eficiência das empresas, fatores cruciais para o crescimento económico sustentável​.

Ao fortalecer as cadeias de valor locais e ao apoiar a qualificação das empresas agroalimentares, também impulsionamos a criação de empregos e melhoramos a competitividade regional, especialmente nas zonas do interior de Portugal​ onde temos a nossa sede. No fundo, todas as iniciativas que já promovemos nestes 15 anos, têm potenciado o fortalecimento global da economia portuguesa, contribuindo para o aumento das exportações, a diversificação da base económica e a promoção da inovação em setores estratégicos.

De que forma ajudam as PME a escalar os seus negócios além-fronteiras?

Temos desempenhado um papel crucial na escalabilidade dos negócios das PME nos mercados externos, oferecendo um conjunto abrangente de apoios e serviços que tornam este processo mais acessível e eficaz. Não posso deixar de voltar a referir que dispomos de uma unidade de intervenção e de uma equipa dedicada exclusivamente à internacionalização, que tem prestado todo o apoio necessário aos seus associados para o desafio que é a conquista de novos mercados. É, por isso, que promovemos a participação conjunta em feiras internacionais, como é o caso das próximas duas feiras que nos encontramos a organizar, a Chilventa e a Biofach, onde providenciamos stand, logística e suporte técnico​; promovemos várias missões empresariais, tendo sido a última ao mercado dos EAU onde proporcionamos agendas à medida de cada empresa; promovemos missões inversas, que incluem a receção de potenciais compradores internacionais a Portugal, de modo a conhecerem os nossos produtos e o nosso mercado.

Também não posso deixar de referenciar a esse nível os vários estudos de mercado e informação estratégica que já elaboramos e que disponibilizamos aos nossos associados, auxiliando-os a compreender melhor os mercados alvo e a adaptar suas estratégias de entrada.

Quais os maiores desafios que as empresas portuguesas do setor agroindustrial que procuram internacionalizar-se encontram?

Qualquer processo de internacionalização é complexo e envolve sempre investimento financeiro e humano, e é por isso que procuramos na InovCluster, minimizar os riscos que qualquer processo a este nível pode envolver. No entanto, um dos principais desafios desde setor em específico, prende-se com o acesso aos mercados, tanto a nível burocrático como de regulamentação como normas sanitárias, requisitos de rotulagem e os certificados específicos exigidos em cada mercado. O cumprimento dessas normas pode ser complexo e dispendioso, especialmente para pequenas empresas que não possuem equipas e departamentos especializados para o efeito. Outro desafio: muitas empresas portuguesas têm dificuldade em competir com empresas de outros países, especialmente aquelas de mercados emergentes, onde os custos de produção são mais baixos.

Além disso, as cadeias de supermercados e distribuidores exigem muitas vezes preços agressivos, o que pode dificulta logo à partida a entrada de produtos portugueses​ nestes pontos de venda. A gestão da logística, como transporte, armazenagem e distribuição em mercados internacionais, representam também um desafio. A distância geográfica e por vezes a falta de redes logísticas robustas tornam o processo caro e complicado, ainda para mais para produtos frescos que têm prazos de validade curtos​. Também o desafio que é o investimento necessário para qualquer ambição internacional: ao nível de marketing, feiras, redes de distribuição e a adequação dos produtos aos mercados internacionais e a própria falta de pessoal qualificado com experiência em exportação e marketing internacional. As empresas muitas vezes carecem de equipas internas para lidar com os desafios de internacionalização.

E ao nível da digitalização, em que fase se encontram as PME portuguesas?

A digitalização das pequenas e médias empresas portuguesas ainda se encontra numa fase de transição, com avanços consideráveis nos últimos anos, mas também com desafios persistentes. Apercebemo-nos que muitas PME portuguesas estão a começar a integrar tecnologias digitais, como a automação, inteligência artificial e análise de dados, nos seus processos de produção. Também realçamos que durante a pandemia de COVID-19, houve um crescimento acentuado na criação de lojas online e adesão a marketplaces, o que ajudou as PME a alcançar novos mercados e adaptar-se às mudanças nas preferências de compra dos consumidores e este movimento foi fundamental para que muitas empresas conseguissem manter-se ativas e competitivas​.

Temos atualmente vários programas disponíveis, sobretudo ao nível do Portugal 2030 e do PRR – falamos das aceleradoras de comércio digitais, os Digital Innovation HUB entre outros, que disponibilizam fundos para promover a digitalização das empresas, ajudando-as a implementar ferramentas como sistemas de gestão empresarial (ERP), CRM, e soluções de cibersegurança.

Não obstante, há que referir que temos ainda uma generalizada baixa maturidade digital, com muitas PME, especialmente em setores mais tradicionais do setor, ainda se encontram numa fase inicial de digitalização. Algumas não dispõem nem de recursos humanos, nem de infraestruturas tecnológicas adequadas, para além de que as barreiras de custo e complexidade na adoção de soluções digitais é algo que não podemos menosprezar e que é sem dúvida uma das principais barreiras existentes.

Por isso pode-se dizer que as empresas portuguesas do setor estão a progredir na digitalização, mas ainda há um caminho considerável a percorrer, especialmente no que diz respeito à adoção mais ampla e integrada de tecnologias digitais e na formação da força de trabalho para lidar com essas novas ferramentas.

Qual tem sido a adesão das empresas portuguesas à feira Biofach?

A adesão das empresas portuguesas à feira Biofach, o maior evento mundial dedicado a produtos biológicos, tem sido desde a primeira hora, bastante positiva. Estamos neste momento a promover a participação neste certame e a recolher inscrições e denotamos que o interesse continua bastante elevado, reconhecendo a feira como uma oportunidade essencial para alavancar exportações de produtos biológicos certificados. Na edição de 2023, a feira contou com quase 36.000 visitantes de 137 países, destacando-se como um importante ponto de encontro para a indústria e para novas tendências no setor biológico.

Além disso, regiões como a Bio-Região de Idanha-a-Nova, um parceiro estratégico para a InovCluster, têm tido uma presença significativa, promovendo não só produtos biológicos, mas também o território e o compromisso com a sustentabilidade. A feira tem sido uma plataforma para divulgar a agricultura biológica portuguesa em mercados chave, como o alemão, onde o consumo de produtos biológicos está em crescimento contínuo.

Esta presença reforçada em eventos como a Biofach reflete o interesse crescente das empresas portuguesas em aproveitar a procura global por produtos biológicos, que vem sendo visto como uma tendência crescente do setor agroalimentar.

“(…) a InovCluster tem estado envolvida em vários projetos europeus que visam o desenvolvimento de redes colaborativas entre empresas e instituições de outros países”.

Além da participação em feiras internacionais que outras iniciativas organizam?

Para além da participação em feiras internacionais, o projeto Export.i9 envolve uma variedade de outras iniciativas destinadas a apoiar a internacionalização das PME do setor agroalimentar, como é o caso das Missões Empresariais Virtuais a mercados estratégicos, onde as empresas têm a oportunidade de reunir com potenciais parceiros, clientes e distribuidores, conhecer as condições locais e realizar reuniões de negócios; Encontros B2B (Business-to-Business) onde as PME podem ter reuniões diretas com compradores internacionais, importadores e distribuidores. Essas reuniões são cuidadosamente organizadas para maximizar as oportunidades de negócios; Ciclo de Workshops de Capacitação para a Digitalização em Internacionalização com o objetivo de preparar as PME para uma internacionalização de sucesso suportada em ferramentas e processos digitais.

A InovCluster atua como um facilitador e um parceiro estratégico, oferecendo um apoio integrado que abrange desde a formação e capacitação até ao desenvolvimento de negócios internacionais.

Referir ainda que a InovCluster tem estado envolvida em vários projetos europeus que visam o desenvolvimento de redes colaborativas entre empresas e instituições de outros países. Um exemplo é o projeto AgrifoodX5.0 que apoia e promove o intercâmbio de boas práticas e conhecimentos, ​e o projeto F2F que pretende disponibilizar serviços de apoio às PME inovadoras europeias que estão dispostas a internacionalizar os seus conhecimentos e produtos alimentares saudáveis em novos mercados. Para além disso, disponibilizamos consultoria técnica e estratégica às empresas associadas, auxiliando-as na preparação para a internacionalização, desde a adequação de produtos a normas internacionais até a criação de estratégias de entrada em novos mercados.

Projetos para o futuro da InovCluster…

A InovCluster tem planos ambiciosos para o futuro, com projetos focados em diversas áreas estratégicas, sempre com o objetivo máximo de fortalecer o setor agroalimentar e as nossas PME associadas. O apoio continuado à internacionalização, com iniciativas como o Export.i9, para ajudar cada vez mais empresas a entrarem em mercados globais. Há também um foco crescente na digitalização, com o objetivo de ajudar as empresas a adotarem soluções tecnológicas e a desenvolverem competências digitais, como o e-commerce e o marketing digital, para serem mais competitivas no cenário global​. Pretendemos continuar a apostar na inovação, com o desenvolvimento de novos projetos em sustentabilidade e economia circular, promovendo práticas mais ecológicas no setor agroindustrial. Isso inclui o apoio ao desenvolvimento de produtos biológicos e à certificação de práticas sustentáveis, como parte de um movimento crescente por uma agricultura mais sustentável e inovadora​. Pretendemos também continuar a investir em projetos colaborativos europeus, incentivando a troca de conhecimento e a inovação através de redes de cooperação.

A nível da valorização dos produtos endógenos regionais, é nosso objetivo continuar a valorizar e promover produtos típicos portugueses, particularmente os da região centro, como parte da estratégia para fortalecer a economia local. A InovCluster já tem trabalhado na promoção da fileira do Queijo e agora com a recente aprovação da Estratégia de Eficiência Coletiva PROVERE Queijos do Centro de Portugal, pretendemos continuar a trabalhar nos próximos anos para melhorar a competitividade e o crescimento sustentável da fileira dos queijos qualificados do Centro de Portugal, assumindo a inovação e o conhecimento enquanto vetores estratégicos de ação.

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