Entrevista/ “Portugal precisa de empreendedores em série”

Celso Martinho, CEO da Bright Pixel

Está há três anos no mercado. Pelo caminho, a Bright Pixel apoiou 14 start-up, juntou-se ao programa espanhol de aceleração vertical EGI Booster e quer continuar a apostar no Retalho, Telecomunicações e Cibersegurança. Em entrevista ao Link To Leaders, Celso Martinho fala do interesse pela área de fintech e das tendências tecnológicas futuras.

A Bright Pixel (BRPX) nasceu em 2016 pela mão de Celso Martinho, ex-diretor da Sapo, e em parceria com a Sonae IM (Investiments Managements, a área do grupo focada no investimento em empresas tecnológicas), foi crescendo e desenvolvendo a sua atividade.

Situada em Lisboa, mas com instalações também no Grande Porto, a empresa, que hoje celebra o seu 3º aniversário, já investiu em 14 start-ups – todas em early stage  – desde a sua fundação. O Link To Leaders falou com Celso Martinho, o CEO da empresa, que traçou o balaço de três anos de atividade do venture building studio, da parceria com a aceleradora espanhola e de como vê as start-ups de blockchain, inteligência artificial, big data e analytics, áreas nas quais tem investido. E ainda do interesse pela área de fintech.

Que balanço faz destes três anos de atividade?
O balanço é bastante positivo. Estes três anos de atividade serviram muito para afinarmos o nosso modelo, a nossa proposta de valor que é original face a outros projetos de investimentos que existem em Portugal. Houve um grande período de aprendizagem e de ajuste deste modelo e agora estamos numa fase em que achamos que esta parte está mais clara e que o modelo já está bastante trabalhado. Estamos, portanto, numa fase de crescimento, de ganhar alguma dimensão e de expandir o nosso portefólio de investimentos. Para quem não sabe, temos uma espécie de funil onde surgem três atividades que contribuem para encontrarmos boas oportunidades de investimento. Estas atividades são, por um lado, trabalhar a transformação digital com empresas grandes, por outro, incubar e criar start-ups e, por fim, investir nelas.  E funcionam em sequência.

Quantos projetos tecnológicos apoiaram até agora?
No nosso portefólio constam até 14 start-ups. Todas elas early-stage – o chavão para todas as empresas que ainda não chegaram às chamadas Series A. Trata-se de um portefólio diversificado não só porque tem start-ups de várias verticais, como também de vários estágios ou fases de maturidade. São empresas fundamentalmente portuguesas, mas não só.

“E depois temos outras empresas de dimensão diferente, algumas das quais só entrámos como investidores, mas que estão numa fase interessante, porque se estão a internacionalizar”.

Das start-ups que apoiam, alguma que queira dar destaque?
É difícil escolher uma, mas as mais interessantes são aquelas que atravessaram o nosso modelo, desde a ideia à construção da empresa com os promotores e depois à venda do produto. Uma empresa emblemática e que traduz bem como o nosso modelo funciona é a Probe.ly, que desenvolve uma ferramenta de segurança informática e que está agora numa fase acelerada de começar a vender a sua solução. E depois temos outras empresas de dimensão diferente, algumas das quais só entrámos como investidores, mas que estão numa fase interessante, porque se estão a internacionalizar. E estão muito perto de sair da definição de early stage – naquela transição entre uma start-up e uma empresa a sério. E aqui eu destacaria duas que já têm escritórios nos EUA e números bastantes interessantes de receitas: a Jscrambler e a Habit Analytics – nesta última investimos 600 mil euros há cerca de 2 meses.

Quais as áreas tecnológicas que mais predominam no negócio da Bright Pixel?
Temos duas áreas muito fortes: uma é o retalho e outra a cibersegurança, e só trabalhamos com start-ups B2B, empresas que desenvolvem soluções para o mercado empresarial. Em termos absolutos, temos alguma predominância do vertical do retalho, mas também temos um portefólio rico na área de cibersegurança.

“Neste momento somos coinvestidores de uma empresa francesa que passou pelo programa da EGI que é a Beamy. Agora está a decorrer um novo programa. Vamos ver se quando chegar ao fim decidimos investir em mais alguma start-up”.

A Bright Pixel juntou-se ao programa espanhol de aceleração vertical de start-ups de tecnologia para retalho e de comércio eletrónico, o EGI Booster. Esta é a vossa primeira parceria a nível internacional e está em linha com a vossa missão?
Desde que criámos a Bright Pixel, aprendemos que temos de trabalhar em rede e estabelecer parceria porque não há outra forma de explorarmos as oportunidades que existem. Temos vindo a explorar parcerias estratégicas – não só em Portugal, como também fora. E uma dessas parcerias foi com a EGI, em Barcelona. E está a correr bem por dois motivos. Em primeiro lugar porque a EGI tem uma vasta rede de ligação com retalhistas um pouco por toda a Europa, uma vez que organizam um evento entre retalhistas e start-ups. Ou seja, em primeiro lugar olhámos para a EGI como uma porta de acesso a um conjunto de retalhistas de referência na Europa. Em segundo lugar, são um programa de aceleração que parece dar fruto, muito focado no vertical de retalho e no B2B. A EGI seleciona as start-ups e leva-as para o seu programa de aceleração. E depois nós entramos na reta final como potenciais investidores das melhores ideias.

Neste momento somos coinvestidores de uma empresa francesa que passou pelo programa da EGI que é a Beamy – foi uma das empresas vencedoras do último programa. Agora está a decorrer um novo programa. Vamos ver se quando chegar ao fim decidimos investir em mais alguma start-up.

Que outras parcerias internacionais contam formalizar?
Neste momento, a nossa parceria internacional de referência é com a EGI. Em Portugal, trabalhamos com a Startup Lisboa, a Startup de Braga, temos protocolos com as universidades, como a Universidade de Aveiro, que é um meio que nos interessa muito, entre outras.

“Hoje ninguém se pode queixar de não ter ajuda ou de não ter a infraestrutura necessária para começar o seu negócio”.

O que mais destaca no ecossistema empreendedor português comparando com outros países europeus?
É inegável que existe hoje em Portugal um ecossistema de empreendedorismo, com todo o trabalho infrastestrutural no que diz respeito a criar instrumentos que visem ajudar os empreendedores, aceleradoras e incubadoras, investidores, espaços de partilha de conhecimento, coworking, todo este processo está concluído. Hoje ninguém se pode queixar de não ter ajuda ou de não ter a infraestrutura necessária para começar o seu negócio. No entanto, ainda estamos numa fase anterior relativamente a algumas cidades europeias, porque não estamos no mesmo nível de maturidade. É verdade que já temos algumas empresas grandes, os chamados unicórnios portugueses – Farfetch, Talkdesk e Outsystems – que são resultado dos primeiros anos de investimento desta área em Portugal, mas precisamos de muitos mais casos de sucesso. Precisamos de criar algo que é abundante noutras geografias que são os empreendedores em série, ou seja, empreendedores que já fizeram um projeto, já o venderam e já partiram para o próximo.

“Estamos também a ponderar, sem decisão ainda tomada, trabalhar o tema do fintech, mas é algo que ainda estamos a analisar”.

Quais são as áreas de grande aposta da Bright Pixel para os próximos tempos?
Temos três grandes áreas: Retalho, Telecomunicações e Cibersegurança. Estamos também a ponderar, sem decisão ainda tomada, trabalhar o tema do fintech, mas é algo que ainda estamos a analisar. Vamos continuar focados no B2B porque achamos que Portugal é um país mais propenso para trabalhar o B2B.

Como descreve a evolução de crescimento das start-ups de blockchain, inteligência artificial, big data e analytics em Portugal e na Europa?
As tecnologias são transversais a qualquer área de negócio. Estas áreas que mencionou são áreas de conhecimento e de tecnologia cada vez mais presentes em qualquer solução. E são tecnologias que também nos interessam por serem emergentes e porque podem vir a ser aplicadas em qualquer negócio. Obviamente que umas são mais maduras do que outras. Eu diria que big data e inteligência artificial são temas já muito conhecidos e muito explorados. E Portugal não fica atrás em talento no que diz respeito a estes temas, se quisermos comparar com outros países europeus. O blockchain é muito mais experimental  porque, apesar de nos parecer evidente que há muito potencial, achamos que ainda está numa fase muito embrionária. No blockchain interessa-nos muito mais os conceitos da descentralização e muito menos o tema que já é tóxico que é o das criptomoedas e dos tokens. Temos vindo a trabalhar algumas ideias na área da descentralização.

“Hoje o tema da perspetiva do utilizador já não é propriamente a tecnologia, mas a forma como aquele interage com a tecnologia”.

Quais acha que são as tendências e os desafios destas áreas nos próximos anos?
A tecnologia vai continuar a ser cada vez mais sofisticada. Hoje estamos a olhar para a inteligência artificial, o blockchain…, mas podíamos falar de outros temas, como robótica, automação. O importante, se quisermos falar do futuro, é que é cada vez mais relevante não só o domínio de uma tecnologia específica, mas, por um lado, o domínio do conhecimento de várias tecnologias em simultâneo, e por outro lado, também é importante uma crescente e necessária mistura entre o conhecimento tecnológico e áreas não só de gestão, mas também relacionadas com designer, comportamento humano, ou seja, valências que têm sido menosprezados nas últimas décadas e que são um ponto crítico para equipas de empreendedores que estão a começar um negócio. Hoje o tema da perspetiva do utilizador já não é propriamente a tecnologia, mas a forma como aquele interage com a tecnologia. Isto leva-nos a ter que pensar na parte tecnológica, mas também na parte da interação da máquina com as pessoas, clientes, empresas. Hoje é muito difícil encontramos uma start-up que possa vingar e seja só constituída por engenheiros ou só por gestores. Vivemos um momento em que é virtualmente impossível criar um negócio com equipas que não sejam pluridisciplinares.

“Temo como objetivo para este ano investir 3,5 milhões de euros entre start-ups e um processo que temos de criação de start-ups a que chamamos de MVP”.

Quanto investiram no ano passado e quanto preveem faturar este ano?
A nossa métrica principal é a do investimento. Por isso, temo como objetivo para este ano investir 3,5 milhões de euros entre start-ups e um processo que temos de criação de start-ups a que chamamos de MVP. No ano passado investimos 2 milhões de euros.

Como vê a Bright Pixel nos próximos três anos?
Estamos numa fase de crescimento e queremos replicar a nossa fórmula. Vejo o nosso portefólio a crescer e uma expansão geográfica. Interessa-nos cada vez mais oportunidades que não sejam só em Portugal, mas na Europa também.

 

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