Entrevista/ “O sorriso pode ser uma grande ferramenta na liderança”

Enquanto médico dentista, Hugo Madeira sempre soube que o sorriso tem impacto. Enquanto CEO, aprendeu que esse impacto vai muito além da estética: é uma ponte para a empatia, para a confiança e para uma liderança mais humana. “Um sorriso autêntico, no momento certo, pode mudar o rumo de uma conversa, de uma reunião, de uma cultura inteira”, explica.
Durante décadas, o mundo corporativo cultivou a ideia de que liderar exige uma postura séria, rígida e quase impenetrável. Hugo Madeira, fundador e CEO da Clínica Hugo Madeira, desafia esse paradigma, referindo que o sorriso não fragiliza, mas aproxima. “Um sorriso simboliza força, saúde e proximidade. Queremos líderes que inspirem não só pela sua posição, mas também como seres humanos”, diz.
Em entrevista ao Link to Leaders, o médico dentista fala sobre a importância de quebrar o estigma em torno da saúde oral, do papel transformador da prevenção, da ambição de criar, a partir de Portugal, um novo paradigma global na medicina dentária e da GBT Clinic by Hugo Madeira que inaugurou no início do ano com tecnologia suíça state-of-the-art. E sobre como um sorriso saudável pode – e deve – ser uma ferramenta de liderança.
Enquanto médico dentista, está profundamente consciente da importância do sorriso. Enquanto CEO, já sentiu que sorrir em contextos profissionais pode ser mal interpretado, como um sinal de menor autoridade?
Sim, esse paradigma ainda persiste, mas acredito que está na hora de o questionarmos. Durante muito tempo, a autoridade foi associada a uma postura mais rígida e sem mostrar os dentes, como se o respeito viesse de alguém mais sério e distante. Mas por que razão um líder não pode usar o sorriso para criar conexões? Por exemplo, a um artista ou um ator, é-lhes pedido que sorriam para se conectarem com o público. Porque é que um líder, para se ligar às pessoas, também não o pode fazer? Vivemos numa era de transformação, e esta é uma mudança necessária. Um sorriso simboliza força, saúde e proximidade. Queremos líderes que inspirem não só pela sua posição, mas também como seres humanos. Líderes como Barack Obama, por exemplo, que mostraram sempre o seu sorriso, um sorriso bonito, forte e saudável e nunca perderam poder por causa disso. Gostaria de ver os nossos líderes a sorrirem mais e a mostrarem a sua força e saúde através dos seus sorrisos.
“É importante equilibrar: saber ser firme quando necessário, mas também mostrar que liderar não é incompatível com demonstrar emoções e acessibilidade”.
Em cargos de liderança, há uma certa “cultura da seriedade”. Porque acha que sorrir ainda é visto como uma quebra de estatuto ou credibilidade?
Crescemos a ver líderes como figuras duras, quase intocáveis. Hoje, a autoridade e humanidade não são conceitos opostos, são complementares. É importante equilibrar: saber ser firme quando necessário, mas também mostrar que liderar não é incompatível com demonstrar emoções e acessibilidade. E isso terá um impacto direto na cultura interna de uma empresa. Vejamos o exemplo de quando pedimos a um líder para tirar uma fotografia: a grande maioria cruza os braços, roda o tronco 45 graus e não sorri. Ou se espreitarmos o LinkedIn destes mesmos líderes, a grande maioria apresenta um semblante mais carregado e sem mostrar os dentes, mesmo que tentem mostrar alguma simpatia. Creio que isto está ultrapassado. O sorriso deve exibir-se!
O que diria a outros líderes que têm receio de mostrar o seu sorriso, seja por questões estéticas ou por questões de imagem?
Diria para não subestimarem o sorriso. O sorriso pode ser uma grande ferramenta na liderança. Creio que existem muitos líderes que evitam sorrir, porque temem perder a credibilidade. No entanto, acredito que muitos não sorriem por não se sentirem confortáveis e confiantes com o seu sorriso, seja por questões estéticas, seja por questões de saúde oral. Pensemos, por exemplo, nos nossos líderes políticos portugueses e nas suas campanhas. Quantos conseguimos lembrar pelo impacto de um sorriso confiante e genuíno? Eu aconselharia os nossos lideres a dedicar uma particular atenção aos seus dentes no futuro e a usar o sorriso como uma ferramenta de conexão.
Em Portugal, a saúde oral ainda é desvalorizada em muitas camadas da sociedade. Acha que isso está mais ligado à educação, à acessibilidade ou também à cultura?
É uma questão estrutural e multifatorial. Temos um défice de literacia em saúde oral, sim, mas também carregamos um peso cultural onde “ir ao dentista” continua a ser uma resposta à dor, e não um gesto de prevenção. Precisamos de integrar a saúde oral no discurso da saúde global, com políticas públicas mais ambiciosas e um trabalho educativo desde a infância. A prevenção tem de deixar de ser uma recomendação para passar a ser um hábito.
“(…) cuidar da saúde e cuidar do sorriso vai potenciar o líder na sua função e no impacto que tem sobre os outros”.
Sente que há um estigma associado ao tratamento dentário, especialmente no que toca à estética? Ou seja, que ainda se associa o cuidar do sorriso a algo superficial?
Ainda há um pouco esse estigma, mas a mudança já começou. Cuidar do corpo ainda pode parecer, num contexto de negócios, algo superficial. Mas devia ser completamente ao contrário: cuidar da saúde e cuidar do sorriso vai potenciar o líder na sua função e no impacto que tem sobre os outros. Quando estamos bem de saúde, estamos mais ávidos para o trabalho, mais conectados às nossas equipas e conseguimos ver mais longe. Se vivemos numa cultura de stress, excesso de trabalho, se não descansamos e comemos mal, vamos estar inflamados e isso vai ter um impacto negativo nas decisões dos líderes e nas nossas equipas. Hoje, cuidar do sorriso é um princípio de saúde, de autoestima e até de comunicação.
A inauguração da GBT Clinic by Hugo Madeira representa um marco na prevenção oral para a Clínica Hugo Madeira. O que motivou a aposta neste conceito?
A maioria das pessoas ainda associa o dentista a dor, ansiedade e urgência. O que nos motivou foi a vontade de mudar a forma como as pessoas olham para a medicina dentária em Portugal. Queremos colocar no centro a prevenção e mostrar que numa cultura de cuidados de saúde oral diários e contínuos, morre a ideia de que só se vai ao dentista quando se tem problemas.
Com a GBT, oferecemos uma nova lógica: cuidar antes de tratar. A tecnologia permite-nos fazer uma limpeza profunda, com muito mais conforto. Mas mais do que tecnologia, estamos a criar um novo hábito, uma nova rotina: ir ao dentista porque se quer, não porque se tem de ir. Isso, para mim, é uma revolução silenciosa.
Esta parceria com a EMS Dental coloca a vossa clínica num circuito de inovação internacional. Como se constrói uma marca nacional com ambição global?
Com visão e consistência. A técnica é essencial, mas o verdadeiro diferencial está na experiência que oferecemos. Uma marca que cuida das pessoas com excelência, empatia e atenção ao detalhe pode ser global sem perder a identidade. Portugal tem talento, tem visão e tem tudo para liderar em áreas como a medicina dentária e por isso o objetivo desta parceria com a EMS foi usar Portugal como piloto. A partir desta clínica, a primeira inteiramente dedicada à prevenção e higiene oral do mundo, vamos estabelecer os padrões a ser usados noutros países. É um projeto de Portugal para o mundo.
“Se formos bem-sucedidos, estaremos a contribuir para um futuro com menos tratamentos invasivos, mais literacia e mais qualidade de vida”.
Que impacto espera que esta nova unidade tenha no negócio e no setor em geral?
Queremos elevar a prevenção a um novo patamar. O impacto será visível nos nossos resultados, sim, mas o mais importante será o efeito no comportamento das pessoas e na própria cultura de saúde oral. Se formos bem-sucedidos, estaremos a contribuir para um futuro com menos tratamentos invasivos, mais literacia e mais qualidade de vida. Isso, para mim, é um negócio com propósito e sustentabilidade.
A Clínica Hugo Madeira fechou 2023 com 8 milhões de euros em faturação e perspectivou crescer 20% em 2024. Este objetivo foi conseguido? Como se gere este crescimento, mantendo a excelência clínica?
Com foco, processos claros e uma cultura forte. O crescimento é uma boa notícia, mas só é sustentável se for acompanhado por qualidade e isso exige investir nas pessoas, na formação, na tecnologia e, acima de tudo, na experiência do paciente. De facto 2023 e 2024 foram anos de extrema importância para a Clínica Hugo Madeira porque, para além do crescimento na nossa atividade principal, permitiram-nos apostar em novos projetos. Nomeadamente, a GBT Clinic by Hugo Madeira e a integração da medicina integrativa na nossa atividade. Podemos dizer, portanto, que este crescimento não é apenas vertical, mas também horizontal, expandindo-nos para áreas que complementam e enriquecem o nosso portefólio. O nosso compromisso é: proporcionar um atendimento personalizado que não cuida apenas da saúde oral, mas olha para o paciente como um todo, mantendo sempre a excelência clínica.
Com a expansão para Cascais, o que procura replicar ou adaptar da experiência de Lisboa?
Replicamos o que nos define: excelência clínica, atenção ao detalhe, cuidado preventivo e uma experiência calorosa, mas profissional. Adaptamos o ritmo, o estilo, os horários, até a arquitetura, à realidade local. Cada espaço é pensado para acolher a comunidade onde se insere. A excelência é a mesma, a forma como se expressa é que é sensível ao contexto.
Como define hoje a proposta de valor da Clínica Hugo Madeira no mercado português?
Somos uma clínica de medicina dentária personalizada, com uma visão abrangente e integrativa. Cuidamos com base na ciência, na empatia, com uma experiência de uma clínica “boutique”. Valorizamos a saúde oral como parte da saúde integral, promovemos a prevenção e respeitamos a naturalidade de cada sorriso. A nossa proposta é clara: cuidar antes, cuidar de um todo, cuidar com propósito.
Lidera uma equipa de mais de 90 pessoas. Que tipo de cultura procura cultivar internamente?
Uma cultura onde as pessoas se sintam reconhecidas, desafiadas e motivadas. Profissionalismo com empatia. Excelência com entreajuda. Incentivamos a formação contínua, a escuta ativa, a transparência. Não acreditamos em hierarquias autoritárias, acreditamos em lideranças que inspiram e apoiam. Porque no fim, quem cuida bem da equipa, está a cuidar bem dos pacientes.
Como equilibra o papel de médico com o de CEO? São funções complementares ou vivem em tensão?
O meu papel como médico complementa e potencia o papel de CEO. A experiência direta na área da saúde proporciona uma visão mais apurada sobre o negócio, o que me permite tomar decisões mais assertivas e alinhadas com a missão da empresa. No meu caso, é esta a diferença: o facto de ser um CEO com know-how na área médica. No dia a dia, a gestão das responsabilidades é intensa, o que me obriga a estar no meu melhor para lidar com os desafios. No entanto, confio numa equipa que partilha o mesmo compromisso e valores que eu.
Em que medida a empatia, muitas vezes transmitida também através de um sorriso, é uma ferramenta de liderança que usa no seu dia a dia?
É uma das ferramentas mais potentes e subvalorizadas da liderança moderna. A empatia constrói pontes, desarma conflitos, cria ligação. E o sorriso é a sua forma mais imediata. Não é uma fragilidade, é sim uma força. Um sorriso autêntico, no momento certo, pode mudar o rumo de uma conversa, de uma reunião, de uma cultura inteira. E é isso que pretendo enquanto líder: ter as pessoas comigo.
Respostas rápidas:
Maior risco: Tentar fazer diferente num setor que valoriza o convencional.
Maior erro: Às vezes queremos agradar a toda a gente, mas não podemos estar sempre bem com Deus e com o Diabo.
Maior lição: O sucesso de uma empresa depende de uma equipa e não de uma pessoa só.
Maior conquista: Ter concretizado o meu sonho de ter um projeto de referência na medicina dentária.