Entrevista/ “Os líderes precisam de lidar com a complexidade”

Wendy K. Smith, investigadora de comportamento organizacional

Investigadora do que designa como paradoxos estratégicos, Wendy K. Smith estuda a forma como as organizações  e os seus líderes exploram novas possibilidades e as cruzam com as competências existentes. Recentemente esteve em Portugal e o Link to Leaders falou com ela.

Professora associada de comportamento organizacional na Escola de Negócios Alfred Lerner, da Universidade de Delaware, e doutorada pela Harvard Business School, Wendy K. Smith esteve recentemente em Portugal a convite do Leadership and Society Forum. Foi uma das oradoras da conferência, dedicada ao tema: “Paradox & Plurality”, onde expôs o seu trabalho de investigação sobre os paradoxos, sobre a forma como os líderes  lidam no dia a dia com agendas contraditórias, e como respondem, simultaneamente, a objetivos financeiros e missões sociais.

A sua pesquisa concentra-se em paradoxos estratégicos. Como é que os líderes e as equipas seniores respondem efetivamente a uma agenda contraditória?
As tensões paradoxais podem surgir em todos os níveis da organização e em todas as funções. Dito isso, o nosso trabalho emergiu de três paradoxos estratégicos específicos que vemos todas as organizações a enfrentarem. Por paradoxo, queremos dizer exigências contraditórias que, ainda que interdependentes, existem simultaneamente e persistem ao longo do tempo.
Primeiro, os paradoxos da inovação são aqueles que ocorrem entre a gestão de hoje, focada na excelência operacional, reforçando o que existe na organização atual, e a exploração de novas possibilidades para o futuro, procurando experimentar o futuro.

Segundo, os paradoxos da globalização são os que se referem às tensões entre tentar responder/atender a  necessidades locais distintas e únicas e procurar integrá-las numa única unidade global.

Em terceiro, os paradoxos obrigatórios que refletem as tensões entre o foco nos resultados financeiros – no mercado – nas necessidades específicas da organização e ainda focar-se numa missão social, na paixão, num propósito e nas necessidades de grupo mais amplo dos vários stakeholders fora da organização.
Descobrimos que as organizações enfrentam todos esses três paradoxos estratégicos que, embora diferentes, podem ser importantes e relevantes para os líderes em momentos diferentes. Também descobrimos que essas tensões estão entrelaçadas umas com as outras, de modo que um paradoxo pode fazer surgiu outro paradoxo diferente.

Como é que as organizações e os seus líderes exploram, simultaneamente, novas possibilidades enquanto exploram as competências existentes?
Tentar explorar o futuro e ao mesmo tempo manter a excelência operacional no presente é um dos principais desafios de qualquer organização. As pesquisas trouxeram à superfície várias maneiras pelas quais os líderes das organizações podem lidar com as tensões entre o hoje e o amanhã, ou com os conceitos de “exploration e exploitation” simultaneamente.

O nosso trabalho sugere que, para abordar com eficiência essas duas procuras conflituantes, os líderes têm que, primeiro, diferenciar – isto é, serem capazes de separar e atender às necessidades únicas e distintas das inovações, assim como dos produtos existentes.

Ao mesmo tempo, as organizações precisam, em segundo lugar, de integrar – ou seja, adotar práticas que desenhem e realcem as sinergias e as ligações entre estas procuras concorrentes. Esta pode ser uma visão abrangente que aborde essas duas procuras concorrentes, a que um líder responsável deve corresponder.

O importante é que organizações eficazes naveguem nesses paradoxos tanto pela diferenciação quanto pela integração. As organizações que apenas diferenciam e colocam de parte esse procura, podem ter de enfrentar conflitos permanentes. Por outro lado, as organizações que apenas integram e procuram encontrar sinergias entre esses aspectos concorrentes sem saberem as suas diferenças, pode levar ao que chamamos de falsa “sybergiea”, o potencial para ver a conexão, mas, na realidade, uma das facetas assumirá o poder e terá prioridade sobre a outra.

Como é que as empresas sociais conjugam as missões sociais e objetivos financeiros?
Assim como na “exploration e exploitation”, os empreendedores sociais também precisam de se diferenciar e integrar. Eles precisam de ser capazes de separar a missão social e as metas financeiras e ver suas diferenças e contribuições únicas, e, ao mesmo tempo, serem capazes de encontrar maneiras pelas quais a missão social reforce o propósito do negócio e o propósito do negócio reforce a missão social.

As empresas concentram-se em criar valor para os acionistas e investidores ou para um conjunto mais amplo de interessados?
Precisamos de fazer as duas coisas. O que descobrimos é que as organizações que são capazes de fazer o melhor para todas as partes interessadas são capazes de fazer melhor para os seus acionistas. Por exemplo, organizações que consigam responder às necessidades dos seus funcionários levarão a funcionários mais dedicados e comprometidos, que trabalharão mais para a organização e poderão gerar uma receita maior. As organizações que são capazes de atender às necessidades da comunidade e / ou a um conjunto mais amplo de necessidades de todas as partes interessadas fora de suas organizações, geralmente resultam em maior dedicação, mais envolvimento do cliente e, finalmente, um maior comprometimento com os seus produtos. Portanto, as organizações que são sustentáveis são capazes de abordar um amplo conjunto de partes interessadas, mesmo que as necessidades dos diferentes interessados pareçam competir umas com as outras no curto prazo.

Jack Welch afirmou certa vez que os grandes líderes são “implacáveis e entediantes”. Em grande parte, os pensadores da administração concordam em grande parte: bons líderes, segundo a narrativa, são consistentes nas suas decisões, cumprem seus compromissos. Qual é a sua opinião sobre isto e o que propõe?
Esse modo tradicional de pensar foi dominante para entender a liderança durante muito tempo. O que encontramos, no entanto, é que essa maneira de fazer escolhas e conservá-las pode ser problemática. As organizações que se concentram apenas na inovação descobrirão que, eventualmente, não têm a capacidade de sustentar essas inovações e permitir que elas cresçam com o tempo. As organizações que se concentram apenas na excelência operacional descobrirão que as horas extras que fizerem não criaram os novos produtos e serviços que lhes permitirão enfrentar os mercados futuros. O futuro rapidamente se torna o presente. Os grandes líderes estão lá para aqueles que são capazes de responder simultaneamente a essas necessidades concorrentes. Em particular, descobrimos que os líderes precisam cada vez de mais lidar com este tipo de paradoxos estratégicos. Descobrimos que, por vezes, os paradoxos estratégicos emergem de uma pluralidade maior, que existem muitas vozes divergentes e muitas partes interessadas, e que a experiência de recursos limitados para abordar um conjunto amplo de necessidades,  leva a mudanças maiores. A experiência do amanhã é hoje muito mais rápida. Dado que vivemos numa era de maior pluralidade, escassez e mudança, argumentamos que os líderes de hoje precisam cada vez de serem  capazes de lidar com os paradoxos estratégicos.

O que acha dos líderes de hoje?
À medida que o nosso mundo se torna mais complexo, os líderes precisam de lidar com essa complexidade. Têm ser capazes de não serem consistentes, mas consistentemente inconsistentes. Têm que ser capazes de ver que os recursos são escassos, mas de expandir o valor dos recursos e vê-los como abundantes. Têm de ser capazes de não aceitar e procurar apenas uma única verdade, mas de acomodar verdades múltiplas e, frequentemente, verdades concorrentes. Esse tipo de líderes é muito mais desafiado e difícil de encontrar. E, no entanto, eles andam por aí, continuarão a evoluir na sua liderança para abordar os diferentes tipos de complexidades do nosso mundo.

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