Opinião
Por favor, digam não!

Algo que me aflige atualmente nas relações entre pessoas e, principalmente nas relações empresariais, é a normalização de não se dizer Não a nada! Não se trata apenas de uma perda total de frontalidade que em muitos casos se traduz num ato de completa falta de educação.
Todos já perdemos tempo, dias e horas à espera de uma resposta que nunca vem porque simplesmente ninguém tem a coragem de dizer um não. E fica tudo num limbo de pseudosimpatia (algumas vezes, nem isso) encoberto por um silêncio que não é justificado nem tem qualquer justificação.
Recordo o tempo em que se defendia que dizer que não a uma criança podia traumatizá-la para a vida. Que grande erro! O resultado é que, no mundo do trabalho e nas nossas relações pessoais, dizer não é hoje uma prática quase inexistente, porque fomos educados para pura e simplesmente fazer silêncio.
Durante muitos anos na minha atividade profissional recebi candidaturas de trabalho espontâneas e preocupei-me sempre em dar uma resposta, tinha candidatos a um lugar na empresa que não eram admitidos e disse-lhes que não, recebi solicitações de toda a ordem e se não me interessava dizia que não. A todos atendi sempre e dei resposta. Dir-me-ão que isso atualmente é impossível pelo volume de trabalho que isso implicaria. Respondo que quem não quer fazer encontra sempre problemas, mas quem quer fazer encontra soluções. Aliás, hoje-em-dia, os meios disponíveis para o fazer são muito mais simples e eficazes do que eram antes. O que mudou foi a nossa atitude.
Aceitamos encomendas e prazos que sabemos de antemão que não vamos conseguir cumprir, deixamos pessoas ansiosas à procura de um emprego sem qualquer resposta, adiamos soluções e respostas só para não ter de dizer não, inventamos perguntas e apresentamos dúvidas, adiando uma resposta que é inevitável. E pior é que nos protegemos por detrás de emails a que não damos respostas, chamadas telefónicas que não atendemos e mensagens a que não respondemos, baseados no princípio que não dizer nada é automaticamente rejeitar. E tudo isto porque simplesmente não queremos frontalmente dizer a palavra não! É todo um silêncio que esquece que do outro lado estão pessoas que merecem a nossa atenção e o nosso respeito.
Todos nós conhecemos muitos casos desta triste situação e não gostamos que nos aconteça. Tanto tempo perdido e tanto esforço desperdiçado pela simples ausência de uma resposta. Tanto que poderíamos aprender se o não fosse explicado. Afinal o tempo é precioso para ambos os lados. Importa talvez refletir sobre o que fazemos quando somos nós os causadores.
Mas porquê esta aversão? Dizer não é assumir uma rutura, é ser capaz de dizer que algo está mal, que alguém não serve, que a nossa escolha é simplesmente outra. Atualmente, ninguém quer ter o ónus de ser desagradável por dizer um não. Todos queremos dar um ar de bonzinhos, que aceitamos tudo e todos e assim tornámo-nos na geração do tudo bem, da palmadinha nas costas, sempre querendo estar de bem com tudo e com todos. Ficamos pela “normalidade” quando se deve procurar a excelência. Excelência nas relações humanas e excelência na gestão. Humanizar a gestão e as relações é tarefa a retomar. Levar a verdade e a frontalidade para o mundo dos negócios é imperioso. Por favor, pensem nisto e digam não!
Pedro Alvito é, desde 2017, professor na AESE, onde leciona na área de Política de Empresa, tendo dado aulas também na ASM – Angola School of Management.
Autor de duas dezenas de case-studies publicados pela AESE e de dois livros publicados pela Editora Almedina – “Manual de como construir o futuro nas empresas familiares” e “Um mundo à nossa espera, manual de globalização” – também escreve regularmente no Diário de Notícias. Desde 2023 é presidente do Conselho de Família e da Assembleia Familiar do grupo Portugália.