Opinião

“O Portal da Sabedoria pretende representar o braço direito dos estudantes”

Francisco Faustino, cofundador do Portal da Sabedoria

“Há uma grande falta de estratégia e de modernização. Há que olhar para o mundo atual e perceber as ferramentas espetaculares que temos para revolucionar os processos de aprendizagem, mas também implementá-las”, revela Francisco Faustino, cofundador do Portal da Sabedoria. Em entrevista ao Link To Leaders, o responsável fala dos planos para tornar este projeto numa “espécie de Netflix de conteúdo educativo para estudantes portugueses”.

Acaba de nascer o novo Portal da Sabedoria que se apresenta como uma comunidade de explicações especializadas e de apoio na preparação para exames de matemática e físico-química. Pretende ligar alunos do ensino básico, secundário e superior a professores credenciados que os possam ajudar a evoluir na sua vida escolar.

O projeto resulta da fusão de duas iniciativas anteriores, o Centro de Explicações Online (CEO) e a plataforma de elearning Portal da Sabedoria.

Apesar de só iniciar atividade agora, a comunidade online junta já 50 professores e 200 alunos em Portugal, tendo a ambição de ser a maior plataforma de educação de toda a lusofonia.

Como surgiu a ideia de criar o Portal da Sabedoria?
Desde pequeno sempre tive o bichinho de criar coisas novas e, há uns anos, decidi começar a escrever todas as minhas ideias num caderno. Durante a pandemia, revisitei alguns desses cadernos e encontrei uma ideia que fazia todo o sentido para a necessidade que havia naquela fase. Estávamos em plena pandemia, com escolas em regime online, professores que não tinham as ferramentas necessárias nem formação para dar aulas online e alunos que não estavam a aprender o programa escolar. Havia, de facto, uma necessidade enorme de explicações online e decidi dar vida a esta ideia com a criação do CEO, o primeiro centro de explicações online em Portugal. É um projeto pelo qual tenho um grande carinho, mas que recentemente percebi que tinha potencial para muito mais.

Após um pitch que dei no Instituto Superior Técnico (IST) sobre um modelo híbrido de explicações, disseram-me que tinha que conhecer obrigatoriamente três pessoas, que se vieram a tornar nos meus sócios. Foi com eles que criei o Portal da Sabedoria: Francisco Lopes (melhor aluno de sempre do IST, média de 20 e acabou um ano mais cedo, MBA em Stanford e Forbes 30 under 30); Rogério Jorge (doutorado em Física e professor Auxiliar Convidado no IST, onde é investigador de fusão nuclear) e o Gonçalo Almeida (advogado sócio da KSGA, ex-assessor da Secretária de Estado da Educação). E com esta equipa nasceu o Portal da Sabedoria, com a missão de permitir o acesso a todos a educação de qualidade.

“Um dos grandes desafios que passámos, e que ainda hoje está presente, é o ceticismo dos pais e estudantes perante explicações online”.

Quais têm sido os maiores desafios do projeto?
Um dos grandes desafios que passámos, e que ainda hoje está presente, é o ceticismo dos pais e estudantes perante explicações online. Devido à pandemia que vivemos, muitos alunos tiveram aulas online péssimas, onde a aprendizagem ficou totalmente comprometida. Isto deveu-se a uma situação atípica, onde os professores não tinham condições, nem a formação necessária para conseguir dar aulas com a mínima qualidade.

Isso não acontece connosco, já que todos os explicadores recebem formação por parte da nossa equipa e são apoiados com tablets, manuais digitais, exercícios resolvidos, etc. Valorizamos o tempo dos nossos alunos, fazendo com que não percam tempo em deslocações. Basta o aluno ligar-se ao computador para ter uma explicação. Nas nossas explicações, não dizemos “imagina” – mostramos, de facto, com imagens e ferramentas online, o que o aluno precisa de visualizar para perceber os problemas.

Quais os serviços que disponibilizam? Como funciona?
O Portal da Sabedoria é bastante distinto de um centro de explicações convencional. O nosso principal objetivo é oferecer explicações online ou ao domicílio com a melhor qualidade possível. Para isso, temos um processo de recrutamento seletivo e rigoroso, e fornecemos um acompanhamento contínuo aos nossos explicadores.

Qualquer pessoa pode ter acesso a duas aulas experimentais gratuitas no nosso centro e, para quem decidir ficar connosco, pode contar com explicações semanais individuais, uma sala de estudo online disponível durante 20 horas por semana com um professor da nossa equipa e ainda o acompanhamento de um especialista de estudo.

Agora temos também a decorrer as preparações para exames, nas quais os alunos são inseridos em grupos de três a cinco elementos e onde são abordadas as matérias mais importantes do exame, o tipo de perguntas mais frequentes e a melhor forma de cumprir na íntegra os critérios de avaliação, etc. O principal foco é que o aluno esteja pronto para brilhar nos exames nacionais.

Está nos planos estender o portal a outras disciplinas que não só matemática, físico-química e física?
Queremos oferecer explicações com a melhor qualidade possível. Consideramo-nos especialistas nestas duas áreas e, neste momento, de forma a manter o nível das nossas explicações, não nos é possível incluir nos planos, a curto prazo, a abrangência de mais disciplinas do ensino secundário.

“Atualmente, cada vez se torna mais difícil para uma família conseguir colocar o seu filho a estudar numa universidade fora da cidade onde habita”.

Como é que olha para a integração das novas tecnologias na educação? Ajudam, de facto, a uma maior democratização?
Uma das grandes missões que nos levou a criar o Portal da Sabedoria passa exatamente pela democratização do acesso à educação de qualidade. Atualmente, cada vez se torna mais difícil para uma família conseguir colocar o seu filho a estudar numa universidade fora da cidade onde habita. Neste momento, custa 600 a 900 euros colocar um filho a estudar em Lisboa. Além disso, o ensino universitário está completamente estagnado na forma como educa os seus alunos, onde as taxas de adesão as aulas são assustadoramente baixas. E esse é o problema que mais pretendemos resolver.

Não queremos ser só um agregador de explicações, mas queremos também ser uma plataforma de apoio aos estudantes através da criação de conteúdo online. Estamos, neste momento, a criar vídeos de matérias de ensino superior, personalizadas a cada faculdade, para que os alunos possam aprender ao seu ritmo, de forma autónoma. A longo prazo, ambicionamos ser a solução para todos os que têm um grande desejo por conhecimento, até os que não o conseguiam concretizar por falta de meios. Com a nossa plataforma, vai ser possível qualquer pessoa, de qualquer idade, ter acesso a educação de excelência.

Vamos conseguir que um estudante esteja a viver na sua cidade natal e possa aprender todos os conteúdos da sua faculdade. Caso tenha alguma dúvida, pode sempre recorrer à nossa equipa de explicadores para resolver a questão que o está a bloquear. Acima de tudo, vamos conseguir ensinar de uma forma mais fácil e que ajuda o estudante a aprender mais rapidamente. Nada disto seria possível sem o acesso à tecnologia, acesso este que não está a ser aproveitado no ensino em Portugal.

Acesso a muita informação é sinónimo de conhecimento e emancipação? Ou o desafio dos docentes está no modo de orientar o aluno na forma como se processa e trata a informação?
Infelizmente, o acesso a muita informação não é sempre sinónimo de conhecimento e pode até representar o contrário, a desinformação. Atualmente, diria que o mais importante é não só saber filtrar a informação útil, como também perceber como processá-la e aplicá-la de maneira eficaz. O docente tem um papel fundamental neste processo, é quem deve auxiliar os alunos a desenvolver um raciocínio crítico para que estes possam lidar com a quantidade de informação a que tem acesso. Temos que nos focar em ensinar aos nossos alunos como lidar com esta sobrecarga de informação, como avaliar a relevância e a validade da informação e como as aplicar.

O mercado mundial dos centros de explicações e de aprendizagem já vale mais de 106 mil milhões de euros, estimando-se que ultrapasse, em 2026, os 172 mil milhões. Em Portugal não há dados concretos sobre a sua verdadeira dimensão. Se a escola desse resposta a todos os alunos, os centros de explicações seriam mesmo necessários?
Penso que numa realidade em que o sistema de ensino português desse resposta a todos os alunos, os centros de explicações continuariam a ser necessários, principalmente os que dão ferramentas intelectuais complementares aos estudantes. Além disso, existem dois tipos de alunos que procuram explicações em Portugal: os que têm efetivamente dificuldades em entender a matéria e os que já têm bons resultados, mas que pretendem aumentar o seu rendimento escolar para conseguir entrar num curso superior.

Qual é o maior obstáculo que impede uma evolução no sistema educativo: a falta de investimento; a falta de estratégia ou a falta de políticas consensualizadas e duradouras entre os maiores partidos?
Nos últimos anos, houve um grande salto quantitativo na educação em Portugal, conseguimos cada vez mais dar acesso à educação a um maior número de pessoas. Mas agora falta-nos dar um salto qualitativo, já que estamos completamente estagnados. Temos uma educação ainda bastante retrógrada, onde tratamos todos os alunos por igual – todos aprendem a mesma coisa ao mesmo ritmo. Quem consegue acompanhar, perfeito, mas quem não consegue acaba por ser deixado para trás. O mesmo acontece a quem tem uma maior capacidade de aprendizagem e que acaba por ver desacelerado o seu processo de aprendizagem. E, claramente, que este modelo não está a funcionar, pois temos taxas muito altas de insucesso e abandono.

Há uma grande falta de estratégia e de modernização. Há que olhar para o mundo atual e perceber as ferramentas espetaculares que temos para revolucionar os processos de aprendizagem, mas também implementá-las.

“Lançámos recentemente um servidor na plataforma Discord, onde qualquer estudante, mesmo não sendo aluno do centro, pode colocar dúvidas de matemática e físico-química (…)”.

Que outras novidades podemos esperar do Portal da Sabedoria para este ano?
O Portal da Sabedoria pretende representar o braço direito dos estudantes e, por isso, todos os nossos projetos futuros vão ao encontro desse objetivo. Lançámos recentemente um servidor na plataforma Discord, onde qualquer estudante, mesmo não sendo aluno do centro, pode colocar dúvidas de matemática e físico-química, e debater temas do seu interesse com outros estudantes. Criámos também o nosso curso de preparação intensiva para o exame de matemática e físico química, um produto dedicado aos alunos que pretendem aumentar a nota nos exames nacionais.

Pretendemos, ainda, num futuro próximo lançar o nosso canal de YouTube, totalmente focado na educação, onde vamos abordar temas como a gestão de tempo, produtividade e métodos de estudo.

Planos para 2023?
Pretendemos lançar o nosso primeiro curso em vídeo para universitários ainda no primeiro trimestre e queremos, até ao final do ano, sermos capazes de lançar, pelo menos, mais 30 cursos. Queremos crescer na criação de conteúdo para a comunidade e aumentar a comunidade de estudantes que se ajuda mutuamente. Este ano, pretendemos também abrir-nos a investidores que tenham a mesma visão para a educação.

O que diria a um(a) jovem que está a considerar seguir a área da matemática, físico-química e física no ensino superior?
Diria que o mais importante é encontrar o equilíbrio. Ambas as áreas exigem um estudo ativo e contínuo. Contudo, é fundamental articular esse estudo com atividades lúdicas e com descanso. Uma das chaves para uma aprendizagem de sucesso é aprender as diferenças entre uma aprendizagem ativa e passiva. É importante focar na aprendizagem ativa para aumentar a velocidade com que o estudante aprende.

Algo essencial para uma excelente produtividade é a organização, uma das principais skills que tentamos ensinar aos nossos alunos. A criação de blocos de tempo reservados para cada área da vida é crucial para atingir o sucesso escolar e pessoal.

Como é que os pais devem lidar com o “vício” de se estar sempre amarrado a um tablet, a um computador ou a videojogos?
No Portal da Sabedoria, inventámos um jogo que permite aos pais lidarem com tais vícios. Muito resumidamente, este jogo baseia-se num sistema de pontos que é atribuído a várias tarefas diárias que o próprio filho, juntamente com o nosso especialista de estudo, decide o que gostaria de fazer (nunca é o pai a impor). Normalmente, focamo-nos em ter um bloco de estudo por dia, pelo menos, e objetivos como praticar um hobby, deitar cedo sem aceder ao telemóvel, cumprir os trabalhos de casa, etc. Após decidir quais as áreas a melhorar, atribuímos pontos conforme a importância e construímos um mecanismo de controlo das tarefas. Assim, o aluno é incentivado a fazer tarefas para poder ganhar pontos, onde depois pode trocar os mesmos por prémios.

O feedback que temos tido deste sistema é incrível e, muitas vezes, os pais usam uma regra onde o filho tem que conquistar x pontos por semana para poder jogar videojogos ou estar num computador. Assim garantimos que o jovem  está a fazer o essencial academicamente e está também a jogar ou no computador, algo que é essencial para o seu desenvolvimento. O importante é sempre um balanço entre a vida pessoal e académica.

“Em cinco anos, vejo o Portal da Sabedoria a cumprir a sua missão e a ser uma espécie de Netflix de conteúdo educativo para estudantes portugueses”.

Como vê o Portal da Sabedoria dentro de cinco anos?
Em cinco anos, vejo o Portal da Sabedoria a cumprir a sua missão e a ser uma espécie de Netflix de conteúdo educativo para estudantes portugueses. E a disponibilizar conteúdo em vídeo de grande parte das cadeiras das faculdades em Portugal, de forma a permitir uma maior facilidade no acesso à educação a qualquer estudante. Imagino também um portal tão forte e necessário que não vai estar só na vanguarda do apoio a educação apenas em Portugal. Pretendemos fazer muito mais que isso. A nossa maior missão é garantir o acesso à educação de qualidade e tenho a certeza de que, em cinco anos, vamos estar ainda mais orgulhosos de tudo o que temos construído.

Respostas rápidas:
O maior risco: Ter comprado 50% do CEO ao meu ex-sócio logo após o primeiro ano.
O maior erro: Tentar executar demasiadas ideias ao mesmo tempo.
A maior lição: O foco é um dos pilares para o sucesso.
A maior conquista: Ter alunos a passar de 7/8 a passar para 18-20.

 

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